O PAI DO SOM
SÃO PAULO (um minuto de silêncio) – Morreu no final de janeiro, aos 84 anos, o polonês Stefan Kudelski, inventor do Nagra. O Nagra foi o gravador de rolo que revolucionou o cinema mundial a partir dos anos 50. Vocês, que operam suas mini-DV GoPro HD EPS Ultra sei-lá-o-quê, possivelmente não fazem ideia do quê era captar o som direto para fazer um filme quando não existiam os sistemas digitais de hoje. Via de regra, quase todo filme era sonorizado depois de rodado. Imaginem a dificuldade para sincronizar som e imagem. Uma maluquice total.
Kudelski desenvolveu o primeiro gravador portátil de rolo e batizou-o de Nagra — em polonês quer dizer “vai gravar”, como conta Tide Borges neste excepcional artigo no site da Associação Brasileiro de Cinematografia. A vida dos cineastas mudou. E para além da facilidade quase instantânea, comparada com a epopeia dos métodos anteriores, estava a qualidade. Não há nada no mundo como o som de um Nagra. Até hoje, desconfio.
E foi num Nagra que comecei minha carreira no rádio, como contei neste distante post de 2007 aqui. Era com um equipamento desses que o Chico Cocco, mágico de som da ECA (onde a gente produzia nosso “Encontro com a Ciência”), gravava as entrevistas para as pautas malucas que saíamos para fazer por esse Brasilzão afora. Fiquei triste ao revisitar o post e notar que todos os links indicados saíram do ar. Receio que aquelas gravações podem ter-se perdido para todo o sempre, sabe-se lá. Talvez nos arquivos da Rádio Cultura, ou da USP. Jamais saberei.
Mas eu sabia, e bem, editar uma matéria. Na gilete, cortando gaguejadas, suspiros, pausas, limpando perguntas e respostas, tudo isso não num Nagra, que era bom demais para editar, mas num Akai vertical instalado na edícula da casa que nos servia de escritório e redação em Pinheiros. Gilete, a fitinha adesiva para emendar a fita magnética (como chamava essa fitinha, caramba?), o lápis roxo que fazia as marcações, e assim montávamos grandes entrevistas, grandes matérias, que não sei se eram escutadas por muita gente. A Rádio Cultura AM nunca teve lá grande potência e audiência, eu mesmo costumava parar o carro em algum canto quando começava o programa para poder escutar sem grandes interferências.
Pois foi num Nagra que gravei os sons ao redor de mim por dois anos. Creio que isso é, hoje, peça de museu. Como eu, de certa forma.
Então viva Stefan Kudelski! Afinal, ele ficou gravado!
Belas lembranças, belo texto.
E de certa forma, todos nós somos peças de museu.
É como diz o filósofo:
“A era digital nos traz com frequencia, o passado e o futuro, o presente está se tornando cada vez mais raro”!
Eu quero um desses, onde acho pra comprar um SP. Alguém ??
“… como eu, de certa forma…”
Estamos ficando melancólicos, FG.
Bela lembrança FG. Trabalho com cinema e fico feliz por grata homenagem aos bons tempos… Apenas uma pequena correção: o artigo no site da Associação Brasileira de Cinematografia que vc coloca o link no seu texto foi escrito pela Tide que trabalha em parceria com a Lia, e juntas formam uma dupla maravilhosa que atua no cinema nacional e no cinema publicitário a muitos anos. Verdadeiras referências quando se fala em captação de som, são muito queridas por todos…
Abraços e parabéns pelo texto…
Tide e Lia, clássicos da publicidade.
Eu emendava com fita Durex quando as fitas K7 maçarocava dentro do radio toca fitas Motoradio. Perdia a metade da música, mas funcionava. Talves tenha sido a sua. Brs.
meu pai me deu em 1950 um parecido da REVERE.GRAVAVA RADIO, E COM MICROFONE .
Falou de cinema, falou comigo. Um entusiasta das ciências cinematográficas, não me interessei na carreira porque precisava (preciso) de algum dinheiro para sobreviver. E aqui no Brasil a vida do cineasta que não tem família rica e conchavos é muito difícil.
Mas, falando tecnicamente. A captação de som diretamente pela câmera, imprimindo oticamente na trilha de som da película, é coisa relativamente nova. Tudo muda, é a tecnologia. As câmeras de cinema não usam mais negativos (vejam a Panavision Genesis). E nos próprios cinemas a película já está com os dias contados. Hollywood já marcou ano para aposentar de vez as películas e fazer a distribuição digital dos filmes para os cinemas do mundo todo, será em 2015, se não me engano. Os cinemas brasileiros, diga-se de passagem, estão atrasadíssimos para se adaptar.
Captação e projeção digital, filmes sem riscos e “ponta de cigarro” (aqueles “buracos” na imagem que marcam o fim do rolo e avisam ao projetista para trocar de projetor). Quer dizer, tudo ficando mais chato a cada dia que passa.
Os Akai verticais 4000DS e 4000DB, foram nossas ferramentas nas festas da época de adolescentes, faziamos edição das musicas e “mixagens” artesanais, com gilete e Durex (essa era a fita sofisticada que usávamos). Bons tempos…
Flávio, a fitinha chamava SPLICE TAPE da 3M. Trabalhei muitos anos na 3M vendendo estas fitas, fitas rolo 1/4, 1/2, 1″. Lembra das fitas grafitadas para montar nas cartucheiras das rádios? Bons tempos.
É isso. Splice.
Splicing tape ? (http://www.splicit.com/splicing_tape.html)
Que saudades das mágicas splicetapes!!!
Rádio Cultura AM, 1200khz. Ficava “inventando” antenas para sintonizá-la aqui na Praia Grande e ouvir a Marisa Leite de Barros no programa Laboratório, que apresentava uma pequena história e um disco inteiro de várias bandas de rock. Tinha um Akai 4000ds e gravava o programa inteiro para depois editar e transferir para k7 e ouvir na escola com amigos.
Lindo o aparelho.
a fita se chama splicer, ainda tenho dois rolinhos…
Splicer era a giletinha e sua base, parte do kit de “emendas”!
É o gravador do Lucas Silva e Silva
“Alô… Planeta Terra chamando!!”
O do Lucas Silva e Silva é um Geloso, tive um daqueles.
Puxa, estou velho! Eu também trabalhei com um Akai, entre 1994 e 1997. Tempo bom. Rádio AM, com suas famosas cartucheiras…
Texto sensacional! Nunca trabalhei com áudio, mas, de certa forma, consegui traçar o paralelo com o ramo gráfico e de editoração, que conheço melhor, e que vc deve conhecer também. Os sistemas de paste-up, fotolito e impressão também tiveram radicais mudanças com a chegada das tecnologias digitais e, em menor escala, também têm seus “Nagras”.
Flavio,
Eles não pararam no tempo e o NagraD (de digital) continua sendo uma referência para field recording!
Não parou mesmo.
http://www.nagraaudio.com/index.php
Tem um amplificador valvulado que é a coisa mais linda do mundo:
http://www.nagraaudio.com/highend/index.php
Em tempo. O nome da fita que normalmente era branca é splicer tape
Flavio,
bela matéria, lindo gravador e uma pequena correção, o artigo na ABC foi escrito pela Tide Borges, excepcional técnica e professora de som direto.
Grande abraço,
Jacob
Oi Flavio.
Trabalhei ( e ainda trabalho sempre que possivel) com esses gravadores praticamente indestrutíveis. Com todos os contatos internos banhados a ouro era impossivel um mau contato ou ruidos vindos de sua parte eletronica mesmo em situações extremas, fossem frio, calor, humidade, quedas… o que vc pensar. Tenho um arquivo monstro de sons gravados com esse bichinho ( inclusive treinos de f-ford em 1986, e tres gps da decada de 80). Ate hoje uso boa parte desses sons na edição de filmes Longas, documentarios, curtas e mesmo na tao propalada era digital, esses sons gravados nessas maquinas, acompanhadas de microfones tops ( nesse caso alemães) tem uma profundidade e corpo dificilmente igualados ainda hoje. Não é peça de museu. Muitos doidos ainda o usam mundo afora.
Apenas um adendo.Hoje ainda sincronizamos e sonorizamos o filme todo depois de rodado. Essa parte continua intocada. Apenas com requintes de “crueldade” com filmes chegando para a mixagem final com 200 a 300 pistas de som( mesmos alguns brazucas, como Tropa de Elite, o Redentor , Corações Sujos entre outros ).
Assim que digitalizar o gp da Espanha de 87 (acho eu) mando a largada p vc
Abs
espetacular
obrigado flavio
Splice tape. Tinha outro nome?
O Nagra é campeão, um tanque de guerra. Como dizem os “som direto” das antigas: já perdi material na fita digital e no cartão; no Nagra, nunca!
Durex VEGETAL
Lembrei de ter lido o post “Ecos de mim mesmo” quando você publicou. Desde aquela época eu já te “seguia” no blog.
Na época eu trabalhava bastante e sozinho, a internet se resumia apenas ao trabalho, pois malemá tinha uma discada em casa e eu usava o pouco tempo livre para ler o que você publicava. Não participava dos comentários e nem os lia. Pra dizer a verdade, eu estava cagando para o que você escrevia que não era relacionado a corridas, mas lia mesmo assim.
Hoje trabalho o dobro de 6 (seis!) anos atrás, mas em compensação não estou mais sozinho, tenho banda larga em casa e qualquer celular hoje quebra o galho pra acessar, então participo mais dos comentários. Continuo cagando para seus posts não relacionados a automobilismo mas os leio com mais atenção ainda.
Revisitando agora o post, não pude deixar de notar a presença do Veloz-HP (que você homenageou no post passado) e sua turma. Os comentários me pareceram ser um ambiente bem familiar, praticamente um boteco, onde os poucos mas assíduos frequentadores interagiam entre si. Talvez tenha perdido a chance de várias amizades aí.
Mas o mais legal (e talvez assustador) de tudo isso é ver depois de tanto tempo, essa figura que já não está mais entre nós, viva e preservada nos comentários, mesmo depois de tantas mudanças de servidores que seu blog passou.
Não conheci o Veloz, mas lendo os comentários desse e de outros posts da época pude conhecê-lo um pouco mais. Realmente foi um grande cara, e certamente deixa muitas saudades.
Que coisa louca, essa internet! Que coisa mais louca ainda o fato de podermos nos tornar imortais nela.
olha aí flávio. parece que o batuque abalou as estruturas. hehehe…
http://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/ce/2013-02-17/fachada-de-hospital-inaugurado-por-ivete-sangalo-no-ceara-desaba.html
Ela sempre chega para abalar, não é isso que sempre diz?
Bandeira a meio mastro.
Valeu, Flavio, pela informação.
Trabalhei com o Nagra, durante anos. Fui “som direto” em muitas produções, esta máquina só me deu prazer.
Esteja em paz Sr. Kudeski.
Seria fita Durex?