Blog do Flavio Gomes
Brasil

Ao infinito e além

RIO DE JANEIRO (Canopus, Aldebaran…) – A esta hora Marcos Pontes está a mais de 200 km de altitude, bandeira do Brasil no braço, a bordo da Soyuz e a caminho da Estação Espacial Internacional. O lançamento da base de Baikonur pode ser visto no seu site oficial. Quando eu tinha 12 para 13 anos […]

RIO DE JANEIRO (Canopus, Aldebaran…) – A esta hora Marcos Pontes está a mais de 200 km de altitude, bandeira do Brasil no braço, a bordo da Soyuz e a caminho da Estação Espacial Internacional. O lançamento da base de Baikonur pode ser visto no seu site oficial.

Quando eu tinha 12 para 13 anos fui fazer um curso de astronomia no Planetário de SP, que inexplicavelmente está desativado há um tempão. Meus primos eram diretores e cheguei a fazer sonoplastia em algumas sessões de sábado à tarde.

Adorava o cheiro de mofo do carpete puído e o silêncio na abóbada à meia-luz, o Zeiss imponente no centro, como uma aranha gigante. Passava horas ali, vendo maquetes primárias do Sistema Solar, painéis de cartolina explicando nossa pequenez diante do universo.

Meu professor, Acácio, era cego. Mas me fez ver muito mais do que qualquer outro. Meu pai, acho que naquele ano mesmo, 1977, me trouxe um telescópio dos EUA. Eu, que sempre quis ser jornalista, cheguei a pensar em ser astrônomo. No fundo, queria apenas entender o espaço, saber mais sobre as estrelas e constelações que meus primos descreviam com tanta intimidade e reverência. Queria ver um disco-voador e viajar com alienígenas. Até hoje o filme que mais me comove é Contatos Imediatos.

Ainda hoje olho para o céu e identifico o Centauro, Órion, Escorpião, as Plêiades. No auge da paixão, fiz até observações de explosões solares com meu telescópio e um anteparo de papelão. Meu primo dizia que iria mandar os dados para o INPE. Acho que foi a coisa mais importante que fiz na vida, embora eu mesmo não me convencesse da importância daqueles números, horários e desenhos.

Fui ser jornalista na vida, e durante uns três anos atuei num incipiente jornalismo científico, primeiro pela SBPC, em rádio, depois na “Folha”. Convivi de perto com pessoal do IA, do INPE, do Instituto de Física da USP. Visitei observatórios, li Carl Sagan, confrontei ciência e religião, pirei.

Descontada a babaquice nacionalista (na Band, o apresentador chegou ao cúmulo de chamar a base de “Baiacu”, gritando como se o Brasil tivesse tomado posse de Saturno), o feito de Pontes é notável e merece o destaque que a mídia está dando, embora sua “missão” lá em cima não seja propriamente heroica: plantar feijão num copinho com algodão, algo assim.

De qualquer maneira, ele verá o que nenhum de nós jamais terá a chance de ver. Aqui embaixo, ver os olhos vermelhos de seu pai numa casinha em Bauru, de certa forma, é um consolo.