SOBRE ONTEM DE MANHÃ

A IMAGEM DA CORRIDA

O sorriso do vencedor: coleção de troféus só aumenta

SÃO PAULO (contagem regressiva) – Essa foto aí em cima chegou ontem tarde da noite, numa sequência que tem mais duas. O garoto Max e sua namorada Kelly, filha de Nelson Piquet, num momento da mais pura e genuína alegria quase juvenil. Achei melhor do que qualquer imagem de carro pista, embora o RB19 seja uma viatura merecedora de todas as homenagens. Como disse Christian Horner, vai para as páginas da História com H maiúsculo.

E vai mesmo. Esse automóvel superou o quase insuperável MP4/4 da McLaren de 1988, um carro lendário pilotado por duas lendas, Senna e Prost. Mas é gozado… Quando a gente olha para 35 anos atrás, quase sempre menciona o carro antes dos pilotos. Como será no futuro, quando falarmos desta temporada de 2023? Quem virá antes na fila do mérito, o carro ou o piloto?

Desconfio que o piloto. Max tem sido um personagem maior que seu instrumento de trabalho. Como foi Schumacher sobre a Ferrari, Hamilton sobre a Mercedes. Donde concluo que em algum momento do passado as máquinas, ao menos algumas, foram mais valorizadas que os homens que as pilotaram. A gente vive lembrando “a Lotus do Emerson”, “a Williams do Mansell”, “a Brabham do Piquet”. Façam esse exercício. E depois me digam se tenho razão. Um dos motivos para que se recaia sobre as figuras humanas antes do amontoado de lata, cabos e borracha talvez seja o hedonismo dos tempos em que vivemos. É Instagram aqui, Twitter ali, Facebook acolá, TikTok algures… Carros não dançam nem postam fotografias, não criam emojis e figurinhas, não elaboram legendas engraçadinhas. São discretos e, dentro do possível, silentes. Gosto mais deles do que das gentes.

Mas é apenas uma reflexão meio rasa, sem muita importância.

Em todo caso, viva Verstappen! E viva o RB19, carrão da porra!

A FRASE DE YAS MARINA

“A Red Bull ganhou com 17 segundos em cima do segundo colocado, e eles não encostam no carro desde julho, agosto. Então posso imaginar onde estarão no ano que vem…”

Lewis Hamilton

O inglês, que dominou a F-1 de 2014 a 2021 — com soluços em 2016, ao perder o título para Rosberg, e 2021, derrotado por Verstappen –, sabe bem do que está falando. Já experimentou uma hegemonia longa, e dela desfrutou empilhando números impressionantes e recordes que muita gente julga imbatíveis. Sabe como é difícil e quanto tempo leva para alguém escalar a mesma montanha — para usar expressão usada por Rosberguinho para explicar sua aposentaria.

A pergunta é: a Red Bull fará o mesmo que fez a Mercedes quando começou a era híbrida?

A resposta só a pista concede, mas a gente pode especular, claro. Eu acho que pelo menos nos próximos dois anos Verstappen e sua equipe seguirão controlando a F-1. Em 2026, a mudança de regulamento pode abrir brechas para outros protagonistas. Claro que esses prognósticos dependem de um monte de fatores: como Mercedes, Ferrari, McLaren e — vá lá — Aston Martin chegam no ano que vem, quais pilotos vão evoluir, quais vão enfiar o pé na jaca, quem vai descobrir algum pulo do gato como fez a Brawn em 2009, quanto tempo Max sustenta sua infalibilidade, como vai ser a parada da Ford na Red Bull, qual é exatamente a da Audi nesse negócio, Andretti vem ou não… Tem muita coisa para acontecer.

Mas é preciso raciocinar com base em alguma lógica. E a lógica, hoje, aponta para um período hegemônico da Red Bull e de Verstappen. Que pode ser longo como o da Mercedes, um pouco mais curto, como o da McLaren nos anos 80/90 ou o da Williams nos tempos da Renault, quiçá quase exasperante como a era Schumacher.

E é em algo parecido que aposto. Até pela semelhança entre Max e Michael.

O NÚMERO DE ABU DHABI

71

…anos se passaram desde a última vez que um Mundial de F-1 não teve pelo menos uma vitória de um piloto ou uma equipe da Grã-Bretanha. Foi em 1952. A primeira vitória britânica na categoria foi de Mike Hawthorn no GP da França de 1953. Desde então, a turma da ilha cravou vitórias em todos os anos — ou com um piloto, ou com uma equipe. A temporada de 2023 quebrou a série. Foram 21 vitórias de um time austríaco e uma de uma equipe italiana. Entre os pilotos, 19 triunfos de um holandês, dois de um mexicano e um de um espanhol.

Como vimos ontem no textão pós-corrida, a temporada dominante de Verstappen e da Red Bull produziu números impressionantes, derrubou recordes, robusteceu as cifras do piloto e de sua equipe. As 21 vitórias em 22 corridas (95,45%) talvez tenham sido a marca mais emblemática, por superar os 93,75% de aproveitamento da McLaren de Senna & Prost em 1988 — 15 vitórias em 16 corridas. Mas é bom lembrar que 35 anos atrás a McLaren só não emplacou 100% por duas meras voltas.

Aconteceu no GP da Itália em Monza, prova que teve Senna na pole, seu companheiro Prost com o motor Honda quebrado e o veterano Jean-Louis Schlesser, então com 42 anos, disputando seu primeiro GP. Schlesser tinha vasta história em categorias menores de monopostos e em provas de Endurance. Foi chamado meio às pressas pela Williams para substituir Nigel Mansell, com sarampo. Um carro de F-1, para ele, era indecifrável mistério.

Sem Prost para incomodar, Ayrton liderava a corrida com relativa tranquilidade, apesar da aproximação de Berger, da Ferrari, nas últimas voltas — o brasileiro precisou tirar um pouco o pé por causa do consumo de combustível, mas nada que ameaçasse sua vitória, mais uma. Mas quando foi colocar uma volta em Schlesser, na primeira chicane, o francês se atrapalhou na freada, saiu da pista, tentou voltar e aconteceu o choque. Foi a única prova que o MP4/4 não ganhou. Por conta de uma batida boba, não falta de desempenho — a Red Bull só não bateu 100% de vitórias neste ano porque em Singapura o carro não andou bem, mesmo.

Com o abandono de Senna, a torcida da Ferrari fez a festa com a dobradinha Berger-Alboreto. Festa ainda maior porque dias antes o fundador da equipe, Enzo Ferrari, tinha morrido, causando enorme comoção na Itália.

CURIOSIDADE – A Ferrari foi a equipe que impediu, duas vezes, uma equipe de vencer todas as corridas de uma temporada. Aconteceu com Berger em 1988 evitando os 100% da McLaren e com Sainz neste ano, derrubando as pretensões da Red Bull de ganhar tudo.

Max: pontuação mais alta da F-1 moderna

Mas há outros — muitos — números incríveis que devem ser anotados nos anais neste ano da graça de 2023, até que um dia caiam, se é que isso vai acontecer. Verstappen, por exemplo, marcou 575 de 620 pontos possíveis, 92,7% do total. Há casos de 100% na história, mas eles ocorreram em temporadas em que havia descarte de resultados. Em 1952, por exemplo, eram oito etapas e quatro descartes. Portanto, um piloto poderia somar no máximo 36 pontos (nove por vitória). Mesmo que marcasse mais, teria de jogar no lixo. É um desses casos de 100%, com Alberto Ascari. Como foram 100% as duas conquistas de Jim Clark em 1963 e 1965. Nos dois anos, os pilotos consideravam apenas os seis melhores resultados e descartavam outros quatro. O escocês ganhou sete corridas em 1963 e teve de jogar uma fora. Em 1965, venceu seis.

De qualquer forma, Max atingiu o maior aproveitamento de pontos de um piloto na F-1 desde 1966, quando Jack Brabham ganhou o Mundial com 42 dos 45 pontos que poderia marcar — 93,3%. Já a Red Bull pode se jactar de ter feito mais pontos do que a segunda e a terceira colocadas juntas. Foram 860 contra 815 de Mercedes + Ferrari.

Outra façanha de Verstappen: ele completou todas as voltas dos 22 GPs do ano. Antes dele, só Schumacher, em 2002 (17 corridas), e Hamilton, em 2019 (21), tinham feito o mesmo.

Já rolou uma caixinha aí em cima. Mais umas, agora?

FAÇANHA JAPONESA – Ao liderar cinco voltas do GP de Abu Dhabi, da 18ª à 22ª, Yuki Tsunoda se tornou o primeiro japonês a pontear uma corrida de F-1 desde 2004. Naquele ano, Takuma Sato, então na BAR, liderou duas voltas do GP da Europa em Nürburgring. Tsunoda ganhou do amigo internauta o título de “Piloto do dia” e ajudou a AlphaTauri a encerrar sua história com esse nome marcando pontos na oitava colocação. Não o suficiente, porém, para superar a Williams na briga pelo sétimo lugar entre os construtores. Terminou o ano com 25, contra 28 do time rival. Curioso é que a arrancada da AlphaTauri se deu mesmo no final da temporada. Nas últimas cinco provas, a equipe — que em 2024 deve se chamar Racing Bulls — marcou 20 pontos, contra cinco da Williams. Foi a despedida do querido e carismático Franz Tost da F-1. Ele estava na chefia do time havia 18 anos.

NADA GARANTIDO – Uma declaração de James Vowles, diretor da Williams, deixou com uma pulga atrás da orelha aqueles que apostavam na permanência de Logan Sargeant no ano que vem. O dirigente elogiou a melhora do piloto nos últimos cinco GPs, mas afirmou com todas as letras: “Logan está se esforçando para merecer [a vaga], mas não estamos em posição de confirmar [que ele vai ficar] neste momento”. É bom ficar de olho. A opção Drugovich ainda não está totalmente descartada.

CIAO, BAMBINI – Foram cinco anos alojada na Sauber, e não se pode dizer que a Alfa Romeo tenha muito a comemorar nesta sua nova passagem pela F-1 — a marca fez sucesso no começo dos anos 50, voltou meio capenga nas décadas de 70 e 80 e retornou agora no sistema “alugue uma equipe e coloque seu nome”. O contrato com o time suíço terminou e não rendeu muito. Nada de poles, pódios, primeiras filas. O sexto lugar no Mundial do ano passado foi o melhor momento, com 55 pontos dignamente somados, bem mais que os ridículos 16 deste ano — que deixaram a Alfa em penúltimo no campeonato. Mas, pelo menos, dois pilotos nos encheram de alegria no período: Raikkonen com sua pilotagem e seus maneirismos e Bottas com sua bunda branca. Ano que vem o time volta a ser Sauber, mantém Bottas e Zhou e em 2026 vira Audi.

É CAMPEÃO! – E teve título para um piloto apoiado pela marca. Ontem, Théo Pourchaire terminou a corrida longa do encerramento da F-2 em Abu Dhabi em sexto. Frederik Vesti, com quem disputava o título, foi o terceiro colocado. Mas o resultado não foi suficiente para descontar a diferença de pontos que o francês tinha aberto até então. Pourchaire fechou o campeonato com 203 pontos, contra 192 do dinamarquês apoiado pela Mercedes. Jack Doohan ganhou a última corrida do ano.

GOSTAMOS & NÃO GOSTAMOS

GOSTAMOS de ver como a McLaren reagiu a um começo desastroso de campeonato, terminando em quarto lugar com 302 pontos. Nas oito primeiras corridas, com um carro muito ruim, o time fez 17 pontos — média de 2,1 por GP. Nas 14 etapas seguintes, depois de estrear um carro praticamente novo na Áustria, foram 285 pontos, média de 20,3 por etapa. Se tivesse tido essa média o ano inteiro, chegaria em segundo no campeonato. De quebra, a McLaren ainda nos apresentou um jovem muito promissor, Oscar Piastri, que terminou a temporada em nono com 97 pontos — desempenho mais do que aceitável para um estreante.

NÃO GOSTAMOS do campeonato patético da Haas. Em 2018, seu terceiro ano na F-1, a equipe americana terminou o Mundial em quinto lugar com 93 pontos. Um desempenho sensacional para uma quase estreante na categoria. Nos cinco anos seguintes, somou 80. Foi duas vezes última colocada — como neste ano –, duas vezes penúltima e uma, antepenúltima. Em 2023, vexaminosos 12 pontos. Nem para nos divertir na Netflix serve mais.

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FOTO DO DIA

Massa vence em Cascavel: primeira desde 2008

SÃO PAULO (parabéns) – Felipe Massa venceu hoje a corrida #2 da rodada dupla de Cascavel da Stock Car, penúltima etapa do campeonato. Foi a primeira vitória do veterano piloto de 42 anos em corridas de carros desde 2 de novembro de 2008, quando venceu o GP do Brasil de F-1 em Interlagos com a Ferrari. Ele deixou a categoria no final de 2017, tendo disputado suas últimas quatro temporadas pela Williams. Depois, foram três campeonatos na Fórmula E sem bons resultados, até chegar à Stock em 2021.

Em sua terceira temporada na categoria, Massa disse hoje que seus dois primeiros anos muito ruins chegaram a levá-lo a pensar em parar. “Achei que estava velho e que talvez devesse procurar outra coisa para fazer”, contou. “Agora vejo que tenho lenha para queimar e quero lutar pelo título no ano que vem.”

A última rodada dupla do ano acontece dia 17 de dezembro em Interlagos. Com 56 pontos em disputa por etapa (dois para o pole e 30 para o vencedor da corrida #1 e 24 para o vencedor da corrida #2), os sete primeiros na classificação ainda têm chances matemáticas de título. Gabriel Casagrande lidera com 286 pontos, seguido por Daniel Serra (271), Felipe Fraga (253), Thiago Camilo (250), Rafael Suzuki (243), Rubens Barrichello (241) e Ricardo Zonta (237).

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ACA BHALOGO (3)

Festa de Verstappen em Abu Dhabi: domínio nunca visto

SÃO PAULO (tudo em seu lugar) – O Mundial de F-1 2023 terminou hoje em Abu Dhabi como começou no Bahrein, no mesmo pedaço do planeta que, atualmente, funciona como motor financeiro da categoria: com Max Verstappen na frente. Foi uma temporada de superlativos para o holandês e para a Red Bull. Max conquistou o tricampeonato por antecipação na véspera do GP do Catar, ao vencer a Sprint e fechar a disputa com seis corridas ainda pela frente. Pois é, o título foi conquistado também no mundo árabe. Oh, que sortudo o mundo árabe, que abre e fecha campeonatos e ainda consagra campeões.

(Podia respeitar os direitos humanos, também, mas isso é outra conversa.)

Verstappen bateu vários recordes em 2023: o de vitórias num ano (19 em 22 etapas), pódios na mesma temporada (21), voltas na liderança (1.003), vitórias seguidas (10) e pontos (575 de 620 possíveis, 92,7% do total), por exemplo. Além das 19 vitórias, ganhou quatro das seis Sprints e nas outras duas terminou uma em segundo e outra, em terceiro. Chegou a 54 triunfos na carreira e se tornou o terceiro maior vencedor de todos os tempos. Não abandonou nenhuma corrida. Das três que não venceu, chegou em segundo duas vezes (Arábia Saudita e Azerbaijão) e em quinto na sua pior participação (Singapura).

Prost, Senna e o MP4/4: McLaren de 1988 superada

Já a Red Bull inscreveu de vez o nome na história com o maior domínio já registrado por uma equipe na mesma temporada. Foram 21 vitórias em 22 etapas, 95,45% de aproveitamento, superando a mítica McLaren de 1988, que venceu 15 de 16 corridas com Senna e Prost. O percentual de aproveitamento do time de Ron Dennis naquele ano foi de 93,75%. Mais uma marca que cai.

E cai graças a Verstappen, porque seu opaco companheiro de equipe, Sergio Pérez, conseguiu terminar o ano com menos da metade dos pontos, 285, e duas meras vitórias. Se Max corresse sozinho pela Red Bull, ainda assim o time teria sido campeão mundial de construtores, já que a vice de 2023, a Mercedes, terminou com 409. Dos 30 troféus que a esquadra austríaca levou para casa, Checo foi responsável por apenas nove. Aliás, esse é um recorde que a Red Bull não bateu, o de pódios na mesma temporada. A primazia segue com a Mercedes, que levou 33 taças em 2016, 32 em 2015 e 2019 e 31 em 2014.

Quadriculada para Max: 19 vitórias em 22 corridas

Esse monte de números, e outros surgirão ao longo deste relato, é importante para que se compreenda o caráter histórico deste campeonato, em que pese o fato de ele não tenha sido grande coisa do ponto de vista da competição. Max avisou que seria campeão muito cedo e ninguém fez cócegas em seu favoritismo. Aproveitou que tinha um grande carro nas mãos, juntou a máquina ao seu talento extraordinário e simplesmente massacrou a concorrência sem dó.

E quase sempre deixou o massacre para os domingos (OK, em Las Vegas foi sábado…), porque se teve algo com que não e preocupou muito em 2023 foi em fazer pole-positions. Não é muito sua praia. Foram apenas 12 nas 22 corridas, 54,55% do total, o que não é muito impressionante. Nigel Mansell, por exemplo, fez 14 das 16 possíveis em 1992, 87,5%, melhor aproveitamento da história até hoje.

Ajudou nesse verdadeiro empilhamento de cifras quase absurdas a inoperância das rivais. A Mercedes, que dominou a F-1 de 2014 a 2020 e começou a ter seu poder ameaçado em 2021 por Max e pela Red Bull, entrou em parafuso no ano passado na primeira temporada de um novo regulamento aerodinâmico que gestou um carro horroroso. O calvário dos alemães seguiu neste ano com um automóvel igualmente ruim, que deixava perplexos seus pilotos a cada volta. Ao final do campeonato, foram apenas oito pódios, uma pole e nenhuma vitória em 22 finais de semana.

Ferrari: poles com Leclerc (acima) e uma vitória com Sainz

Já a Ferrari, outra potencial adversária, juntou nove taças e foi um pouco melhor nas poles (sete) e vitórias (uma, com Sainz em Singapura). Outros dois times que se destacaram, a Aston Martin e a McLaren, viveram momentos muito distintos no ano. A primeira começou o campeonato bem, enchendo a estante de troféus com Fernando Alonso, mas a partir da metade da temporada despencou. A segunda iniciou o ano de forma patética, mudando radicalmente seu carro a partir da Áustria e, aí sim, entrou no Mundial de verdade. Mas não ganhou uma corrida sequer, nem fez uma pole. Tiveram seus momentos, Aston Martin e McLaren. Mas tiveram de se contentar com migalhas.

Nesse cenário, ficou fácil antever o que iria acontecer a cada GP desde 5 de março, quando foi dado o pontapé inicial na temporada. Um carro muito bom, que não quebra, nas mãos de um piloto excepcional, que não erra, só podia dar no que deu. A chave de ouro foi usada para fechar os trabalhos no circuito de Yas Marina. Então, vamos ao último capítulo de 2023.

Largada em Yas Marina: Verstappen sustenta a ponta e vai embora

Durou – o quê? – uns 20 segundos o trabalho pesado de Verstappen no GP de Abu Dhabi. Ele largou bem, como de costume, olhou no espelho para ver se alguém o incomodaria, e viu Chaleclé. “Ele de novo, coitado…”, pensou. Deu uma aceleradinha, contornou as primeiras curvas no modo “aff-que-saco-toda-largada-tem-alguém-pra-me-incomodar-mesmo-sabendo-que-não-vai-ganhar”, espiou outra vez o retrovisor e lá estava o monegasco ainda atrás. Max olhou o volante, girou o botão para o modo “não-dê-falsas-esperanças-a-ninguém-principalmente-para-pilotos-da-Ferrari” e foi embora, não sem antes anotar mentalmente: “Vou pedir para diminuir o tamanho da descrição dessas funções, perco muito tempo lendo. Outro dia me atrapalhei com ‘dar-o-vácuo-pro-Pérez-pra-ver-se-ele-consegue-fazer-alguma-coisa’ e confundi com ‘humilhar-Lewis-passando-por-fora-sem-asa-móvel-mandando-dedo-pro-Toto’, e naquele dia quase deu ruim”.

Nas primeiras voltas da corrida foi bacaninha a briga de Russell e Piastri pela quarta posição. O australiano já tinha perdido o terceiro lugar para seu companheiro Norris e segurou Jorginho por um bom par de voltas, até que foi ultrapassado, na volta 11.

Na 13ª volta, Alonso abriu a janela de paradas. Estava em sétimo, caiu para 18º. Piastri veio na volta seguinte. Depois, Russell e Norris – que demorou um pouco e acabou perdendo a posição para o #63 da Mercedes. Vislumbrava-se uma corrida de dois pit stops para quem visitava os boxes tão cedo. Todos colocaram pneus duros.

Verstappen parou na volta 17. Leclerc, na 18. E quem assumiu a ponta, pela primeira vez na vida, foi Yuki Tsunoda, na despedida da AlphaTauri da F-1 com esse nome – ano que vem será Racing Bulls. Stroll era o segundo. Ambos sem trocar pneus. O canadense da Aston Martin tinha largado com pneus duros e demoraria, mesmo, para parar. Sainz, também com pneus duros desde o início, era o terceiro. Mas o japinha tinha pneus médios e estava curtindo a liderança. Esticava o stint para tentar uma parada única na corrida, o que seria bem interessante.

Na volta 19, Max passou o espanhol da Ferrari e foi para a terceira posição, com dois carros à frente com pneus velhos. Em pouco tempo retomaria a ponta. Na volta 21, deixou Lance para trás. “Max, coloque agora o carro no modo ‘sair-do-pit-stop-e-passar-logo-os-carros-que-ainda-não-pararam-porque-estão-em-estratégias-diferentes-mas-não-por-isso-muito-eficientes’”, pediu o engenheiro. “Não dá pra resumir um pouco isso não?”, pediu o holandês. “Max, você sabe que trabalhamos com informações precisas, por favor apenas faça o que estamos pedindo”, respondeu o engenheiro em tom de repreensão. “E se você está achando complicada nossa comunicação e longos os textos impressos no painel, depois te mostro o volante do Russell.”

Tsunoda e Stroll pararam na volta 23. Voltou em 12º. Àquela altura, Sainz e Bottas eram os únicos na pista sem pit stops. A Ferrari chamou Carlos na volta 24 e colocou pneus duros de novo, mas teria de parar outra vez. Não tinha muita importância, de qualquer maneira. A corrida seguia sem grandes emoções, com Max bem à frente de Leclerc, Russell em terceiro, Norris em quarto e Piastri em quinto. Este, sim, tendo de se defender. No caso, de Pérez. Que passou o australiano na volta 18. O jovem estreante da McLaren, tão bem na classificação, não tinha um bom ritmo de prova.

Sainz: posição ruim de grid prejudicou o espanhol

Na metade da corrida, com Russell em terceiro e Hamilton em oitavo, a Mercedes seguia na frente da Ferrari na briga pelo vice-campeonato. Os italianos pontuavam apenas com Leclerc, em segundo, já que Sainz se debatia com o segundo escalão em 14º, cercado por Gasly e Hülkenberg, longe dos pontos.

A segunda parada de Norris aconteceu na volta 34. Russell foi chamado na sequência. Contestou a decisão da Mercedes. “Será que não podemos ir até o final com apenas uma parada? Foi uma estratégia que discutimos ontem de madrugada, lembram? Foi naquela hora em que todos sentimos fome e fiz uma surpresa para vocês, encomendando quibes e esfihas pelo delivery. Sim, eu sei que faltou um limãozinho, mas aqui é meio complicado conseguir limões. Naquela hora eu falei de fazer uma parada apenas e vi que teve gente que concordou com a cabeça”, argumentou. Toto Wolff entrou no rádio e, de forma até rude, interrompeu o piloto: “Era eu, George, e não estava concordando com uma parada, estava apenas confirmando que o quibe ficava gostoso com coalhada seca, para logo e troca esse pneu!”.

Ele parou e trocou, como fizeram Leclerc e Hamilton também. Verstappen e Pérez, assim, passaram a ocupar primeiro e segundo lugares. Max entrou no rádio e, solícito, ofereceu os boxes para o mexicano. “Se vocês quiserem chamar o Checo antes para trocar os pneus, fiquem à vontade”, disse. Mas demorou, até. Pérez parou na volta 43. Verstappen, como tinha sugerido, uma depois.

Pérez: ajudinha de Verstappen

Na volta 46, a 12 do final, Verstappen, Leclerc, Russell, Norris, Pérez, Tsunoda, Piastri, Alonso, Sainz e Hamilton eram os dez primeiros. Desses, Sainz ainda precisava parar mais uma vez. A prova melhorou um pouco, com alguns duelos entre Pérez e Norris, Lewis e Alonso, depois o próprio Hamilton contra Sainz. A cada instante a transmissão da TV, com as mudanças de posição na pista, informava como estava a pontuação no campeonato. A Ferrari já tinha passado a Mercedes, depois empataram, na sequência o time alemão voltou à vice-liderança. O único que parecia se importar com isso era Russell, que a todo momento perguntava onde estava Hamilton, como estava a tabela, quanto cada equipe ganharia em prêmios pelo segundo lugar, até Toto Wolff, de novo, pedir para ele calar a boca que não era problema dele.

Pérez tomou uma punição de 5s por tocar em Norris quando passou o inglês. Mas foi à luta. Na volta 54, passou Russell, também, e assumiu a terceira colocação. Para garantir o pódio, porém, precisava colocar pelo menos 5s de vantagem sobre o Mercedão #63.

Fazendo contas sabe-se lá com qual calculadora, Leclerc deixou Pérez passar para que ele tentasse manter a posição em relação a Russell, tirando pontos da Mercedes. Charlinho, claro, manteria o segundo lugar com a punição ao #11 da Red Bull. No fim, não deu muito certo. Checo recebeu a bandeirada em segundo, mas caiu para quarto com o acréscimo de 5s ao seu tempo final de prova. Xingou os comissários pelo rádio e foi chamado à torre para pedir desculpas.

Verstappen, Leclerc e Russell foram para o pódio. Jorginho não ganhava um troféu desde o GP da Espanha, em junho. Fecharam os pontos, pela ordem, claro, Pérez, Norris, Piastri, Alonso, Tsunoda, Hamilton e Stroll. Fernandinho passou Yuki na última volta e conseguiu segurar o quarto lugar entre os pilotos com 206 pontos, o mesmo que Leclerc, mas com vantagem nos critérios de desempate. Norris, com 205, ficou em sexto. Sainz, que chegou a Yas Marina em quarto, zerou e terminou em sétimo.

O resultado assegurou o vice para a Mercedes, com 409 pontos. A Ferrari terminou com 406. Se Sainz tivesse se classificado melhor ontem, talvez os italianos conseguissem superar os alemães, mas a tarefa ficou complicada com o espanhol lá no fundão do grid.

Verstappen e Tost: criatura e criador

Max termina o ano com 19 vitórias em 22 corridas. Recorde absoluto também no aproveitamento: 86,36%. Com 54 vitórias, passou a ser o terceiro maior vencedor da história, deixando Sebastian Vettel para trás. Agora, só Hamilton (103) e Schumacher (91) ganharam mais do que ele.

Foram 21 pódios para Verstappen, outro recorde absoluto que, em termos proporcionais, só não supera os 17 de Schumacher nas 17 etapas de 2002 – 100% de presenças entre os três primeiros. Em Abu Dhabi, ele se tornou o primeiro piloto a ultrapassar as mil voltas na liderança num ano. Chegou a 1.003, 75,7% do total de 1.325 voltas percorridas na temporada. Outro recorde, superando os 71,4% de voltas lideradas por Jim Clark em 1963 – 506 de 708.

Zerinhos em Abu Dhabi: comemoração na pista, lágrimas no pódio

O tricampeão mundial fez os tradicionais zerinhos para colocar um ponto final em 2023 assim que recebeu a bandeirada. Pelo rádio, agradeceu Franz Tost, que lhe deu a primeira chance na Toro Rosso em 2015 e se despediu hoje da sucessora AlphaTauri: “Ele teve muitos de nós sob suas asas”, reconheceu. Falou do orgulho por uma “temporada incrível” e admitiu que vai ser difícil repetir algo parecido no futuro.

No pódio, Max ouviu o hino da Holanda de cabeça baixa. Estava emocionado e seus olhos, quando levantou o rosto, surgiram vermelhos.

Na última corrida do ano, foi a única coisa diferente que fez na temporada: chorar.

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ACA BHALOGO (2)

Max coloca mais uma pole na conta: 12 no ano, 32 na carreira

SÃO PAULO (o cara é isso mesmo que vocês estão pensando) – Mesmo quando as coisas não vão muito bem, Max Verstappen parece dar um jeito. O fim de semana dele e da Red Bull em Abu Dhabi não vinha sendo grande coisa. Nos treinos livres, nenhum resultado muito encorajador. Outras equipes e pilotos, como George Russell, da Mercedes, Lando Norris, da McLaren, e Charles Leclerc, da Ferrari, estavam animadinhos. Williams, Alpine e Alfa Romeo prometiam surpresas.

No time, o guru Helmut Marko apostou com o chefe Christian Horner que Max não faria a pole. Perdeu 500 euros. Max fez a pole. Pela 12ª vez no ano, 32ª na carreira. Encerra a temporada largando na frente. E empata com Nigel Mansell nas estatísticas. Ao lado dele, é o sétimo maior “poleman” da história. Lewis Hamilton (104), Michael Schumacher (68), Ayrton Senna (65), Sebastian Vettel (57), Jim Clark e Alain Prost (33 cada) estão à sua frente. Em breve ele entra na listinha dos top-5.

O grid em Abu Dhabi: campeonato termina amanhã

A classificação noturna de Abu Dhabi teve algumas surpresas boas e outras ruins. No Q1, por exemplo, uma Ferrari ficou pelo caminho, a de Carlos Sainz — que reclamou de tráfego e de pilotos que atrapalham os outros “de propósito”. O espanhol ficou com o 16º tempo e liderou o grupo dos primeiros eliminados, que teve atrás dele Kevin Magnussen, Valtteri Bottas, Guanyu Zhou e Logan Sargeant. A dupla da Alfa Romeo não encontrou nenhuma explicação para a queda de desempenho brutal, depois de andar nos treinos sempre entre os dez melhores. O americano da Williams, último de novo, pelo menos tinha uma desculpa. Ou duas. Porque foram duas as (boas) voltas canceladas por exceder os limites de pista. Azar dele. Fecha o ano com um sonoro 0 x 22 para seu companheiro de equipe Alexander Albon em grids. Curiosidade: a última lavada de zero em classificações aconteceu em 2020. E quem tomou? Albon. Levou de 17 x 0 de Verstappen.

Outra surpresa que se encaixa na categoria das ruins foi a performance de Hamilton no Q2. Ficou em 11º, sendo alijado da briga pela pole. “O carro estava mais inconsistente do que nunca. Não dá para prever o que ele vai fazer na pista. Zero de equilíbrio. Ainda bem que é a última com ele”, desabafou, maldizendo o modelo W14. Junto com ele afundaram Esteban Ocon, Lance Stroll, Albon e Daniel Ricciardo. O francês da Alpine, estafado, disse que estava se sentindo mal e que a F-1 está beirando a desumanidade. Falando sobre a temporada de 2024, que terá 24 etapas, cravou: “O nosso corpo não é desenhado para isso”.

O Q3 acabou sendo mesmo o momento do showzinho de Verstappen. Quem parecia que poderia incomodar era a dupla da McLaren. Mas Norris cometeu um erro em sua volta rápida, uma rabeada na última curva, e ficou em quinto. “Tenho feito um trabalho de merda aos sábados”, criticou-se. Seu companheiro Oscar Piastri, em compensação, conseguiu uma ótima terceira posição — uma das surpresas boas da noite. O segundo colocado foi Leclerc, que pela quinta vez seguida larga na primeira fila.

Tempo de Max, Max, Max, Supermax: 1min23s445. “Eu não esperava”, jurou. “O carro melhorou muito na classificação. Estava ruim demais nos treinos livres.” Foi sua quarta pole seguida em Abu Dhabi. Ele só precisou dessa volta para garantir o primeiro lugar. Na segunda, não conseguiu bater o próprio tempo. Leclerc ficou a 0s139 dele.

Russell acabou colocando uma Mercedes em quarto, à frente da McLaren #4, tirando mais do carro do que ele pode oferecer. Outra boa surpresa. Como também foi o sexto colocado, Yuki Tsunoda, da AlphaTauri — sua melhor posição de largada no ano. Fernando Alonso, Nico Hülkenberg, Sergio Pérez (que teve a melhor volta cancelada) e Pierre Gasly formaram o time dos dez primeiros.

Caixinhas, agora, porque daqui a pouco tem live no YouTube.

Esse deve ser o novo nome da AlphaTauri em 2024: Racing Bulls

NOVO NOME – A AlphaTauri, já foi anunciado, muda de nome no ano que vem. A Red Bull deve, inclusive, fechar a marca de roupas que batiza o time. A equipe, que nasceu da compra da Minardi, estreou em 2009 como Toro Rosso. Assim foi até 2019. Em 2020 assumiu o nome da grife. A Red Bull estava tentando vender o nome para outra patrocinadora, se possível do mundo da moda — falou-se em Hugo Boss e adidas –, mas não rolou. Racing Bulls deve ser a nova denominação. A marca já foi registrada e a programação visual, idem. Outra mudança drástica é a também já anunciada aposentadoria do chefe Franz Tost, que está no time desde sempre e recebeu muitas homenagens neste fim de semana. Seu substituto vem da Ferrari, Laurent Mekies.

Alfa Romeo: despedida da marca com a Sauber

DESPEDIDA – Outro time que se despede da F-1 com o nome que tem é a Alfa Romeo. Foram cinco anos com a marca alojada na Sauber, desde 2019. Em 2024 e 2025, a equipe volta ao nome original, Sauber, usado entre 1993 e 2005 e de 2011 a 2018 — no intervalo entre esses dois períodos, foi BMW. Em 2026, será rebatizada como Audi.

DECISÃO AMANHÃ – A F-2 termina amanhã com Frederik Vesti brigando pelo título com Théo Pourchaire. Hoje na prova Sprint, o dinamarquês venceu e o francês ficou em sétimo — Enzo Fittipaldi terminou em segundo depois de liderar a prova quase toda. Assim, a diferença de pontos a favor de Pourchaire caiu de 25 para 16 pontos. Ele larga em 14º amanhã, com Vesti em nono.

OBSOLETO – Fernando Alonso disparou contra o sistema de classificação da F-1. “Era a melhor sessão do fim de semana, velocidade pura, os carros em plenitude. Virou a pior”, afirmou o espanhol da Aston Martin. “É a pior para as equipes, para os pilotos, para os mecânicos. É tráfego, saída lenta de box, limites de pista, volta cancelada, piloto punido por impedir o outro, delta de velocidade… Não era para ser assim. Esse negócio ficou obsoleto.” Falando em obsolescência, talvez não programada, mais uma regra para encher os baguás: não pode mais passar ninguém dentro do pit-lane em saída de box. Se o cara estiver se arrastando à sua frente, tem de buzinar ou dar farol.

RETRATO NA PAREDE – Vocês viram a foto da Alfa Romeo um pouco acima. Hoje foi dia de fazer aquele retrato bacana de fim de temporada, com todo mundo aparecendo. Já estão todos nostálgicos, apesar da pauleira que foi a temporada de 22 etapas (e que se preparem para coisa ainda pior no ano que vem). Tem duas dessas aí embaixo, só de exemplo. Para ver em tamanho gigante e encontrar seus wallys preferidos, é só clicar nas imagens.

PLACAR – Para fechar, os duelos de classificações do ano. Já falamos acima, a maior pancada foi de Albon sobre Sargeant, 22 x 0. Depois, Verstappen 20 x 2 Pérez. Alonso enfiou 19 x 3 em Stroll. Tsunoda fez 16 x 6 nos seus três companheiros (De Vries, Lawson e Ricciardo). Quatro pilotos cravaram 15 x 7 em seus parceiros: Hülkenberg, Bottas, Norris e Leclerc — em cima, respectivamente, de Magnussen, Zhou, Piastri e Sainz. Gasly goleou Ocon por 14 x 8. E o único empate aconteceu na Mercedes entre Hamilton e Russell: 11 x 11.

O GP de Abu Dhabi, encerrando o ano fiscal da velocidade de 2024, começa às 10h de Brasília.

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ONE COMMENT

E quase deu para o reizinho do Canindé… A ótima história sobre o look de Hamilton em Interlagos está aqui, deliciosamente contada pela repórter Camila Alves. Jornalismo com J maiúsculo.

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DICA DO DIA

Beto Dessordi mandou pelo Instagram. Câmeras on-board antes de 1987. Escolha pista & piloto na lista da minutagem, na descrição do vídeo. Deleite-se.

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ACA BHALOGO (1)

O carro de Sainz: batida forte no segundo treino

SÃO PAULO (cumprindo tabela) – Metade do grid, hoje, teve apenas 26 minutos de treino em Abu Dhabi. As equipes deixaram para cumprir na última corrida do ano a obrigação de oferecer um treino livre a novatos, e a primeira sessão teve dez deles na pista. Na segunda, com todos os titulares em ação, duas bandeiras vermelhas tomaram 34 minutos do treino e, assim, o dia não serviu para muita coisa.

Mas esse GP também não serve. No calendário desde 2009, a partir de 2014 a prova de Yas Marina passou a fechar as temporadas da F-1, mediante robusto pagamento. Foi assim também nos dois primeiros anos. E em apenas quatro oportunidades o campeão saiu da corrida noturna nos Emirados Árabes: em 2010 (com Vettel), 2014 (Hamilton, com a ridícula pontuação em dobro que felizmente não foi decisiva), 2016 (Rosberg) e 2021 (Verstappen). A última delas é célebre, aquele rolo todo envolvendo um safety-car no fim e a presepada do ex-diretor de provas Michael Masi, que tirou o oitavo título de Lewis.

Neste ano, é um GP amistoso novamente. Os dois títulos estão decididos a favor de Verstappen e da Red Bull, e de relevante, mesmo, restou uma disputa pelo vice entre Mercedes e Ferrari. Os alemães estão quatro pontos à frente.

Por isso, um enxame de garotos invadiu o circuito no primeiro treino, entre eles o brasileiro Felipe Drugovich, que acabou se destacando com a segunda colocação. Ele só ficou atrás de George Russell, da Mercedes, que fez o melhor tempo em 1min26s072. O piloto de testes da Aston Martin ficou 0s288 atrás do inglês, um bom resultado. Foi o único reserva a andar na frente do titular, já que Lance Stroll terminou a sessão em quinto. Entre as equipes, só a AlphaTauri andou com seus dois pilotos principais. A Red Bull deu folga a ambos e até um quase veterano de 28 anos, Jake Dennis, campeão da F-E, teve a chance de guiar um F-1 pela primeira vez — presentão de Natal, ocupou o cockpit do carro de Verstappen, vejam vocês.

A molecada acabou se comportando melhor que os adultos, já que Carlos Sainz e Nico Hülkenberg bateram no segundo treino causando as longas interrupções. O primeiro, vítima do bueiro de Las Vegas na semana passada, perdeu o controle numa ondulação da pista árabe e bateu forte na barreira de proteção. Estragou bem a Ferrari #55. Isso com dez minutos de treino. Depois de quase meia hora de paralisação, o alemão da Haas rodou sozinho e deu de traseira no muro assim que a sessão foi reiniciada.

Os tempos de hoje, portanto, são pouco representativos para apontar o que pode acontecer na derradeira etapa de 2023. Amanhã o terceiro treino livre servirá para que pilotos e equipes busquem algum caminho para a classificação e a corrida, se nenhuma intercorrência atrapalhar.

Mas cumpre, claro, registrar os melhores. O ferrarista Leclerc foi o mais rápido com 1min24s809, meros 0s043 à frente de Norris, da McLaren. A equipe papaia tende a andar bem em Abu Dhabi, recuperando-se do mau desempenho de Las Vegas. Em sexto no Mundial com 195 pontos, Landinho sonha em superar Sainz e Alonso, que têm 200 e estão à sua frente na classificação. Seria um belo prêmio de consolação para quem faz uma segunda metade de temporada admirável. Nas últimas dez corridas, Norris somou 135 pontos e só perde para os 268 de Verstappen. No mesmo período, os que estão à sua frente na tabela foram superados até com folga: Pérez marcou 102, Hamilton fez 99, Sainz somou 113 e Alonso amealhou 61.

Os tempos do segundo treino: poucas voltas

Max foi o terceiro colocado, seguido por um surpreendente Bottas, Pérez, Russell, Zhou, Hamilton, Gasly e Piastri nas dez primeiras posições. O holandês foi protagonista de alguns momentos engraçados durante os treinos, ansioso que estava para percorrer o maior número possível de voltas, já que seu carro foi emprestado a outrem na primeira atividade da sexta-feira.

Pelo rádio, reclamou com seu engenheiro que tinha gente saindo à sua frente nos boxes e, depois da segunda parada, ultrapassou dois carros da Mercedes pelo acostamento na saída do pit-lane, que em Abu Dhabi se dá por um túnel debaixo da pista. Estava com pressa. Alguém pode achar que é arrogância ou bobagem, já que nada mais há a decidir neste ano. Eu interpreto como profissionalismo, mesmo.

Verstappen x dupla da Mercedes: pelo acostamento

Agora vocês vão ficar com uma pilha de caixinhas coloridas para atualizar o noticiário da semana, que foi até agitadinho.

PAUSA PARA A F-1 – Dois dos novatos que andaram no primeiro treino estão na disputa pelo título da F-2 neste fim de semana em Abu Dhabi: Théo Pourchaire, francês da Alfa Romeo, e Frederik Vesti, dinamarquês da Mercedes. O primeiro lidera o campeonato com 191 pontos, 25 à frente do segundo. Vesti começou melhor os trabalhos, ficando com a nona colocação no grid para a corrida longa de domingo. Pourchaire larga em 14º. O regulamento inverte os dez primeiros para a prova curta de sábado, e assim Vesti parte da primeira fila amanhã, em segundo, ao lado de Enzo Fittipaldi — décimo colocado hoje. O pole de verdade para domingo é Jack Doohan. Pelas regras, larga em décimo na Sprint. É meio idiota, a regra? É.

ENZO FICA… – …com a Red Bull. Mas não na Red Bull. Não sei se deu para entender. O neto de Emerson Fittipaldi, piloto da Academia da Red Bull neste ano na F-2, continua com o patrocínio da marca em 2024. Mas não fará parte do programa de desenvolvimento de jovens pilotos do time de energéticos. Segue apenas como garoto-propaganda. Enzo está cavando um lugar na Indy, onde correrá seu irmão Pietro.

AQUI E LÁ (1) – Já o mexicano Pato O’Ward, também presente hoje no primeiro treino livre com a McLaren, foi confirmado como reserva do time para a temporada 2024 da F-1. Paralelamente, ele segue correndo na Indy, campeonato do qual a equipe papaia também participa.

AQUI E LÁ (2) – Outro que definiu seu futuro foi Mick Schumacher. Dispensado da Haas no ano passado, passou a ser reserva da Mercedes e foi a todas as corridas desta temporada na condição de papagaio de pirata de Toto Wolff. Seu contrato foi renovado para que continue ao lado do chefe vendo as provas de fone no ouvido, mas ele arrumou também uma boquinha para correr no WEC pela Alpine na categoria de hipercarros.

HAMILTON NA RED BULL – Telegraficamente, para não esticar muito. No início da semana, em entrevista ao “Daily Mail”, Christian Horner disse que foi procurado pelo estafe de Hamilton no começo do ano para sondar um lugarzinho na Red Bull. E acrescentou que o inglês também “conversou sério” com a Ferrari. Ontem, Lewis negou. Disse que não fala com o chefe rubro-taurino “há anos” e que o único contato com o dirigente foi uma mensagem de texto que recebeu antes de começar a temporada “num número de telefone antigo”. “Chequei com todos que trabalham comigo e ninguém procurou Christian. A gente o conhece. Ele adora dessas coisas”, espetou. Na tréplica, Horner devolveu: “Quem me procurou tem o sobrenome Hamilton”, garantiu, insinuando que o pai no piloto, Anthony, estaria envolvido no caso. “O pai de Lewis não trabalha com ele desde 2010”, respondeu Toto Wolff. “O outro lá só quer atenção.”

Leclerc: segue na Ferrari, e com Sainz

MAIS ALGUNS ANOS – A informação é do jornalista italiano Leo Turrini, que não erra: Carlos Sainz e Charles Leclerc terão seus contratos estendidos com a Ferrari. Os dois compromissos terminam no final do ano que vem e o espanhol estava fortemente associado a boatos que o colocavam na Audi — a marca alemã está comprando a Sauber e estreia na F-1 com time próprio em 2026. Pelo jeito, Maranello convenceu Sainz a ficar. Charlinho parece eternamente ligado ao time vermelho.

MAIS UM ANO – Já Fernando Alonso, que tem a vida acertada com a Aston Martin também até o fim de 2024, deve espichar seu acordo por pelo menos mais uma temporada, a de 2025. É a intenção da equipe, inclusive. E Alonso, quando assinou, fez um contrato 2 + 1: dois anos garantidos, mais um terceiro opcional. Não será surpresa nenhuma, sua permanência. Apesar da idade — está com 42 anos –, Fernandinho segue em plena forma. Só neste ano já juntou oito troféus. A Aston Martin tem nove no total.

MAIS SETE ANOS – E a Mercedes seguirá sendo fornecedora de motores da McLaren até 2030. O contrato atual termina no final de 2025 e foi esticado por mais cinco anos. Nos próximos sete, portanto, McLaren é Mercedes e ponto final. As duas se uniram pela primeira vez em 1995 e a parceria foi até 2014. Em 2021, depois de de experiências não muito bem sucedidas com Honda e Renault, a equipe voltou a usar os motores alemães. De Mercedes novamente nas últimas três temporadas, a McLaren conseguiu 15 pódios e uma vitória — de Ricciardo, em Monza/2021.

ESCOLINHA – Toto Wolff, chefão da Mercedes, recebeu uma reprimenda formal da FIA por ter batido boca com Frédéric Vasseur, homólogo da Ferrari. A discussão aconteceu em Las Vegas por causa da absurda punição a Sainz, que quebrou a bateria de seu carro numa tampa de bueiro. O time italiano solicitou que o piloto não perdesse posições no grid pela troca do equipamento, mas Wolff se posicionou contra. Houve xingamentos de lado a lado. “Foi a segunda vez que fui repreendido na vida”, debochou Wolff. “A primeira foi em 1984 quando eu tinha 12 anos, na escola.”

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UM MILHÃO, 50

SÃO PAULO (coisa linda!) – Passando por aqui para informar que em 22 de novembro de 1973, exatamente 50 anos atrás, saiu da linha de montagem de Zwickau o Trabant número um milhão. Ele está lindamente guardado no August Horch Museum.

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SOBRE ONTEM DE MADRUGADA

A IMAGEM DA CORRIDA

“Aí eu coloquei por dentro e tchau”

SÃO PAULO (tá acabando) – Apesar da profusão de imagens coloridíssimas e luminosíssimas de Las Vegas, incluindo aquelas da simpática Esfera — a história de proibir luzes vermelhas, amarelas e azuis era cascata –, acho que vou me lembrar dessa corrida, para sempre, pelo trajeto dos três primeiros dos boxes até o hotel Bellagio, onde foi feita a entrevista pré-pódio.

Leclerc, Verstappen e Pérez fizeram caretas ótimas dentro do Rolls Royce. E caiu o mito do luxo e do conforto do carro mais caro do mundo (nem é mais, mas quando eu era criança Rolls Royce era o carro mais caro do mundo e pronto): só cabem dois atrás. Meus DKWs são mais espaçosos.

Estou na correria hoje, então vamos acelerar no rescaldão.

O NÚMERO DE LAS VEGAS

Em 2016, a Mercedes estabeleceu um recorde de vitórias na mesma temporada. Foram 19 em 21 corridas, naquele ano em que Rosberg e Hamilton se engalfinharam pela taça. E Rosberguinho levou. Aproveitamento mercêdico: 90,4%. Pois a Red Bull chegou a 20 vitórias nas mesmas 21 corridas. Já é recorde absoluto, mas temos sempre de levar em conta o percentual em relação ao número de corridas, porque os campeonatos variam de tamanho. Até agora, o que Verstappen (18 vitórias) e Pérez (duas) fizeram bate nos 95,2% de aproveitamento. Mas ainda tem uma prova para fechar o Mundial. Se não ganhar em Abu Dhabi, o time encerra o ano com 90,9% de vitórias. Se vencer, vai a 95,4%. A McLaren de 1988, com 15 vitórias em 16 etapas, teve aproveitamento de 93,7%.

Verstappen ganhou as três provas disputadas neste ano nos EUA — em Miami, Austin e Las Vegas. Sem muitas papas na língua, não economizou críticas ao excesso de penduricalhos do evento do último fim de semana. Detonou o que considerava “1% esporte e 99% espetáculo”, o público “que não entende nada do que fazemos na pista”, os organizadores que deram cupons de compra no valor de 200 dólares aos que foram expulsos das arquibancadas no segundo treino livre (“se fosse comigo, eu quebrava tudo”).

Mas se rendeu à qualidade da prova e admitiu que se divertiu bastante. Ao final da corrida, era um sorriso só. Como muita gente, acabou tendo uma boa surpresa num circuito que, de início, parecia ser um dos mais desinteressantes da temporada. O que nos leva à…

FRASE DE VEGAS

“Não esperava que a pista fosse tão boa. Para todos que foram tão negativos sobre este fim de semana, acho que Vegas provou que estavam todos errados.”

Lewis Hamilton

De acordo com os organizadores, passaram pelas catracas do circuito 315 mil pessoas nos três dias do evento. O contrato de Las Vegas com a F-1 é de dez anos. Viram Verstappen conquistar seu 20º pódio no ano, mais um recorde que o holandês amplia — maior número de troféus na mesma temporada; no ano passado, foram 18. O piloto completou 40 corridas seguidas nos pontos. Hamilton detém esse recorde, com 48 provas pontuando seguidamente, entre Inglaterra/2018 e Bahrein/2020.

Clark em 1963: recorde superado

Max liderou 951 voltas até agora nesta temporada, 75% das 1.267 cumpridas em 21 corridas. O GP de Abu Dhabi terá 58 voltas. É isso mesmo que vocês estão pensando. Se ele liderar pelo menos 49, chegará à incrível marca de mil voltas em primeiro lugar no mesmo ano. De qualquer forma, ele já tem mais um recorde assegurado: percentual de voltas na liderança em relação ao total de um campeonato. Mesmo se não ficar na ponta em nenhum momento em Yas Marina, ele fecha o ano com 71,7% das voltas lideradas. O recorde anterior era de 1963. Jim Clark, naquele Mundial, liderou 506 das 708 voltas percorridas — 71,4%.

GOSTAMOS & NÃO GOSTAMOS

GOSTAMOS de Esteban Ocon, que largou em 16º e, com apenas um pit stop, terminou em quarto. Na verdade, quinto. Mas com a punição de 5s para Russell, subiu uma posição. Fez uma prova muito madura e encostou em seu companheiro Gasly na classificação: 62 x 58 para Pierre. Com o detalhe importante: nas últimas três provas, Ocon marcou 14 pontos; Gasly, seis. Pierre era o quarto no grid, mas terminou só em 11º, com problemas depois da troca de pneus.

NÃO GOSTAMOS de ver a Williams desperdiçar uma grande chance de pontuar. Albon largou em quinto e Sargeant, em sexto. Terminaram em 12º e 16º, respectivamente. Andaram para trás. O “graining” nos pneus — esfarelamento, granulação, “macarrãozinhamento” — foi apontado como grande vilão para ambos. “No meio da corrida me vi com pneus velhos lutando com um monte de gente de pneus novos”, resmungou Alexander, culpando também a estratégia de uma parada. “O momento do safety-car foi ruim para a gente. Temos de rever alguns cálculos”, disse.

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NAS ASAS

Postagem totalmente aleatória. Gatwick, Londres, 1987. Um jardim de DC-10.

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