Blog do Flavio Gomes
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Aos Electra

SÃO PAULO (uma vez fui no lounge) – Recebo e-mail simpaticíssimo do blogueiro Clezio Soares da Fonseca sobre sua paixão pelos Electra e suas lembranças em Diadema, quando eles passavam sobre sua cabeça rumo ao Rio, e Clezio se imaginava lá dentro, e imaginava que lá dentro também iam pilotos famosos, misturando seu amor pelos […]

SÃO PAULO (uma vez fui no lounge) – Recebo e-mail simpaticíssimo do blogueiro Clezio Soares da Fonseca sobre sua paixão pelos Electra e suas lembranças em Diadema, quando eles passavam sobre sua cabeça rumo ao Rio, e Clezio se imaginava lá dentro, e imaginava que lá dentro também iam pilotos famosos, misturando seu amor pelos ares com o amor pelas corridas.

Sei lá por que resolveu me escrever, mas agradeço. Graças a ele descobri o Jet Site de Gianfranco Beting, a quem não tenho o prazer de conhecer.

Na seção “Nostalgia” há artigos maravilhosos, como a série sobre o destino de cada Electra II que serviu à Varig por anos e anos na Ponte Aérea.

Reproduzo apenas um, para dar o gostinho. Visitem o site. Vale muito a pena. E como se não bastasse, Beting escreve que é o fino.

O Rei da Ponte

Em 1975, o DAC decidiu que o pool de empresas que operava a Ponte Aérea deveria utilizar apenas quadrimotores, efetivamente alijando da rota os Dart Herald, FH-227 Hirondelle e YS-11 Samurai. Assim ficaram apenas os Viscount da Vasp (por pouco tempo) e Electras da Varig. Foi aqui que eles mais brilharam, reinando absolutos nas duas décadas seguintes, fazendo até 88 vôos diários. A frota cresceu para enfrentar a demanda: em 1978 vieram mais dois (VLX e VLY) e em 1986 os dois últimos exemplares (VNJ e VNK).

Começaram a falar em aposentá-los, mas Hélio Smidt, presidente da Varig e apaixonado pelo avião, nem quis saber. Sua paixão pelo tipo levou a uma bela homenagem, quando de seu falecimento: Smidt morreu em Nova York, no ano de 1990. Seu corpo foi trazido ao Brasil num DC-10-30 da empresa, pilotado pelo Cmte. Schubert.

Então, como derradeira homenagem ao seu líder, a Varig teve a delicadeza de levá-lo em sua última viagem em seu avião predileto: o Electra PP-VLC levou seu corpo no curto vôo entre Guarulhos e Congonhas. Em seguida, durante seu enterro, uma formação de Electras sobrevoou o cemitério, tornando sua despedida ainda mais emocionante.

O Electra perdeu seu protetor. Com a morte de Smidt e com as crescentes pressões da Vasp para colocar os 737-300 na rota, em 1991 a inevitável decisão foi tomada: sai Electra, entra jato. Em 11 de novembro, os 737-300 de prefixos PP-SOL, PP-VOS e PP-VOT iniciaram a aposentadoria dos Electra no Brasil. O primeiro a sair de operação foi o PP-VJO. Em 26 de novembro, a Transbrasil colocou o PT-TEH na Ponte Aérea, no lugar de mais um Electra. No domingo 5 de janeiro de 1992, o PP-VJN transportou os últimos passageiros pagantes.

No dia seguinte, 6 de janeiro, a Varig convidou passageiros freqüentes e personalidades para vôos de despedida, utilizando-se do PP-VJO e PP-VJN. Os comandantes Sergio Lott e Pedro Goldstein pilotaram os vôos. As redes de TV marcaram a data, os jornais dedicaram páginas ao adeus. Ao final da manhã, o PP-VJN fez algumas passagens rasantes após o último vôo, arrancando aplausos e muitas lágrimas de todos os presentes. Finalmente, pousou e foi taxiando para os hangares da Varig em Congonhas.

Cortou os motores e, com as hélices parando, foi deixando partir uma época que não volta mais. Tempos em que o Brasil tinha o melhor futebol e a Bossa Nova, a melhor música do mundo. Tempo em que se podia viajar com conforto, sentar e ver a restinga da Marambaia, o Corcovado e o Pão de Açúcar a passarem na janela de um Electra. Tempo que não volta, como não voltam mais os Electras.

Após 6 de janeiro, os Electra foram colocados à venda. Menos um, o PP-VJM, que, preservado pela Varig, descansa no museu do Campo dos Afonsos. Seus irmãos tiveram menos sorte. Foram vendidos para a Blue Airlines, a New ACS e a Filair, todas do antigo Zaire, onde literalmente foram condenados à morte. Sem qualquer tipo de manutenção, foram voados até acabar ou cair. Um deles protagonizou uma tragédia impressionante: mais de 140 passageiros, muito acima do máximo permitido de 90 ocupantes, pereceram quando o ex-PP-VLA caiu após decolar de Kinshasa. Apenas dois sobrevivem: o ex-PP-VNK, voando no Canadá, e o PP-VJW, à venda e encostado em Lanseria, África do Sul. Dos 169 Electras construídos, apenas 23 ainda operam em vôos de combate a incêndios ou, mais comumente, no transporte de carga.

É, o Electra é meu tipo inesquecível. Mas talvez o momento mais mágico de sua longa e brilhante carreira seja aquele em 1991, durante um show de Tom Jobim no aterro do Flamengo. Nosso músico maior, sabidamente apaixonado por tudo que voava, iniciava os primeiros acordes de “Samba do Avião” (Minha alma canta, vejo o Rio de Janeiro, estou morrendo de saudade, Rio seu mar, praias sem fim, Rio você que foi feito pra mim…), quando um Electra, em aproximação para o Santos Dumont, passou baixinho, sobrevoando o show. Tom parou um instante, olhou para cima, e nessa hora, como por magia, o Comandante piscou as luzes de pouso, saudando o maestro e seu público. Foi o adeus de Jobim ao Electra, o adeus do Electra ao Jobim, e para mim, o início de uma saudade (dos dois) que não tem mais fim. (Gianfranco Beting)

No início da madrugada, o blogueiro Winer Schnitzel mandou um www.flightlevel350.com/aviation_video.php?id=6316′ target=_blank>vídeo de uma decolagem em 1987, na verdade feito em Super-8, em Santos Dumont. Demora um pouco para carregar, mas é legal.