Blog do Flavio Gomes
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el cordobés (17)

CÓRDOBA (cansado, mas feliz) – Equipe formada, com estréia marcada para os próximos dias, hora de voltar ao hotel. Estamos bem longe, a mais de 100 km de Córdoba. Rali tem disso. A cobertura e o acompanhamento não são convencionais. É preciso se programar para ver algumas coisas. Tudo, é impossível. Só quem vê tudo […]

CÓRDOBA (cansado, mas feliz) – Equipe formada, com estréia marcada para os próximos dias, hora de voltar ao hotel. Estamos bem longe, a mais de 100 km de Córdoba. Rali tem disso. A cobertura e o acompanhamento não são convencionais. É preciso se programar para ver algumas coisas. Tudo, é impossível. Só quem vê tudo é piloto e navegador.

Aliás, essa história dos deslocamentos por estradas abertas ao tráfego normal é o máximo. O Venício, da “Racing”, me contou que há casos de pilotos que param no meio do caminho em casas previamente “arrumadas” por suas equipes onde há mecânicos que consertam aquilo que eles não podem arrumar entre um estágio e outro. É bem possível. O sujeito se enfia numa garagem de beira de estrada, quem vai ver?

Por isso, o WRC mantém “espiões” espalhados pelos trajetos, à paisana, para tentar pegar os espertinhos no flagra. Sensacional.

Long way home. Sento no último banco do ônibus e desmaio num sono profundo. Acordo não sei quanto tempo depois com alguém me chamando para trocarmos de viatura. O freio do nosso ônibus quebrou. Quanto andamos?, pergunto. Uns dois quilômetros, me respondem.

Vamos para uma van, me sento no banco da frente entre o motorista e um colega argentino, e pegamos a estrada. Linda, como são as estradas.


Os argentinos guiam muito mal, e por isso nossa viagem leva três horas e meia. Ao longo do caminho, constato que pelo menos metade da frota que roda pelo país, talvez até mais do que isso, é composta de carros que não são mais fabricados. Milhares de modelos dos anos 60 e 70. Lindos. Dá vontade de comprar todos.

Há uma tradição aqui de se colocar uma garrafa d’água, ou um pequeno galão, no teto dos carros que estão à venda. Já perguntei a quatro argentinos de onde vem isso (no Uruguai é assim também) e ninguém soube me responder. Todo mundo sabe que é assim, mas ninguém sabe por quê. Desconfio ser informação perdida há alguns séculos. Jamais saberei por que colocam uma garrafa d’água na capota dos carros à venda.

O rali continua. A Cadena Tres não pára um segundo de narrar todos os movimentos. O locutor é um alucinado. O sono volta forte, mas não dá para dormir sem ter onde encostar. Num esforço de reportagem, e da bateria da minha máquina, gravo os últimos momentos do estágio de Santa Rosa-San Augustín.

Quando terminei de gravar, desliguei o rádio. Ninguém na van reclamou. Ainda tínhamos algumas horas pela frente. Ficar escutando aquele doido já era demais. Acabei caindo no sono, sem encostar nem no motorista, nem no vizinho argentino.

Fui acordar na entrada da cidade, com dezenas de pessoas postadas na beira da estrada. Fazendo o quê? Esperando os carros do WRC. Eles estavam voltando do estádio, onde fizeram mais uma “Superprime”. Cruzamos com Loeb, que está liderando, Solberg, o segundo, e Sorda. Eles voltando para o Parque de Serviço, depois de um longo dia de lama e barro a mil; nós, voltando para o hotel, depois de um longo dia indo atrás deles.

Todos, nós e eles, arrebentados. Mas felizes e já sentindo aquela nostalgia estranha, aquela saudade de alguma coisa que nem acabou ainda, mas já começa a fazer falta.

É que acaba hoje.