Blog do Flavio Gomes
Gomes

JANELA PARA O MUNDO

SÃO PAULO (sussa na montanha russa?) – Parece apenas um rádio, né? Mas não é qualquer um, é o meu primeiro rádio. Ganhei do meu pai, modernão, com AM e FM, lá por 1977. Ele trouxe dos EUA, usava uma bateria quadradinha, que era difícil de encontrar. Atrás estava escrito made in Taiwan. Na frente, […]

SÃO PAULO (sussa na montanha russa?) – Parece apenas um rádio, né? Mas não é qualquer um, é o meu primeiro rádio. Ganhei do meu pai, modernão, com AM e FM, lá por 1977. Ele trouxe dos EUA, usava uma bateria quadradinha, que era difícil de encontrar. Atrás estava escrito made in Taiwan. Na frente, RCA.

O meu primeiro rádio de verdade, só meu, de mais ninguém.

Quando ganhei, do alto de meus 12 anos, foi como uma carta de alforria. Ganhei a liberdade. A liberdade de ouvir o meu rádio quando e onde quisesse. Sem ter de pedir emprestado para ninguém. Era ele que eu enfiava debaixo do travesseiro para escutar a Pan e a Globo, ou a Equipe Líder, que acompanhava a Portuguesa em qualquer canto do Brasil.

Tinha um fone, de uma orelha só, e esse fone fazia com que o universo inteiro se encerrasse em mim mesmo, nada do que meu rádio me contava precisava ser dividido com ninguém, era tudo só meu, era ele que me dizia o que estava acontecendo por aí, uma janela para o mundo que um dia eu gostaria de conhecer, e eu era muito feliz assim.

No escuro e no silêncio de tantas noites e madrugadas, com o “egoísta” no ouvido (era assim que se chamava o fone de uma orelha só), sofri com meu time, tive muita raiva, vibrei com os gols, embalei meu sono com as músicas românticas que vinham do FM, e com elas eu sonhava com as namoradas que nunca tive, nem nunca teria.

Meu rádio, minha primeira noção de liberdade, estava guardado numa caixa de sapatos. Outro dia o encontrei e trouxe para o amigo Bruno Rota, da Eldorado, dar uma olhada. Ele levou embora, revisou, trouxe de volta funcionando.

Esta noite, vai para debaixo do travesseiro. Tenho o “egoísta” em algum canto, vou achar. Lembro de uma música em especial que tocava sempre à mesma hora, logo depois da meia-noite, e que sempre me deixava suspirando por não sei quem. “All by Myself”, pode ser? Existiu uma música com esse nome?

Bom, na minha memória, existiu. E, se existiu, um dia ela toca de novo no meu RCA.