Blog do Flavio Gomes
Stock Car

CACÁ E A CBA

SÃO PAULO (é bom, mesmo) – A esta altura, todos devem estar por dentro do escândalo revelado hoje pela “Folha de S.Paulo” sobre as conversas por WhatsApp entre comissários da CBA tendo Cacá Bueno como personagem central. Num resumo bem resumido, o auxiliar de comissário Paulo Ygor Dias e o ex-chefe de comissários Clóvis Matsumoto […]

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SÃO PAULO (é bom, mesmo) – A esta altura, todos devem estar por dentro do escândalo revelado hoje pela “Folha de S.Paulo” sobre as conversas por WhatsApp entre comissários da CBA tendo Cacá Bueno como personagem central.

Num resumo bem resumido, o auxiliar de comissário Paulo Ygor Dias e o ex-chefe de comissários Clóvis Matsumoto fazem chacota com o piloto, que na corrida de Ribeirão Preto, em abril do ano passado, chamou os dirigentes da entidade de “um bando de imbecis” por conta de uma confusão na bandeirada. Com razão.

E, sem razão, o STJD da CBA suspendeu o piloto por uma corrida, comprometendo sua luta pelo título.

Os envolvidos disseram que a troca de mensagens foi uma “molecagem” e a CBA se defendeu dizendo que nesse nível, de comissários esportivos, não há como alterar resultados de corridas, premeditar punições, ou coisa que o valha. Que os regulamentos são “quase uma ciência exata”, e que se as punições são pautadas por alguma subjetividade no âmbito esportivo, nas decisões técnicas “não há dúvidas” — palavras de Nestor Valduga, diretor de competições da entidade e presidente do CTDN (Conselho Técnico Desportivo Nacional). A Vicar, organizadora da Stock Car, diz que não tem ingerência nenhuma no cumprimento dos regulamentos, que ficam por conta da autoridade esportiva em questão, a CBA.

Os dois comissários da conversa pelo WhatsApp foram afastados para que possa ser conduzida uma investigação — que na opinião deste que vos bloga não vai dar em nada, porque jamais serão mudados os resultados de corridas passadas.

[bannergoogle] Cacá tem razão de reclamar, porém. No mínimo, as conversas mostram uma predisposição de autoridades esportivas contra ele. É difícil afirmar que essa predisposição tenha tirado títulos do piloto no passado por conta de punições contestadas na época — o poder dos comissários é limitado, embora sejam eles os responsáveis pelas “denúncias” de infrações à direção de prova. Esta, de posse da uma denúncia de irregularidade apontada pelos comissários, leva a cabo as investigações que determinam eventuais punições.

Mas Matsumoto diz em determinado momento que “Cacá foi 3 vezes vive pq eu não estava a fim de deixar ele ser campeão! Kkk”, rindo no final. E Ygor responde que “E tbm não faz muito que ele não foi campeão por uns pontinhos que tiramos dele…”. Bueno foi vice em 2003, 2004 e 2005. Houve pelo menos uma desclassificação polêmica nesse período, em 2004, em Curitiba. Ele não foi o único punido, porém. Em 2010, Cacá também foi vice depois de uma desclassificação em Campo Grande — igualmente outros pilotos foram punidos. No ano passado, houve a já mencionada suspensão por uma corrida e mais um vice.

Há um padrão? Talvez, porque outros pilotos também foram vítimas de punições quase sempre contestadas. Talvez seja só bravata. Talvez seja só molecagem. Mas, na boa, automobilismo profissional não é lugar para bravatas e/ou molecagens. E nisso, Cacá, de novo, está coberto de razão ao colocar sob suspeita todas as decisões que o prejudicaram nos últimos anos. Ele é o melhor piloto da categoria faz muito tempo. Vive brigando na frente. Quando não ganha, bate na trave — são cinco títulos e cinco vices nos últimos 13 anos, um currículo admirável. Num mundo melindroso como o do automobilismo, gente assim, que alia talento e profissionalismo a uma língua nervosa que não poupa ninguém, coleciona desafetos.

Rodrigo Mattar chama da CBA de “Casa da Mãe Joana”. Concordo. E se é verdade que essas denúncias não vão mudar resultados passados, não é menos verdade que a comunidade automobilística espera que, pelo menos, esse tratamento leviano e irresponsável das coisas do esporte  por parte de quem deveria cuidar dele com zelo e seriedade seja extinto imediatamente.

Agora, um pequeno parêntese.

Me surpreendi ao ver a chamada da reportagem que detonou o escândalo na Primeira Página da “Folha”, assinada pela jornalista Paula Cesarino Costa. Automobilismo deixou de ser assunto para o jornal faz tempo. E Paula não cobre o assunto. É uma excelente jornalista, com quem trabalhei durante muitos anos e que está na “Folha” há décadas. Já foi secretária de Redação e não atua como repórter faz tempo — chefia, com muita competência, a sucursal carioca do jornal e de vez em quando assina a coluna “Rio” na página 2, que tem como titulares Carlos Heitor Cony e Ruy Castro.

A reportagem é impecável. Ouve todos os lados e é precisa em datas e fatos — OK, tem um nome errado de piloto, mas Átila Abreu saberá perdoar. Material típico da “escola Folha” criada nos anos 80 da qual eu e ela, entre muitos outros, somos filhotes. Mas, conhecendo o jornal, é tema que só ganhou o destaque que ganhou por ter sido levantado por alguém com o peso que a Paula tem na Barão de Limeira. Há um lado bom e outro ruim, nisso. O bom é ver alguém do porte da Paula, com vasta história na “Folha”, mergulhar nos seus tempos de reportagem e tratar de automobilismo, que está longe de ser sua especialidade e mais ainda de ser prioridade do jornal. O ruim é que dificilmente o tema ganharia a visibilidade que ganhou se as denúncias tivessem chegado a alguém menos estrelado na Redação.

Seja lá quem passou as informações para o jornal, portanto, passou para a pessoa certa. Assim surgem os furos. Assim é o jornalismo.