Blog do Flavio Gomes
Brasil

SEM NOÇÃO

SÃO PAULO (só piora) – Desde que o ex-prefeito Fernando Haddad reduziu os limites de velocidade nas Marginais — para quem é de fora de São Paulo, são as avenidas que margeiam os rios Tietê e Pinheiros –, os acidentes fatais nessas vias caíram 52%. Foi uma vitória da civilidade numa cidade onde boa parte […]

SÃO PAULO (só piora) – Desde que o ex-prefeito Fernando Haddad reduziu os limites de velocidade nas Marginais — para quem é de fora de São Paulo, são as avenidas que margeiam os rios Tietê e Pinheiros –, os acidentes fatais nessas vias caíram 52%. Foi uma vitória da civilidade numa cidade onde boa parte dos motoristas é selvagem e acéfala.

[bannergoogle]As Marginais, historicamente, sempre foram usadas para rachas, pegas e atrocidades em geral. Com a fiscalização por radares e a redução das velocidades máximas permitidas, se tornaram um pouco menos violentas. Essa redução se estendeu por toda a cidade e os números apontam melhora no trânsito e diminuição dos acidentes e atropelamentos. É o que se faz no mundo todo.

Mas São Paulo elegeu um prefeito que anda de SUV e tem amigos que gostam de carros potentes. Uma de suas bandeiras na campanha eleitoral foi aumentar os limites de velocidade das Marginais, o que agrada em cheio à classe média babaca que infesta a metrópole. Fará isso a partir do dia 25, contrariando todos os estudos que apontam os benefícios das medidas tomadas pelo prefeito anterior.

E sabem quem será o garoto-propaganda da campanha que vai informar os paulistanos que eles poderão correr mais nas Marginais?

Emerson Fittipaldi.

Em 2015, Emerson esteve junto à presidenta Dilma Rousseff e ao presidente da FIA, Jean Todt, abraçando a campanha mundial da entidade para redução da velocidade nas vias das grandes cidades – “a 5% reduction of the average speed would decrease the number of fatal crashes by 30%” é uma das bandeiras do projeto.

O parágrafo acima faz parte de um questionário que o Grande Prêmio enviou à assessoria de Fittipaldi sobre o tema. Até agora, 19h30 de sexta-feira, as perguntas não foram respondidas. Falei com a assessora de imprensa do prefeito e ela afirmou que o ex-piloto não cobrou cachê. Pelo menos isso.

Algumas rádios de São Paulo, que apoiaram o golpe que tirou Dilma da presidência, serão inundadas com a voz de Emerson nos próximos dias. Isso ninguém faz de graça. Aliás estamos pagando a conta do golpe não só com as propagandas da Prefeitura, como também com “spots” comerciais do Ministério do Turismo e do Ministério da Educação — que vêm sendo veiculados há semanas nas emissoras da cidade a preço de tabela. Um deles sugere que as pessoas viajem para o Nordeste, porque lá faz sol. O outro é uma cascata sobre o projeto que exclui disciplinas do Ensino Médio.

[bannergoogle]O governo federal, nos mandatos de Lula e Dilma, não anunciava nessas rádios. Isso, em parte, explica as intermináveis horas de ofensas e mentiras que elas levaram ao ar nos últimos dois anos, até que o impeachment tirasse do poder uma presidenta eleita com mais de 54 milhões de votos para nele alojar a figura soturna das mesóclises. Um dia depois de Dilma deixar o Alvorada, o governo golpista passou a anunciar nessas emissoras. Os boletos chegaram rapidinho, como se vê.

E aí vem Fittipaldi colocar sua voz nessa campanha absurda que chancela a selvageria — uma liminar proibiu o aumento das velocidades, mas é evidente que será derrubada, mais cedo ou mais tarde. Os acidentes e as mortes vão aumentar — mas é certeza que os números que serão divulgados pela Prefeitura nos próximos meses dirão o contrário, e não serão questionados pela imprensa, emissoras de rádio incluídas. Os donos de SUVs de Moema, Pinheiros, Vila Olímpia, Perdizes e Morumbi irão aplaudir o prefeito de suéter, gratos por poderem acelerar um pouco mais seus carrões pagos em 48 prestações.

Me pergunto como é que alguém como Fittipaldi se presta a esse papel, ainda que não seja uma surpresa ele ter aceitado o convite. Quando trouxe o WEC para correr em Interlagos, Emerson chegou a participar de evento com o ex-prefeito que pregava um pacto nacional pela redução de acidentes. Aí está ele na mesa, o segundo à direita depois de Haddad.

O que mudou de lá para cá? O que aconteceu com o Emerson que apoiava, como mostra a foto acima, “um pacto pela vida”? Justo ele, um cara que, como piloto, sempre lutou por melhores condições de segurança (chegou a se recusar a correr uma vez na Espanha), faz campanha por um trânsito mais civilizado pela FIA, tem noção da barbaridade que será perpetrada em São Paulo.

Ou será que não tem?

Olha, a julgar pelas últimas notícias envolvendo seu nome, acho que não tem, não. Emerson parece não ter mais noção de nada. Nem do ridículo.