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Mil Milhas 2007: fim ou começo?

SÃO PAULO (há alternativas) – A FIA confirmou que o WTCC começa em março com uma etapa em Curitiba e também a inclusão das Mil Milhas, desde o ano passado sob controle do empresário e piloto Antonio Hermann, no calendário da Le Mans Series. Sobre WTCC: ótimo. A pista foi aprovada, depois de muitas críticas […]

SÃO PAULO (há alternativas) – A FIA confirmou que o WTCC começa em março com uma etapa em Curitiba e também a inclusão das Mil Milhas, desde o ano passado sob controle do empresário e piloto Antonio Hermann, no calendário da Le Mans Series.

Sobre WTCC: ótimo. A pista foi aprovada, depois de muitas críticas no ano passado. É bom para o país, e especialmente bom para Curitiba, receber uma prova desse nível aqui. Afinal, é um Mundial.

Sobre as Mil Milhas: a corrida vai fechar, em Interlagos, a temporada da categoria que, hoje, pode ser chamada de Mundial de Esporte-protótipos. Aquela mesma que nas décadas de 60, 70, 80 e 90 consagrou maravilhas como os Porsche 917, os Ford GT40, muitos modelos da Ferrari, da Matra, da Jaguar, da Mercedes, da Peugeot e, atualmente, tem na Audi seu grande nome — embora a marca alemã participe da American Le Mans Series, por interesses mercadológicos, com seu impressionante R10 turbodiesel.

Na Le Mans Series, correm protótipos e GTs, tudo no mesmo grid, com divisões por categoria. A maioria deles também participa das 24 Horas de Le Mans, prova que se sustenta por si e não faz parte de campeonato algum.

Largam, em média, 50 carros por corrida. O calendário tem apenas seis provas: 1000 Km de Monza (13 a 15 de abril), 1000 Km de Valência (4 a 6 de maio), 1000 Km de Nürburgring (29 de junho a 1º de julho), 1000 Km de Spa (17 a 19 de agosto), 1000 Km de Silverstone (14 a16 de setembro) e Mil Milhas Brasil (9 a 11 de novembro).

A inclusão das Mil Milhas na LMS enterra de vez as Mil Milhas que nasceram em 1956 em Interlagos. No ano passado, a prova ainda era aberta a carros brasileiros, apesar do altíssimo custo.

Digo que enterra porque não há, no Brasil, protótipos em condições de correr na LMS. Nem equipes aptas a disputar uma prova dessas. Os carros são homologados pela FIA, submetidos a crash-tests rigorosos, etc. e tal. Não temos veículos brasileiros que atendam a todas as exigências.

Isso é bom ou é ruim?

Do ponto de vista do público, é maravilhoso. Trazer os carros mais belos do mundo para correr em Interlagos é uma vitória de Hermann, que pretendia, inicialmente, incluir as Mil Milhas no Mundial da FIA GT, o que acabou não acontecendo. No laço, conseguiu a LMS, e se você quer saber, é bem melhor. Não bastassem os carros, a turma que os pilota é da pesada. Nomes como Hideki Noda, Nicolas Minassian, Jean-Marc Gounon, Shinji Nakano, Jan Lammers, Alex Yoong, Emmanuel Collard, Jean-Christophe Boullion e Pedro Lamy, entre eles. E se a Peugeot gostar de Villeneuve e a recíproca for verdadeira, Jacques corre também.

Do ponto de vista do automobilismo brasileiro, é ruim, de imediato. Porque é inevitável constatar que uma prova que em sua primeira edição quase foi vencida por um Fusca mudou completamente seu caráter. Haverá pilotos brasileiros, sim: Tony, Helinho, Erdos e muitos outros, dependendo de negociações. Mas o tempo das carreteras, dos Voyage, dos Gol, dos Opala, dos Aldee, dos Tubarões, dos Omega, pelo menos para esse novo formato das Mil Milhas, acabou.

(Na verdade, já acabou há algum tempo. As últimas edições das Mil Milhas foram patéticas, com a “turma da garagem” levando couro dos milionários que tinham grana para alinhar Audi e Mercedes de DTM, Porsche GT3, Ferrari, Aston Martin, Lister e o escambau a quatro.)

É uma pena? É. Mas pode ser o início do fim de um isolamento tecnológico que o Brasil experimenta há anos, no que diz respeito às corridas. Nada impede que brasileiros construam protótipos atualizados e competitivos, que cumpram as exigências da FIA, e, por que não?, levem seus carros para correr todas as etapas da Le Mans Series. Há tecnologia para isso aqui.

Nos anos 70, lembrem-se, a equipe Hollywood foi correr em Zeltweg. Naquela época, havia correndo por aqui mais de uma Lola, Porsche ou Ferrari, trazidos e modificados por times e pilotos brasileiros. Deles derivaram muitos protótipos nacionais, que não fariam feio lá fora. Não há mais. Se houvesse, poderiam correr nas novas Mil Milhas da era LMS.

Aquela velha prova com largada à meia-noite, para competidores brasileiros, virou história, portanto. Aqui, parênteses. Sempre fui a favor de largar à meia-noite, como manda a tradição. O problema é que também vivemos outros tempos, e passei a compreender o início diurno da corrida. Primeiro, por segurança esportiva: quanto mais se correr com luz natural, melhor. Segundo, por segurança patrimonial. Em Interlagos, de madrugada, os riscos de assaltos e roubos e invasões são enormes. Outro dia roubaram a câmera de um cinegrafista que estava lá pelos lados da Junção. Fechados os parênteses.

Voltando às velhas Mil Milhas… Virou história, mas há alternativas para corridas de endurance, como os 500 Km de Interlagos, as 12 Horas de Tarumã, quem sabe ressuscitar as 24 Horas de Interlagos, ou mesmo esse GP São Paulo, que teve uma reedição mambembe neste ano… Enfim, basta querer e se mexer. Existe até um Brasileiro de Endurance, para quem não sabe.

A definitiva internacionalização das Mil Milhas é um caminho sem volta, goste-se ou não disso. Os órfãos daquela corrida, e me refiro aos participantes, terão de encontrar o seu, agora. Que pode ser, até, e isso seria o ideal, repensar o que se faz no automobilismo brasileiro em termos de protótipos e carros GT. Para que, num futuro próximo, eles possam ocupar seus lugares no grid das Mil Milhas com carros mais modernos, seguros e competitivos. Tirando o Brasil da inércia em que se encontra.

Acho difícil isso acontecer. Mas é a única via a seguir.

Quanto às novas Mil Milhas da Le Mans Series, o desafio dos organizadores é um só: encher o autódromo. Porque a qualidade da prova está mais do que garantida com os pesos-pesados que virão.


O carro da Peugeot que estará em Interlagos