Blog do Flavio Gomes
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Gira mondo, gira (quinta)

SÃO PAULO (não preciso dizer muito) – Teremos duas corridas ao norte da Venezuela nos finais de semana vindouros, e talvez seja um bom momento para falar dela, a Venezuela. Há uma gritaria horrorizada contra a não-renovação da concessão à RCTV, emissora que, em 2002, pregava, no ar, o golpe e, sem grandes subterfúgios, o […]

SÃO PAULO (não preciso dizer muito) – Teremos duas corridas ao norte da Venezuela nos finais de semana vindouros, e talvez seja um bom momento para falar dela, a Venezuela.

Há uma gritaria horrorizada contra a não-renovação da concessão à RCTV, emissora que, em 2002, pregava, no ar, o golpe e, sem grandes subterfúgios, o assassinato de Hugo Chávez.

O golpe deu errado, como se sabe, Chávez voltou ao poder e nem por isso prendeu alguém da RCTV, ou mandou fechar suas portas. Apenas, cinco anos depois, fez o que lhe permite a Constituição: não renovou sua concessão. Sem violência. Sem truculência. Que os donos da RCTV procurem outros negócios. Inclusive no setor de TV a cabo, paga.

É vingança? Vendetta pessoal? Não creio. A RCTV evidentemente ultrapassou os limites, desrespeitou a lei e as normas da civilidade. Não cumpriu seu papel, e toda TV tem, sim, um papel social. De mais a mais, elas, as TVs, só existem porque os governos lhes concedem o privilégio de existir. Donde o termo “concessão”. Por ter ultrapassado os limites, a RCTV não teve sua concessão renovada. Por um governo, não por um presidente. Foi o governo da Venezuela que o fez.

Como muito bem fariam vários governos brasileiros nos últimos anos se não renovassem determinadas concessões, também. Das emissoras, por exemplo, que só existem na forma de caça-níqueis com seus programas inescrupulosos, sua pregação religiosa chinfrim, sua jogatina eletrônica que nada, absolutamente nada, acrescenta ao escopo cultural e intelectual da população. Servem, apenas, para picaretas ganharem dinheiro fácil. E como ganham… Mas no Brasil há enorme leniência quanto a isso. Nada se cobra dessa malta que há décadas enriquece vendendo tempo e espaço que, em última análise, pertencem ao Estado.

Perguntam-me, com frequência, o que acho de Chávez e do que está acontecendo na Venezuela. Respondo apenas que aquela é uma democracia, ele foi eleito e reeleito, e se controla o Congresso, é porque a oposição se recusou a disputar as eleições. Problema dela. Não há partidos proibidos na Venezuela. Todos poderiam participar do pleito. Recusaram-se a jogar. Perderam.

Se Chávez agride o apuradíssimo senso estético de nossa classe média, que é igualzinha à classe média venezuelana, porque tem cara de índio e não usa ternos italianos bem cortados, paciência. Se a “Veja” dispara impropérios contra um chefe de Estado vizinho, se alguns jornalistas o ofendem de maneira grotesca (outro dia escutei um comentarista esportivo chamá-lo de “cretino” em uma emissora de rádio de SP), se apresentadores de telejornais fazem caras e bocas quando noticiam o que se passa na nossa fronteira norte, paciência, também.

Chávez comete erros, cometeu-os no passado (tentou dar um golpe, também), mas por eles respondeu à Justiça venezuelana. Não virou presidente por um sopro divino, mas foi eleito pelo sistema que nós, aqui, tanto prezamos. Não é um ditador.

A ele devemos respeito. Todos.

Para quem se interessa realmente pelo assunto, recomendo a leitura do artigo de Bob Fernandes no “Terra Magazine”. E os vídeos que ele indica, que aqui já foram postados meses atrás.