Num fim de semana, os governos abriram seus cofres e salvaram os ricos, os especuladores, os financistas, os bancos, as corretoras, as grandes empresas, os compradores de terras baratas, aqueles que emprestam a juros altíssimos e vendem suas hipotecas a outros agentes financeiros, fazendo dos papéis verdadeiras cartelas de bingo, cagando e andando para a pessoa comum que, por alguma razão, não pôde pagar seu carnê neste mês.
Estão todos salvos, estamos todos salvos, as Bolsas abriram no Oriente em alta, o movimento se repetiu na Europa e na América, aqui em SP o Ibovespa, que nem sei que merda é, bateu, ou passou, nos 10% (só para atualizar, 14,66%). Quando cai 10%, pára tudo, “circuit break”, ou “circuit breaker”, não sei direito como fala isso. Não, perder não pode, precisamos só ganhar, ganhar sempre. Por que não parar o pregão também quando bate nos 10% positivos? Afinal, não há mágica. O volume de dinheiro no mundo, suponho, é sempre o mesmo. E quando alguém ganha 10%, é porque alguém, em geral os pobres-coitados, está perdendo 10%.
Que nada, deixa subir, comemoremos os recordes, os pontos, os índices. Sorrisos em Wall Street, sorrisos nos escritórios espelhados de Frankfurt, tudo voltou ao normal. O dólar já começou a cair, puxa, que novidade. Quanta gente encheu o rabo com a alta do dólar na semana passada? Estava a 1,7 aqui, bateu em 2,5, ou mais do que isso. Caiu mais de 5% hoje, puxa — 7,74%, para ser exato.
Claro, tem gente dando risada dessa crise de araque, desse pavor que tomou conta de todo mundo, das perdas “dos pobres velhinhos que viram suas economias de uma vida inteira escorrendo pelo ralo”. Esses pobres velhinhos não vão recuperar o que perderam, porque os governos não abriram seus cofres para eles, mas sim para os grandes bancos e seus executivos de merda que passaram anos fazendo cagadas e gastando mais do que podiam, usando o dinheiro dos outros para ganhar para eles mesmos, pulhas, selvagens com seus ternos italianos, seus Jaguares, suas villas, suas putas, suas trufas, seus vinhos. Bando de canalhas. Devem estar todos rindo, agora.
Afinal, dinheiro é gente, gente não. Essa é a lição dessa crise de uma semana, dessa farsa globalizada e cínica: estamos todos fodidos nas mãos do mercado.