Blog do Flavio Gomes
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LET’S FLY

SÃO PAULO (e a vida segue) – As dez badaladas soavam em algum sino de alguma igreja suburbana ali por perto quando Sir Elton John entrou no palco, cumprimentou o público, sentou-se ao piano e começou a tocar a primeira das 24 músicas de seu show de quase duas horas e meia ontem à noite. […]

SÃO PAULO (e a vida segue) – As dez badaladas soavam em algum sino de alguma igreja suburbana ali por perto quando Sir Elton John entrou no palco, cumprimentou o público, sentou-se ao piano e começou a tocar a primeira das 24 músicas de seu show de quase duas horas e meia ontem à noite.

Fazia tempo que eu não ia a um show de gente grande. Rolling Stones e Paul McCartney no Pacaembu, talvez? Hollywood Rock no Morumbi? É que depois do primeiro Rock in Rio, em 1985, achei que nunca mais veria nada igual, um quase-Woodstock, e acho que tinha razão… Aquilo foi um festival inesquecível, primeiro e único. Depois começou a era dos megashows: Madonna, U2, camarotes VIP e pulseirinhas.

Vivemos nela ainda, creio. Madonna, por exemplo, veio ao Brasil e trouxe um ônibus espacial em equipamentos. Foi manchete dos jornais e capa de revistas durante dias e até andou comendo um rapaz chamado Jesus. E nessa era de megatudo, foi um alento ver aquele senhor de 61 anos que ainda vive de tocar e cantar tocando e cantando num descampado mequetrefe na periferia de uma cidade feia, ao lado de um rio fétido.

Elton John é um dos maiores nomes do pop-rock de todos os tempos e, numa primeira olhada, assim que entrei na arena, simplezinha, singela, o que achei é que ele não precisava tocar ali. Palco modesto, baixo e acanhado, apenas dois telões mais ou menos do tamanho da TV da minha sala, uma única torre de som no meio do público, som baixo, ruim, canhões de luz que fariam os caras dos bailes funk do Rio darem risada.

Mas foi um show delicioso. Justamente porque não era meganada, era apenas um senhor de 61 anos tocando e cantando numa arena mequetrefe da periferia de uma cidade feia ao lado de um rio fétido para uma plateia encantada com aquilo que ele vem tocando e cantando há 30 anos.

Por isso, mesmo sem ter visto a figura rechonchuda e simpática exceto pelos telões do tamanho da TV de casa, mesmo sem ouvir direito sua voz e seu piano, senti uma enorme ternura naquele senhor de 61 anos que embalou os tocafitas dos meus carrinhos da juventude. Eu sabia as letras, as pessoas em volta, também. Algumas dançavam, alguns casais se beijavam, havia crianças e senhores & senhoras, o cheiro de maconha era suave e fugaz, dava até para conversar, porque o som era baixo e fraco, qualquer showzinho do Bruno & Marrone tem produção mais apurada, fumaça, raio laser e caixas acústicas astronômicas de última geração.

Mas aquele senhor de 61 anos não precisava de muita pirotecnica para cantar e tocar numa arena mequetrefe da periferia de uma cidade feia ao lado de um rio fétido, bastavam sua voz, seu piano e sua música.

Sim, eu sei, ele é rico, não precisa mais cantar e tocar para viver, muito menos naquele cimentado onde toda terça-feira estacionavam carros velhos à espera de comprador, deve ter levado uma puta grana, o ingresso mais barato custava 250 paus, você está fantasiando, FG, como sempre.

Ora, deixem-me fantasiar.