Blog do Flavio Gomes
Brasil

CARNAVAL

SÃO PAULO (alalaô) – Eu não ia escrever nada sobre o Carnaval, porque no fundo não tenho muito o que dizer. Não desfilo na avenida, nunca tive a chance de sair num bloco de rua no Rio, nunca vi de perto os cabeçudos de Olinda, nunca enchi a cara nas cidades históricas de Minas, sequer […]

Pierrot10kbSÃO PAULO (alalaô) – Eu não ia escrever nada sobre o Carnaval, porque no fundo não tenho muito o que dizer. Não desfilo na avenida, nunca tive a chance de sair num bloco de rua no Rio, nunca vi de perto os cabeçudos de Olinda, nunca enchi a cara nas cidades históricas de Minas, sequer tenho uma escola preferida. Não sou Portela, nem Mangueira, nem Beija-Flor, nem Nenê, Rosas, Camisa. Sei dois ou três sambas-enredo de cor, e nem sei de que anos são, se ganharam ou perderam.

Todos os anos tenho a impressão não de que eu não ligo para o Carnaval, mas sim de que ele não dá bola para mim. Talvez eu não seja um folião digno dele. Talvez eu tenha medo do Carnaval.

Apesar dessa rejeição que me parece unilateral, gosto de ver as pessoas felizes na TV. Gosto de ver os repórteres que dizem todos os anos as mesmas coisas, as imagens aéreas das ruas tomadas por gente alegre e pulando, o Brasil que, se eu tivesse a chance de vê-lo do alto, de um ônibus espacial, pareceria estar pulsando de um jeito que só aqui, mesmo.

Gosto de saber que as pessoas estão felizes.

Já tive meus carnavais, não sou totalmente ruim da cabeça. Já fui a Salvador e saí de pipoca atrás do trio de Armandinho, Dodô & Osmar, mas não fiquei bêbado o bastante para achar aquilo do caralho, achei apenas legal, assim como a Banda Eva, o Chiclete com Banana, vi todos eles passarem pelo Campo Grande, mas foi só uma vez, não posso dizer, como todos dizem, que o Carnaval da Bahia é isso, é aquilo. Apenas é.

Meus melhores carnavais foram em clubes no interior, eu já era mais que adolescente, já tinha até carro, tomava bastante cerveja e me arriscava num lança-perfume que entrava escondido com a irmã mais velha do amigo. Nunca passou disso, eu gostava mesmo era de pular até cansar. Aos 18, 19 anos, achava que tinha direito de pular até cansar. Já trabalhava duro o ano todo, não tinha muitas folgas, estudava à noite, achava, sim, que tinha direito de encontrar a cabrocha que eu tanto amei. Nunca encontrei. Hoje acho que não tenho direito a nada, muito menos a uma cabrocha.

Depois o Carnaval foi fugindo de mim, e eu dele. Sem ressentimentos. Hoje li, incrível, um bom texto sobre Carnaval assinado por José Sarney. Não riam. Saiu na “Folha”. Nada nostálgico, ao contrário: os carnavais d’antanho eram um saco, bom é hoje, peitos e bundas, velho tarado. Mas ele tem razão. Carnaval não piora, nem melhora. Carnaval apenas é. Cada um faz o seu.

Meus meninos queriam ver os desfiles no Sambódromo. Vou tentar levá-los no domingo à noite, segundo grupo, eles estão acostumados com seu pai de segunda divisão, acho que vão gostar do mesmo jeito. Terei de contar histórias sobre as escolas, ainda bem que algumas grandes caíram, pelo menos terei o que dizer da Nenê ou da Camisa. Acho. Na hora eu invento. Um deles, o maiorzinho, começou a fazer aula de percussão. Está animado com tambores, tamborins, surdos, caixas. Vai gostar de ver uma bateria. Será meu Carnaval.

Mas eu dizia que não ia escrever nada sobre o Carnaval, e não ia mesmo, e já escrevi demais, até receber uma dica de música de um blogueiro, Maurício Camargo. Deste clipe aqui, não riam de novo. Air Supply, “Lost in Love”. Não tem nada a ver com Carnaval, mas tem a ver comigo. Ou com o eu que eu era quando tinha 10 ou 11 ou 12 anos. No Carnaval, a gente ia para a praia. Tirando os confetes e as fugas dos motoristas irados que levavam água no carro das minhas bisnagas de ótima pontaria e alta precisão, o Carnaval era ir para a praia e fazer bailinho de noite nas casas daqueles que tinham casas, e não apartamentos.

Eu escutei essa música e lembrei dos bailinhos que se misturavam aos carnavais, e de como me arrumava para dançar com as meninas, calça e camisa e sapato, na praia e no Carnaval, vejam só. Lembro que tinha sempre no bolso uma balinha que nunca vou me esquecer dela, chamava Cert’s, era bom para dar uns beijos, nos bailinhos e no cinema que ficava no centrinho, que hoje virou boliche.

Bailinhos para beijar as meninas, bailes nos clubes no interior ao som de marchinhas e sambas-enredo, um trio elétrico em Salvador, não, não posso dizer que tenha um padrão carnavalesco, que ensaio o samba o ano inteiro, não, apenas olho de longe, como faço com quase tudo, procurando não incomodar ninguém, sem inveja alguma dessa felicidade coletiva, pelo contrário, olho tudo admirado e quase extático, esperando que, um dia, o Carnaval me aceite de volta.