Blog do Flavio Gomes
Automobilismo brasileiro

DIREITO DE RESPOSTA

SÃO PAULO (meus sais…) – Não sei se vocês se lembram, mas dia desses o vice-presidente da CBA, Antonio dos Santos Neto, foi preso. Não sei se já soltaram. Na ocasião falei aqui sobre o tipo de gente que comanda o automobilismo brasileiro. O cara, antes de ser vice da CBA, era presidente da Federação […]

SÃO PAULO (meus sais…) – Não sei se vocês se lembram, mas dia desses o vice-presidente da CBA, Antonio dos Santos Neto, foi preso. Não sei se já soltaram. Na ocasião falei aqui sobre o tipo de gente que comanda o automobilismo brasileiro. O cara, antes de ser vice da CBA, era presidente da Federação Paraense de Automobilismo.

No “Limite” da semana passada, na ESPN Brasil, eu, o Mauro Cézar e o João Carlos fizemos alguns comentários sobre o ocorrido. E eu devo ter dito algo sobre o próspero automobilismo paraense, que cedeu ao país este excelente quadro como vice-presidente da CBA, o preso. Algo que, pelo jeito, desagradou o atual presidente da Federação Paraense, a Fepauto (parece nome de loja de autopeças), que por sua vez mandou um e-mail para a TV e também para meu endereço pessoal.

E é essa mensagem que segue, na íntegra, sem revisão alguma, já que o pedido de resposta foi requisitado lá (e li trechos, no programa que vai ao ar à noite) e aqui, uma vez que ela também foi enviada ao meu e-mail pessoal:

Belém/Pará, 08 de Setembro de 2010.

À
ESPN Brasil
Programa “LIMITE”
ATT.: FLÁVIO GOMES
NESTA.

Prezado Senhor Flávio Gomes,

Em atenção ao programa exibido em 07/09/2010, venho através desta requerer o democrático Direito de Resposta, nos seguintes termos:

“Na edição passada de seu programa, LIMITE do dia 07/09/2010, fomos surpreendidos com um comentário que não condiz com a verdade, qual seja, de que no Pará não existe automobilismo capaz de conduzir alguém a Vice-Presidente da CBA. Certamente V. Sª. ainda pensa que o Brasil só gira em torno das regiões sul e sudeste, onde por todas as condições econômico-sociais tudo é mais fácil, ou seja, fazer automobilismo em São Paulo, ao lado das grandes montadoras, com todos os meios de comunicação voltados para o evento e patrocinando-os, com toda estrutura pronta de autódromos e kartódromos internacionais, equipes formadas de comissários e diretores de provas profissionais, enfim tudo pronto, bastando abrir a bilheteria.

Para sua melhor informação, o Estado do Pará, através da Federação Paraense de Automobilismo-FEPAUTO, dispõe de 130 pilotos federados junto à CBA, alguns dos quais participam de campeonatos nacionais, tais como: Mitsubishi Cup, com os Irmãos Bortolanza; Gaúcho de Marcas; Paranaense de Arrancada, Nordeste de Kart. Aqui mesmo no Estado do Pará, desenvolvemos campeonato de Arrancada, Rallye de Regularidade, Autocross, Kartcross e Off-Road in door, todos com dificuldades em patrocínio e divulgação, graças ao pensamento como o manifestado por V.Sa.

Por fim, atrelar um problema empresarial ao cargo ocupado na Vice-Presidência da CBA, demonstra e corrobora o pensamento discriminatório e preconceituoso para com o Estado do Pará e a Região Norte que, por não possuir as condições elencadas acima, merece não só ter um representante na Vice-Presidência como, no futuro, na Presidência da CBA.

Esperamos ter contribuído para deixá-lo um pouco mais informado sobre o nosso grande Brasil, do qual o Estado do Pará também faz parte. E merece respeito.

Atenciosamente,

Fernando Maia- Presidente da FEPAUTO.”

Legal, está dado o amplo direito de resposta ao presidente da Fepauto, e espero que ele não me processe só porque eu acho que o automobilismo em seu Estado não existe. Adoro receber cartas formais. Ainda mais quando elas vêm com esse “NESTA” depois do nome. Um dos maiores mistérios da humanidade. O que quer dizer esse “NESTA”?

Aproveito para agradecer profundamente ao emérito mandatário por ter confirmado o que eu disse na TV, que não há mesmo automobilismo no Pará. Os exemplos citados, lamento, não configuram um padrão de competições no Estado. Não há um autódromo no Pará. Arrancada não é corrida. Autocross, kartcross e off-road indoor, seja lá o que for isso (como pode ser “off-road” e “indoor” ao mesmo tempo?), são, no máximo, hobbies para alguns. Aliás, dá para perceber no site oficial da entidade, cuja última atualização é de junho, que as atividades automobilísticas no Pará não são exatamente frenéticas.

E os 130 federados à CBA, presidente, esses o senhor poderia ter omitido. Citar pilotos que correm na Mitsubishi Cup, no Paranaense de Arrancada e no Nordeste de Kart seria o mesmo que ouvir do Professor Carpinelli, secular presidente da FASP, que sua federação se orgulha de ter um certo Flavio Gomes que corre na Classic Cup. Tenha dó.

Desculpe, presidente, mas neste blog aqui, nem meus leitores e nem eu somos bobos. E não coloque a culpa pela inexistência, em seu Estado, do esporte cuja federação o senhor preside no “pensamento como o manifestado por V.Sa.” — que devo ser eu, segundo sua carta. Não tenho nada a ver com isso. Mas se vale como consolo, não é só o Pará que não tem automobilismo. Para sermos bem realistas, existe automobilismo de verdade hoje, no Brasil, em quatro Estados: Rio Grande do Sul, Santa Catarina (na terra), Paraná e São Paulo. Os espasmos de Fortaleza e Caruaru, ou mesmo os raros eventos de Campo Grande, Jacarepaguá, Brasília e Goiânia, não são representativos.

Portanto, não venha com essa conversa, presidente, tentando provar que no Pará existe algo parecido com automobilismo de verdade. Uma federação de automobilismo no Pará faz tanto sentido quanto uma federação de surfe no Tocantins, ou uma de bobsleigh no Amapá. Se vocês fossem competentes aí no Pará, teriam uma pista de corridas. Não têm. A imensa maioria das federações de automobilismo no Brasil, qualquer tonto como eu sabe disso, serve a um único propósito: eleger o presidente da CBA. E gerar alguma receita vendendo carteirinhas de piloto, fonte de renda bem lucrativa, de custo baixíssimo e não-poluente.

E é gozado como tem gente que se esconde nesse papo-furado de que somos preconceituosos, que discriminamos o Norte e o Nordeste, essa baboseira toda. A carta do presidente da Fepauto é quase uma peça cômica, nesse sentido. Vejam este trecho, que repito no original:

Certamente V. Sª. ainda pensa que o Brasil só gira em torno das regiões sul e sudeste, onde por todas as condições econômico-sociais tudo é mais fácil, ou seja, fazer automobilismo em São Paulo, ao lado das grandes montadoras, com todos os meios de comunicação voltados para o evento e patrocinando-os, com toda estrutura pronta de autódromos e kartódromos internacionais, equipes formadas de comissários e diretores de provas profissionais, enfim tudo pronto, bastando abrir a bilheteria.

Alguém que escreve uma sandice dessas não conhece automobilismo. É um desinformado. As grandes montadoras estão aqui, sim, como estão também no Rio, em Minas e na Bahia. E no Centro-Oeste. E sei lá mais onde. Tem bastante fábrica de automóvel por aí. E nenhuma delas, em região alguma, participa do automobilismo brasileiro. Fazem, quando muito, eventos privados para compradores de seus produtos. Há anos que as fábricas estão longe das pistas, das federações e das confederações. Porque não confiam nos dirigentes, simples assim. Tente ser recebido, presidente, por algum diretor da Volkswagen, ou da Fiat, ou da Ford. Diga que, como presidente da importantíssima Fepauto, tem um grande projeto para a montadora. Possivelmente não vão lhe dar nem um crachá de visitante.

E a mensagem ainda afirma que os meios de comunicação daqui dão uma enorme cobertura ao automobilismo. E nos patrocinam! Ôpa. Claro, são páginas e mais páginas nos jornais, minutos intermináveis de nossos campeonatos na TV, milhões de dólares em patrocínos…

Afemaria. Em que mundo esse sujeito vive? Que jornal lê? Que canal assiste? Qual empresa de comunicação patrocina o automobilismo do Sul/Sudeste? Se está falando da Truck e da Stock, alvo errado. Essas categorias não são do Sul/Sudeste. São nacionais. E se não correm no Pará, talvez seja pelo fato de que não há onde correr no Pará. Porque elas correm no Mato Grosso do Sul, em Pernambuco, na Bahia…

Por fim, presidente, se há aqui diretores de prova e comissários profissionais, receio ser essa a função de uma federação, não? Formar gente para trabalhar nisso. Se a Fepauto não os tem, novamente peço que me isente de culpa. Não tenho nada a ver com isso.

E termino destacando mais um trechinho:

Por fim, atrelar um problema empresarial ao cargo ocupado na Vice-Presidência da CBA, demonstra e corrobora o pensamento discriminatório e preconceituoso para com o Estado do Pará e a Região Norte que, por não possuir as condições elencadas acima, merece não só ter um representante na Vice-Presidência como, no futuro, na Presidência da CBA.

Esperamos ter contribuído para deixá-lo um pouco mais informado sobre o nosso grande Brasil, do qual o Estado do Pará também faz parte. E merece respeito.

Juro que tentei compreender esse raciocínio meio tortuoso, que relaciona a falta das “condições elencadas” ao merecimento de uma eventual presidência da CBA. Será que temos aqui alguém se lançando candidato nas próximas eleições? Não sei. Só sei que a única frase do presidente com a qual concordo inteiramente, em seu longo e-mail, é a última.

Claro que o Pará merece respeito. O que o Pará não merece é ter dirigentes cujos nomes aparecem mais no noticiário policial do que no esportivo.