Blog do Flavio Gomes
Brasil

FORÇAS OCULTAS, 50

SÃO PAULO (ou: matou o país e foi andar de DKW) – Jânio Quadros renunciou há exatos 50 anos, no dia 25 de agosto de 1961. Achou que o povo iria carregá-lo de volta ao Planalto, mas caiu do cavalo. Deixou Brasília para a Base Aérea de Cumbica e, de lá, foi para o Guarujá. […]

SÃO PAULO (ou: matou o país e foi andar de DKW) – Jânio Quadros renunciou há exatos 50 anos, no dia 25 de agosto de 1961. Achou que o povo iria carregá-lo de volta ao Planalto, mas caiu do cavalo. Deixou Brasília para a Base Aérea de Cumbica e, de lá, foi para o Guarujá. De Vemaguet. Essa foto aí do lado já saiu aqui, enviada pelo Jason Vôngoli. É sensacional. O carro está maravilhoso. Tem cara de ser verde com capota branca, talvez cerâmica. Por onde andará?

(Para o bem da precisão da informação, se for mesmo um modelo 1961, e é impossível saber porque não dá para ver os parachoques, nem a tampa do portamalas, é mesmo uma Vemaguet. Se for anterior a isso, é ainda uma caminhoneta DKW-Vemag. A calota dá uma pista de que pode ser 1959 ou 1960, mas não é um indício conclusivo. Fiquemos com Vemaguet, pois, nome adotado no ano da renúncia.)

A culpa de tudo que aconteceu no Brasil nos 25 anos seguintes é do Jânio. Ele era um fruto da democracia, no que diz respeito aos cargos que ocupou. Foi eleito para todos: vereador, deputado, prefeito, governador, presidente. Seu vice era João Goulart, que naquele tempo se votava em vice, também.

Eles não tinham nada a ver um com o outro. Embora popular e capaz de coisas como condecorar Che Guevara, Jânio era um reaça amalucado. Jango era de esquerda. Quando Jânio renunciou, os quartéis e o Departamento de Estado dos EUA ficaram ouriçados. Porque o vice era comuna.

Jango estava na China, na ocasião, em viagem oficial. Não queriam permitir que voltasse e assumisse. Há quem diga que havia planos para derrubar seu avião. Só foi tomar posse no dia 7 de setembro. Isso depois de uma intrincada negociação que resultou num parlamentarismo manco, com Tancredo como primeiro-ministro. Menos de três anos depois os militares deram um golpe e aí aconteceu o que aconteceu. O país caiu nas sombras.

Mais de duas décadas depois, Jânio enfrentou um filhote da ditadura, Fernando Henrique, na disputa pela Prefeitura de SP. Filhote da ditadura, entendam, porque figuras como ele e muitos outros que ocupariam posições importantes no Brasil surgiram do combate à ditadura militar. Aquele Tancredo que virou primeiro-ministro acabou sendo o primeiro presidente civil depois do regime dos quartéis. Outro filhote da ditadura. Outro filhote da renúncia de 25 de agosto de 1961.

Jânio ganhou de FHC porque o sociólogo se deu mal num debate na TV, quando Boris Casoy perguntou a ele se acreditava em Deus. Nossa cidade carola não admitiria nunca um ateu no Ibirapuera. Ganhou o beberrão, histriônico, enlouquecido homem da vassoura. “É isso aí”, foi a manchete do “Jornal da Tarde”, o que eu lia na época, no dia seguinte à eleição. A capa era toda tomada por uma foto de Jânio com cara de doido.

Sua passagem pela Prefeitura, já na transição para a democracia plena, resultou em pouco mais que alguns ônibus de dois andares que não passavam por certas ruas, porque eram muito altos, e em factoides como sair multando pessoalmente motoristas no seu caminho de casa para a sede do Executivo, no meio do parque. Seu governo foi tão ruim e excêntrico que SP, a cidade carola, elegeu o PT pela primeira vez no pleito seguinte, na primeira vitória expressiva do partido.

Jânio, sejamos sinceros, fodeu a porra toda. Mas pelo menos saiu de fininho com estilo, numa Vemaguet.