Blog do Flavio Gomes
Rali

GUARUJÁ (blá-blá-blá) – Ao contrário de acidentes fatais em outras categorias, as mortes no Dakar (agora vou escrever assim, com K) não me indignam tanto quanto me entristecem. Pode parecer meio mórbido, mas explico. Um rali, em geral, não oferece condições ideais de segurança para ninguém. Muito menos para quem participa de moto. Claro que […]

GUARUJÁ (blá-blá-blá) – Ao contrário de acidentes fatais em outras categorias, as mortes no Dakar (agora vou escrever assim, com K) não me indignam tanto quanto me entristecem. Pode parecer meio mórbido, mas explico. Um rali, em geral, não oferece condições ideais de segurança para ninguém. Muito menos para quem participa de moto. Claro que quem organiza qualquer bagaça desse porte deve tentar antever tudo que for possível. Acho inadmissível, por exemplo, quando morrem espectadores. Não sei como, nos anos 80, não pereciam sob as rodas e motores fumegantes das provas do Mundial algumas dezenas por etapas. Basta procurar vídeos da época no YouTube. Busquem especialmente os tributos aos monstrengos do Grupo B. Inadmissível também quando o socorro não chega, apesar de todas as formas de monitoramento disponíveis hoje em dia.

Civilizaram-se, dentro do possível, o WRC e os ralis em geral depois das barbáries oitentistas. Mas uma prova como o Dakar é de difícil controle. Martínez Boero morreu hoje, no primeiro dia de competição. É sempre uma tragédia. Mas é preciso entender que todos os competidores partem para uma empreitada desse porte tendo noção de que as chances de acidentes são bem maiores e bem menos previsíveis do que se corressem de carro numa pista fechada. É cada um por si.

Em geral, as mortes em autódromos são evitáveis se estes forem seguros, se os carros respeitarem as normas, se os pilotos se comportarem de forma decente, se não houver negligência de dirigentes, construtores, engenheiros. Num rali, não há adversários, exceto o cronômetro e os próprios limites. E o Dakar, como escrevi há dois anos, é mais que um rali. É fruto do nosso tempo, desse tempo em que não basta viver, é preciso buscar algo grandioso que para alguns pode ser correr a São Silvestre, para outros pode ser percorrer o Caminho de Santiago de Compostela, para outros, ainda, mergulhar em Fernando de Noronha para ver peixinhos coloridos e passar a mão num golfinho.

Presto minhas homenagens aos mártires dos ralis, do Dakar em especial. É preciso coragem para desafiar a morte em nome de algo muitas vezes indefinível e inexplicável.

Foto Carsten Horst