Blog do Flavio Gomes
F-1

A CAMINHO DO CABO (2)

SÃO PAULO (nada certo) – Está no site da “Quatro Rodas”, em texto assinado pelo competente Marcos Sérgio Silva: a Globo desistiu da F-1 e não vai mostrar o Mundial de 2015 no ano que vem. As corridas vão para a SporTV. A notícia começou a circular há cerca de uma hora e já causou […]

globoantigologoSÃO PAULO (nada certo) – Está no site da “Quatro Rodas”, em texto assinado pelo competente Marcos Sérgio Silva: a Globo desistiu da F-1 e não vai mostrar o Mundial de 2015 no ano que vem. As corridas vão para a SporTV.

A notícia começou a circular há cerca de uma hora e já causou alvoroço nas redes sociais, como era de se esperar. O Grande Prêmio foi atrás de todas as fontes possíveis para confirmar a informação — não que dela duvide, mas é importante tentar ampliar o assunto, até porque a TV Globo não foi ouvida no texto da “4R”, e sim Carlos Miguel Aidar, que segundo a reportagem é advogado da FOM.

O Grande Prêmio não conseguiu confirmar esta informação específica. Na verdade, fontes próximas à FOM ouvidas pelo site afirmaram que Aidar não é advogado da empresa controlada por Bernie Ecclestone, e sua ligação com a F-1 seria apenas como conselheiro informal do GP do Brasil. Infelizmente não conseguimos contato com Aidar, que também é presidente do São Paulo e tem como cliente, em seu escritório de advocacia, a CBF. O que explica inclusive a autoria da reportagem, pois Silva trabalha com futebol, na “Placar”. Talvez a pauta fosse outra e Aidar tenha cometido alguma indiscrição. Ou equívoco, o que também é bem possível.

Mas isso é só uma prestação de contas de nossa apuração e o registro de algo que a “4R” cravou com todas as letras. Nossa matéria, para informar nossos leitores sobre o tema com os dados de que dispomos, está aqui. Inclusive a duração do contrato FOM-Globo, que termina em 2020. E prevê transmissão em TV aberta. Qualquer mudança de rumo certamente terá de passar por advogados.

Este blog, porém, é o espaço ideal para aquilo que neste momento interessa de verdade: discutir o caminho que parece não ter volta, seja em 2015, seja mais para a frente. A saber: a F-1 na TV a cabo.

Falamos disso há algumas semanas, quando a Globo resolveu mostrar só o Q3 do GP da Alemanha. Aparentemente, será o padrão daqui em diante. A (eles dizem “o”, internamente) SporTV assumiu a transmissão das classificações na íntegra ao vivo.

Fato é que as audiências da F-1 têm caído no Brasil, e faz tempo. Elas oscilam em função das chances de um brasileiro fazer algo que preste nas corridas. A velha história do telespectador que não gosta do esporte, mas sim de ver brasileiro vencendo. Em qualquer esporte.

Isso, creio, é culpa da Globo. Que sempre tratou todas as modalidades esportivas que transmite como terreno concebido para brasileiro ganhar. Não por outro motivo, os domingos de manhã são reservados a “desafios internacionais”, “jogos mundiais de verão”, “superduelos universais” e outras bobagens cujo único objetivo é um desfecho com vinheta Brasil-sil-sil e atleta chorando com a bandeira na mão e sendo tratado como herói. Sempre competições fracas e irrelevantes — peteca, vôlei de praia, futebol de areia, meia-maratona, natação em Copacabana, essas coisas.

Tiro no pé. Cria-se (ou tenta-se criar) uma legião de fãs de atletas brasileiros, e não de esportes em geral. Criam-se, igualmente, falsas expectativas de vitória quando a coisa é séria. A F-1, por exemplo. A Copa do Mundo, outro exemplo. As Olimpíadas, mais um. Outro dia vazou no áudio da Globo o Galvão orientando o pessoal a não falar muito dos tempos que Massa vinha fazendo nos treinos, porque ele estava “tomando meio segundo do Bottas desde ontem”. Ou seja: vamos dourar a pílula, dar uma enganadinha básica na patuleia, não vamos dizer a verdade, senão o povo fica decepcionado. Afinal, o que se vende na véspera é sempre a chance da vitória, da vinheta, da bandeira, da musiquinha.

O caminho do cabo não é novo. Na Europa, nos mercados mais importantes, F-1 passa em TV fechada e já faz tempo. Há uma tendência mundial de segmentação, o que não é necessariamente ruim. Desde que o público dos canais fechados seja tratado com mais respeito por quem tem os direitos de transmissão. Basta ver uma corrida na Sky inglesa (que, além do mais, é pay-per-view). A cobertura é sensacional. Abertura uma hora antes, entrevistas depois, muitos comentaristas, reportagens especiais… Para quem gosta, é uma delícia.

E quem vai migrar para a TV fechada é quem gosta. O cara que vê Superdesafio das Estrelas de Futebol de Areia num domingo e GP de F-1 no outro não é esse que vai para o cabo. Para ele, tanto faz o que está no ar. E se a corrida não tiver um brasileiro na bica para levar um troféu, pode ser que o sujeito que se ufana de seu país se irrite um pouco. Prefere o “Ultraduelo das Américas da Lagoa Rodrigo de Freitas”, certeza. Porque vai ter um cabra lá para receber um prêmio e chorar de verde-amarelo. Em qual modalidade? Não importa. Tem vinheta e cara de choro, tá valendo.

A Globo não se pronunciou, e nem sei se vai, sobre a matéria da “Quatro Rodas”. Há quem acredite que dificilmente a emissora vai abrir mão das milionárias cotas de patrocínio que vende sem dificuldade todos os anos para a F-1. Mas é bom destacar que quem compra não se preocupa muito com o ibope das corridas, que é baixo. A “mídia F-1” é interessante porque garante espaço nos intervalos de todos os telejornais da casa em semana de GP. A entrega é boa no horário nobre das sextas, sábados, domingos e segundas.

Muita gente, no entanto, vai chiar se de fato a F-1 deixar a TV aberta. Compreensível, já que falamos de mais de 40 anos de transmissões. Essas coisas mexem com as pessoas. Mas vivemos novos tempos. Como disse antes, pode não ser em 2015, nem em 2016, sei lá quando. O rumo, porém, é esse e é inevitável. Modalidades esportivas de longa duração que não agradam a todos têm esse destino, mesmo. Foi assim com o tênis, com o golfe, com o basquete, o vôlei vive mudando suas regras para encurtar a duração dos jogos, e tem o boxe, as lutas, a Nascar…

No fundo, embora estejamos todos acostumados com ela, a F-1 é cada vez mais e para cada vez mais gente um corpo estranho na lógica da TV aberta atual.