Blog do Flavio Gomes
Futebol

MATARAM MEU TIME

SÃO PAULO (canalhas) – Esse menininho aí de azul, cabeça raspada, faixa no peito, sou eu. Tinha 17 anos, e acabara de passar no vestibular. Cortaram meu cabelo. Foi meu último jogo pelo Rigesa, clube que defendi de 1978 a 1981. A foto é de 14 de março de 1982, um amistoso para receber a faixa […]

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SÃO PAULO (canalhas) – Esse menininho aí de azul, cabeça raspada, faixa no peito, sou eu.

Tinha 17 anos, e acabara de passar no vestibular. Cortaram meu cabelo. Foi meu último jogo pelo Rigesa, clube que defendi de 1978 a 1981. A foto é de 14 de março de 1982, um amistoso para receber a faixa de campeão valinhense juvenil do ano anterior. Eu era reserva do Gilmar, o outro goleiro de azul. Perdemos da Ponte por 5 a 4.

Na época, já tinha voltado para São Paulo para fazer faculdade. Joguei alguns minutos, apenas, porque era festa. Se bem me lembro, tomei o gol da derrota.

Gilmar era bem melhor que eu, mas fui titular em outras categorias em alguns campeonatos. Era um bom goleiro, não muito baixo naqueles tempos — era normal um moleque de 14 ou 15 anos ter 1,64 m, estatura que ostento ainda hoje, aos 50. Para compensar o fato de ser baixinho, treinava loucamente com um colete de areia de 3 kg, para melhorar a impulsão. Mesmo assim, vivia tomando gol por cobertura.

Toninho Evangelista era nosso técnico, já escrevi sobre ele. Na foto, é o quarto de pé, da direita para a esquerda. O melhor treinador que um garoto poderia ter nos anos 70, defendendo um esquadrão fundado em 1943 como Papelão F.C., depois Rigesa E.C., finalmente A.D.C. Rigesa, time da fábrica onde meu pai trabalhava.

Joguei no Brinco e no Majestoso, em Valinhos, Vinhedo, Campinas, Louveira, Sousas, disputei muitos torneios, ganhei medalhas e faixas, porque o Rigesa, desculpem o termo, era foda, muito foda. Jamais me esquecerei dos 3 x 1 no Guarani depois de tomarmos de 4 x 0 no primeiro turno. Nem do 0 x 0 heróico com a Ponte no Moisés Lucarelli, numa preliminar de um jogo de quarta à noite.

Só jogava de azul, sempre gostei de jogar de azul, mas às vezes vestia a camisa amarela, também, ou vermelha, dependia do material disponível, e meu melhor campeonato, em 1979, disputei com uma camisa verde, calção e meias azuis, não combinava muito, mas joguei muito bem naquele ano.

O Rigesa acabou ontem, dia 4, me avisou um leitor de Valinhos. A fábrica, uma multinacional americana, resolveu encerrar as atividades do clube, provavelmente alegando “realinhamento de prioridades” ou alguma merda parecida. O campo, a sede do clube, a lanchonete, os vestiários,a bocha, tudo aquilo deve virar algum empreendimento premium com varanda gourmet.

É o mundo corporativo, vão dizer, as coisas são assim. Mas jamais perdoarei esse mundo corporativo com seus balanços e prioridades e realinhamentos que não respeita minha infância, minha adolescência, os anos mais doces da minha vida e da vida de todos que um dia vestiram essa camisa, sangraram e suaram pelo vermelho, preto e branco do Rigesa.

Quando se mata um time de futebol de garotos, morre a humanidade toda.