Blog do Flavio Gomes
F-1

MIRABOAS (5)

SÃO PAULO (agora chupa essa manga) – Foi a maior cagada da história da F-1, desde que me lembre. Mas é preciso saber perder. Com duas frases como essas, de efeito, dá para resumir o GP de Mônaco que, até a panca de Verstappinho em Grojã, estava um saco, como se imaginava que seria. Isso […]

miraboas666SÃO PAULO (agora chupa essa manga) – Foi a maior cagada da história da F-1, desde que me lembre. Mas é preciso saber perder.

Com duas frases como essas, de efeito, dá para resumir o GP de Mônaco que, até a panca de Verstappinho em Grojã, estava um saco, como se imaginava que seria.

Isso foi na 64ª das 78 voltas da corrida. Max, que tinha feito duas paradas e tentava salvar alguma coisa de sua estreia monegasca, encheu a traseira de Grosjean na freada da Sainte Dévote quando tentava buscar o décimo lugar. Tinha mais pneu e carro, mas errou o cálculo, abusou da sorte e se espatifou na barreira de proteção. “Ele freou cedo”, reclamou. O safety-car foi acionado para limpar a bagunça.

Então, a Mercedes resolveu chamar Hamilton para os boxes. Ah, dona Mercedes…

Lewis liderava a prova desde a primeira volta. Sem o menor problema, um passeio pelas ruas do Principado. Na média, mantendo Rosberguinho a dois ou três segundos de distância. Quando chegaram os retardatários, essa diferença aumentou ainda mais, passou a 9s na volta 31, estava tudo muito, muito fácil.

O pit stop único para os pilotos da Mercedes aconteceu na volta 37 para Nico e na 38 para Lewis. Nessa bateria de paradas, aliás, a única mudança no trenzinho da frente foi a troca de posições entre Ricciardo e Raikkonen. A Ferrari trabalhou melhor e devolveu Kimi em quinto, com Ricardão relegado ao sexto posto. Na dianteira, Hamilton, Rosberg e Vettel. Desde o início. Em quarto, Kvyat, que ainda teria de parar.

Na volta 47, a diferença do inglês para seu parceiro alemão era de dez segundos cravados. Um capricho do cronômetro.

E tudo caminhava para uma vitória sonolenta do britânico quando, no momento do safety-car, a Mercedes chamou seu piloto.

Para quê?, me perguntei — e o mundo inteiro — quando vi o cara entrando nos boxes. Esses caras estão loucos? Faltavam 13 voltas. Os pneus, em Mônaco, aguentam dias rodando. Que ideia de jerico era aquela? Será que alguém achou mesmo que ele voltaria na frente de Rosberg e Vettel? Quem é que fez essa conta?

Ao sair dos boxes, espumando, Hamilton viu Nico passar todo pimpão. Ainda tentou deixar Vettel para trás para minimizar o prejuízo, mas recolheu porque o safety-car ainda estava na pista e Sebastian passou pela linha de saída do pit-lane na frente. Se ultrapassasse, seria punido.

Era líder sossegado, voltou em terceiro. Uma besteira monumental. Pelo rádio, Comandante Amilton falou: “Perdemos a corrida, né?”.

Cri-cri-cri.

Daí até o fim, a expectativa era menos pelas tentativas de ultrapassagem e muito mais para ver a cara de Lewis no pódio. A corrida foi reiniciada na volta 70 e Hamilton até ensaiou um movimento aqui ou ali, mas quem estava na sua frente não éramos nem eu, nem você, mas Vettel, tetracampeão mundial. Na ponta, Rosberg acariciou a vitória que caiu no seu colo e, enquanto Tião Italiano segurava o ímpeto de Hamilton, abria segundos confortáveis para buscar seu terceiro triunfo seguido em Monte Carlo — antes dele, Graham Hill, Prost e Senna eram os únicos pilotos com três vitórias consecutivas no Principado. Foi a décima dele na carreira.

As últimas voltas ainda reservaram emoções, como a ultrapassagem espetacular de Ricciardo sobre Raikkonen na Mirabeau na volta 72. Com pneus novos, ele partiu para cima de Kvyat e a Red Bull pediu ao jovem soviético que abrisse, porque Ricardão poderia tentar algo sobre o desesperado Hamilton e, quem sabe, beliscar um pódio. Como não deu, na última volta o australiano devolveu o quarto lugar a Kvyat, num gesto muito bonito.

A prova ia chegando ao fim e, pelo rádio, o engenheiro Peter Bonnington tentava dizer algo animador para Lewis, algo como “cara, com esses pneus você tá bem na fita. Vai na fé, fica com Deus, tamo junto”. O piloto, sem a menor paciência para aquele lenga-lenga, encerrou a conversa rispidamente. “Dá para parar de falar comigo, por favor?”

E foi assim, em silêncio, que ele foi até o fim. Depois da bandeirada, parou na entrada do Túnel e deu a impressão de que apontaria para o Mediterrâneo e cometeria suicídio. Desistiu e foi para a premiação. Ao encostar o carro, derrubou a placa que delimitava o local onde deveria estacionar, com um enorme “3” pintado. Cumprimentou Rosberg muito friamente e, se pudesse, atiraria o modesto troféu no porto.

A Mercedes assumiu o erro. “Não há nada a fazer a não ser pedir desculpas a Lewis. Foi um erro de julgamento no calor do momento”, falou Toto Wolff, chefão do galinheiro prateado. “Não sei por que o chamaram. Foi uma confusão, uma decisão errada, muita gente falando ao mesmo tempo. Custou a vitória a Lewis. É inaceitável”, emendou Niki Lauda, o galo do galinheiro.

Rosberguinho não tinha nada com isso. Na quadriculada, deu uma zoada básica. “Oops, I did it again!”, mandou para quem quisesse ouvir pelo rádio de seu carro. Depois, reconheceu que teve sorte. “Lewis pilotou de maneira brilhante e merecia vencer, mas corridas são assim mesmo.” No pódio, efusivo, cumprimentou a princesa e agarrou o irmão dela — são muito amigos, ele e o irmão da princesa.

E Hamilton? “Não foi a mais fácil das corridas. Ganhamos e perdemos juntos. Parabéns ao Nico. Agora vamos sentar e ver como podemos melhorar as coisas.”

Quando eu disse acima que é preciso saber perder, me referia ao gestual todo de Hamilton ao final da corrida. OK, todo mundo tem o direito de ficar puto dentro do macacão. Quem de nós se comportaria de maneira diferente? Ocorre que a tromba pública, em primeiro lugar, acaba sendo uma indelicadeza com quem ganhou. Segundo, aponta o dedo direta e exclusivamente para a equipe — que erra, de vez em quando, mas acerta muito mais — e serve como uma demonstração de autoisenção. Hamilton, muitas vezes, parece um garoto mimado. E é, mas é também um piloto excepcional. Que, como todos, odeia perder. Desse jeito, então, odeia ainda mais. Mas comete seus erros, também. E o time não fica inteiro de bico com ele. De qualquer forma, é difícil julgar e não vou aqui fazer aqui nenhuma peroração sobre o caráter de Hamilton por causa disse. O cara ficou puto, também há que se respeitar.

Faz parte, como se diz. E, como que para tentar apagar a má impressão deixada pela cara de bunda no pódio, Lewis revelou seus planos daqui para a frente: “Dar a volta e ganhar a próxima”.

Aí sim.

Voltamos já com o resto do GP.