Blog do Flavio Gomes
F-1

DANS LA RUE (4)

SÃO PAULO (c0mecem) – Na quinta-feira, Hamilton deu a letra. Ao usar os pneus ultramacios, alegadamente grudentos e aderentes e velocíssimos e pouco resistentes, o inglês comentou: eles são legais, mas duros demais. Aí, no GP de Mônaco que acabou agora há pouco, o cara enfia uma sequência de 47 voltas com uma borracha que, na […]

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SÃO PAULO (c0mecem) – Na quinta-feira, Hamilton deu a letra. Ao usar os pneus ultramacios, alegadamente grudentos e aderentes e velocíssimos e pouco resistentes, o inglês comentou: eles são legais, mas duros demais.

Aí, no GP de Mônaco que acabou agora há pouco, o cara enfia uma sequência de 47 voltas com uma borracha que, na melhor das hipóteses, deveria durar 20. E ganha a corrida.

Nada como um dia após o outro.

Ontem, Comandante Amilton apareceu na foto dos três primeiros do grid com cara de quem tinha perdido um parente. Os problemas técnicos no Q3 quase impediram-no de fazer uma volta rápida. Ainda conseguiu um terceirinho suado. Ao lado dele, aparecia um sorridente Ricciardo, feliz da vida com sua pole, a primeira da carreira, justo onde ela é mais importante.

Hoje, a foto do pódio chique de Monte Carlo tinha os dois — e mais um espetacular Pérez. Lewis, agora, saltitante e contente como não se via desde o ano passado. O australiano, por sua vez, triste como nunca se viu. Foi a primeira vitória de Hamilton no ano, a segunda em Mônaco. E a 44ª da carreira.

Aquele sorriso cheio de dentes de Ricciardo desapareceu porque a Red Bull acabou com sua corrida num pit stop. Foram mais de 13s parado nos boxes, esperando pelos pneus. Isso não se faz. Não em Mônaco. A equipe não estava pronta para a parada. “Não fui para a troca por minha conta. Me chamaram para o pit stop. Então, deveriam estar prontos. É foda. Isso machuca”, falou. Traduzi “it sucks” por “é foda”. Acho que não está muito longe do que ele quis dizer.

[bannergoogle]Foi um bom GP de Mônaco, este. Começou com frio e chuva, o que é sempre legal nas ruas do Principado — 17ºC, bem gelado. Pena que a F-1 insiste com essa bobagem de, no molhado, largar atrás do safety-car. Só quando o spray já era mais do que aceitável e os pilotos, pelo rádio, perguntavam quanto tempo ia durar aquela palhaçada, é que a corrida teve o início autorizado de verdade. Foi na oitava volta.

Estavam todos com pneus para chuva intensa, por determinação da direção de prova. Mas foi só largar que Magnussen correu para os boxes e colocou os intermediários. Dava, tranquilo — apesar do acidente de Palmer, que aquaplanou na reta dos boxes e foi parar no guard-rail. Mas para quem tinha muito a perder, era melhor alguma cautela. Assim, lá na frente Ricciardo disparou na ponta e começou a abrir de Rosberguinho, sem pensar em trocar pneus. Lento, o alemão segurava Hamilton num ritmo inexplicável. Virava tempos cerca de 3s piores que o piloto da Red Bull.

O segundo a bater, sozinho e de forma melancólica na Loews, foi Raikkonen. Ficou com a asa presa debaixo do carro e abandonou, na décima volta. Na 13ª, Ricardão já tinha 8s8 sobre Rosberg. Então, Vettel, que estava em quarto, abriu em definitivo a sessão de troca de pneus. Foi para os boxes e tacou os intermediários. O resto foi na balada. Mas nem todos.

O pessoal mais à frente e imediatamente atrás de Sebastian achou melhor ficar do jeito que estava. Na dúvida, sei lá… Volta 16, e Hamilton passa Rosberg na subida do Cassino como se o companheiro estivesse parado. A equipe pediu para que ele deixasse o companheiro ir embora. “Não sei o que tinha meu carro”, resmungou o alemão. Na 17ª, os seis primeiros se mantinham com pneus “wet”: Ricciardo, Hamilton, Rosberg, Sainz Jr., Pérez e Massa. O brasileiro segurava um trenzinho que tinha Vettel de locomotiva, o primeiro com intermediários.

E é claro que nessas condições de pista meio úmida e meio molhada e meio seca tem gente que se destaca e gente que faz uma cagada atrás da outra. Comecemos com Kvyat. Afemaria. Primeiro, o coitado teve de trocar o volante antes mesmo de largar de verdade. Perdeu uma volta. Aí, conseguiu bater em Magnussen na Rascasse. Era retardatário, o russo. Ridículo. Desse jeito, vai ser rebaixado para a GP2. E se reclamar, vai parar no kart de novo.

Entre a turminha que fazia bonito estava Verstappinho. Largou dos boxes e começou a passar o povo sem negociar muito, chegando à zona de pontos com menos de um terço de prova.

Àquela altura da corrida, volta 23, os pneus intermediários eram claramente mais velozes que os “wet”. Ricciardo, mesmo assim, se mantinha na ponta com 11s de vantagem para Hamilton, que por sua vez já tinha enfiado mais de 30s em Rosberg. Aí o líder parou. Colocou os “inter” e Lewis assumiu a ponta. Nosso simpático marsupial voltou em segundo, 8s4 atrás do inglês da Mercedes. Como Hamilton teria de parar, estava tudo sob controle.

Como era natural, Lewis começou a virar tempos muito altos com os pneus errados. Ricciardo foi chegando. Na volta 28, já não havia mais diferença. A estratégia de Hamilton e da Mercedes era claríssima. Saiu o sol, a pista estava secando. Não dava ainda para “slicks”. Mas Lewis iria esticar o uso dos “wet” até onde desse para, na parada, colocar “slicks”. Economizaria, assim, um pit stop. Não passaria pelos intermediários, como todo mundo fez (Wehrlein foi esse que adotou essa estratégia, mas chegou lá atrás).

O primeiro a espetar pneus para pista seca foi Ericsson, na volta 31. Hamilton fez o mesmo na sequência. Segurou Ricciardo como dava, porque lá ninguém passa mesmo, e fez sua parada única.

Única? Pô, o cara colocou ultramacios! Não chegaria nunca ao final da corrida com aquele jogo de pneus!

Chegou.

Todo mundo tirou os intermediários para colocar “slicks”, e as escolhas foram bem sortidas. Teve gente de ultramacio, gente de supermacio, gente de macio. Cada um acreditando no que quisesse, ninguém a fim de parar de novo, obviamente. Ricciardo parou na volta seguinte. Sem Hamilton na sua frente, acelerou loucamente para poder fazer seu pit stop e voltar em primeiro. Iria dar certo, tinha até algum tempinho de sobra.

[bannergoogle]Só que, aí, a Red Bull estragou tudo. Quando o australiano parou, os pneus traseiros preparados estavam errados. Na confusão, ficou mais de 13s parado e quando saiu do pitlane viu Hamilton alegremente passando em primeiro. Faltavam 46 voltas. Sua única esperança seria uma nova parada de Lewis, porque passar, na marra, seria muito difícil. Em tempo: Ricciardo colocou supermacios, que aguentariam sem maiores problemas até o final.

Ricardão tinha um carro mais rápido. Encostava, mas tinha de aliviar de vez em quanto para não detonar a borracha. Quem não aliviou foi seu parceiro Verstappinho, que já em nono se empolgou demais e bateu sozinho no Cassino. Foi na volta 35. Uma no cravo, outra na ferradura. Bom para aprender. E ele aprende, podem ter certeza.

As posições da volta 37, do primeiro ao décimo, ficaram praticamente inalteradas até o final: Hamilton, Ricciardo, Pérez, Vettel, Alonso, Rosberg, Hülkenberg, Sainz Jr., Button e Gutiérrez. Para não dizer que nada aconteceu, Hulk ganhou a posição de Nico nos últimos metros da última volta e Guti-Guti perdeu seu pontinho para Massa no fim. A Williams, como se esperava, teve uma performance patética.

Apesar disso, houve bons momentos nessa segunda metade seca do GP. Ricciardo ficou na cola de Hamilton o tempo todo. O agora desolado canguru até que tentava alguma coisa. Esteve perto de passar num ligeiro erro de Lewis na saída do Túnel, mas o inglês fechou a porta, Daniel xingou, e ficou por isso mesmo. Depois da 55ª volta ele já tinha clara noção de que o inglês não iria parar de novo e seguiria até a quadriculada com os ultramacios. Aí é que ficou triste de vez. Desistiu.

Teve também uma presepada sauberiana, na volta 50. A equipe suíça mandou Nasr abrir caminho para Ericsson — estavam em 15° e 16° –, mas o brasileiro, com razão, não quis nem saber. Na Rascasse, o sueco tentou o impossível e os dois, claro, bateram. Marcus pediu desculpas. Nasr ficou puto. Um desastre. A Sauber é um desastre.

Um pouco mais à frente, Alonso era a locomotiva da vez. Em quinto, puxava o trem com os vagões Rosberguinho, Hulk e Sainz Idade — todos a menos de 1s um do outro. Mas ninguém cometia erros, e ninguém arriscava muito. A prova seguia num ritmo divertido e de expectativas otimistas, com muita coisa podendo acontecer, claro. Afinal, era Mônaco, tinha um pouquinho de água fora do traçado, sabe como é. Mas, na real, pouca coisa acontecendo. Sabe como é.

As últimas voltas ganharam um pouco em tensão com alguns pingos começando a cair aqui e ali. Mas essa nova chuva só apertou mesmo na última volta, atrapalhando aqueles que ainda tinham alguns quilômetros a percorrer — depois que os primeiros colocados receberam a bandeirada. A saber: Rosberg, que perdeu o sexto lugar para Hülkenberg praticamente na linha de chegada.

No pódio, a primeira pessoa que Hamilton cumprimentou foi Justin Bieber. Confesso que, na minha ignorância do mundo das celebridades, tive de perguntar à namorada quem era aquele moleque loirinho que a segurança deixou passar. “Justin Bieber, ué!”, ela disse. “Certeza?”, perguntei. Recebi, de volta, um olhar de desaprovação justificado por conta de minha ignorância musical e artística. O rapaz é bem famoso.

Mas fiquei, mesmo, com pena do tristonho Ricciardo. Duas corridas seguidas que poderia ter vencido, mas por responsabilidade do time acabou não levando. É dura a vida. Até o mais radiante dos sorrisos, às vezes, tem de ser recolhido para reflexão. Tadinho.

Bem, o resultado claramente dá uma animada no campeonato. Rosberg tinha 43 pontos de vantagem para Hamilton, quase duas vitórias, e agora são 24 — menos que uma. É a hora de mostrar que tem a cabeça no lugar e que não vai se deixar abater por conta de um resultado ruim.

Porque se deixar, dança.