Blog do Flavio Gomes
F-1

CREMA CATALANA (3)

SÃO PAULO (já de volta) – Quem aguenta um menininho de 6 anos chorando sem fazer nada? A nova F-1 não aguentou — e por “nova” entenda-se algo como aquelas padarias que reabrem com uma faixa na porta: “sob nova direção”. Nem a Ferrari. Ele abriu o berreiro quando Raikkonen abandonou a corrida de Barcelona […]

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SÃO PAULO (já de volta) – Quem aguenta um menininho de 6 anos chorando sem fazer nada? A nova F-1 não aguentou — e por “nova” entenda-se algo como aquelas padarias que reabrem com uma faixa na porta: “sob nova direção”.

Nem a Ferrari. Ele abriu o berreiro quando Raikkonen abandonou a corrida de Barcelona logo na largada, após um toque com Bottas e, na sequência, Verstappen. Depois, abriu um sorriso delicioso quando Vettel segurou Hamilton na saída de um pit stop, mantendo a ponta.

Então, foram buscar o moleque na arquibancada. E quando o vimos de novo, ele estava todo saltitante no motorhome da Ferrari, tirando fotos com Kimi, ganhando boné autografado e, um pouquinho mais tarde, festejando o segundo lugar de Sebastian com a toda equipe, na hora do pódio.

Foi a coisa mais bacana do GP da Espanha vencido por Hamilton, a história do menino francês Thomas e sua mãe, fanática pela Ferrari — está contada aqui pelo enviado especial do Grande Prêmio, Thiago Arantes, que foi atrás dos dois.

Um toque de humanidade que a F-1 talvez nunca tenha tido, de forma institucional. Fico imaginando quantas histórias bonitas como essa foram reprimidas ao longo dos anos de chumbo comandados por Bernie Ecclestone e sua trupe de perdigueiros caçadores de credenciais — dedicados, por décadas, a transformar a categoria em algo asséptico, inatingível, elitizado às raias do absurdo.

Mas não foi a única boa deste domingo, longe disso. A corrida foi muito interessante, em que pese o fato de ter sido disputada em dois pelotões bem distintos: um formado por Hamilton e Vettel; o outro, pelos demais.

A dupla que domina o campeonato, e que felizmente é composta por pilotos de equipes diferentes, fez uma corrida à parte, tática, estratégica, tensa, disputada nos boxes e na pista. Ricciardo, o terceiro colocado, chegou 1min15s atrás. A partir do quarto colocado, todos que fecharam a zona de pontos ficaram uma volta atrás. É um abismo brutal, que ficou mais evidente hoje porque alguns possíveis protagonistas ficaram fora de combate muito cedo.

[bannergoogle]Na largada, Vettel pulou ligeiro à frente do pole Hamilton, e ambos se livraram da confusão que tirou Raikkonen e Verstappinho da prova, logo atrás deles. Tudo começou com uma freada muito antecipada de Bottas, que permitiu ao finlandês da Ferrari mergulhar à frente do Mercedes #77 na primeira curva. Mas ali é estreito, a roda traseira direita de Kimi tocou na dianteira esquerda de Valtteri e sua Ferrari ricocheteou para o meio da pista. Quem vinha por fora era o jovem Max, que acabou atingido pelo carro vermelho.

Resultado: Raikkonen e Verstappen com suspensões quebradas, praguejando contra Bottas, cuja corrida não duraria muito. Vencedor na Rússia, Sapattos acabaria abandonando depois de 40 voltas, com o motor arrebentado. Coisa rara, mas compreensível. Bottas teve de voltar ao motor usado nas primeiras quatro corridas do ano, por conta de um problema numa unidade nova. O velho não aguentou.

Sem um carro da Ferrari e um da Mercedes, e sem Verstappen — que venceu na Espanha no ano passado e é sempre uma atração –, o GP ficou para Vettel e Hamilton. Caberia aos dois fazer daquele limão, uma limonada doce e refrescante. Os dois sumiram na frente, mas sempre com um de olho no outro. E fizeram a limonada.

Vettel parou primeiro para trocar pneus e colocou um novo jogo de macios em seu pit stop, na volta 14. Lewis ficou sete voltas a mais na pista para tantar descontar o tempo perdido ao perder a liderança na largada, e surpreendeu ao espetar um jogo de médios quando parou. Voltou em terceiro, com Bottas na liderança e Sebastian em segundo. O alemão perdeu algum tempo para passar o mercêdico, que tinha pneus mais velhos. Mas acabou fazendo uma linda ultrapassagem e reassumiu a ponta. Lewis veio na sequência e passou também, sem a menor objeção do companheiro de equipe, obviamente.

Tudo passou a ser, a partir daí, uma questão de administração da borracha. Vettel teria de parar mais uma vez e colocar médios. Lewis teria até a chance de ir até o fim da corrida sem parar mais, mas não era muito provável. Melhor seria cumprir a última parte da prova com pneus macios, bem mais velozes, o que acabou fazendo.

Quando Vandoorne tocou em Massa (que estava lá atrás, por ter furado na primeira volta) e ficou parado na pista, um safety-car virtual deu uma acalmada nas coisas, e muita gente foi para os boxes. Logo em seguida Hamilton parou, na volta 36, e colocou pneus macios. Na volta seguinte, Vettel fez sua troca e colocou os médios. A saída dele dos pits foi de prender a respiração. Lewis vinha babando e os dois dividiram a curva, se tocaram, e Vettel segurou a ponta na marra.

Mas Hamilton tinha pneus melhores, e chegar no adversário era questão de tempo. Não demorou muito, e na volta 44 ele passou feito um raio por Vettel, assumindo a liderança e nela ficando até o final. Foi sua 55ª vitória na F-1, segunda no ano.

Mais atrás, num outro universo de desempenho, quem deu um show foi a Force India, levando Pérez e Ocon ao quarto e quinto lugares, no seu melhor desempenho no ano. A equipe, agora, é a única a pontuar em todas as corridas desta temporada com os dois carros. Uma marca digna de aplausos. Como aplausos merecem todos os outros que chegaram nos pontos. Hülkenberg terminou numa excelente sexta posição, seguido por um combativo Sainz Jr. (que largou em 12º), por um excepcional Wehrlein (fazendo os primeiros pontos da Sauber em 2017), um ótimo Kvyat (de 19º no grid para nono no final) e um Grosjean um pouco mais discreto, mas fazendo menos cagadas do que nos treinos.

Como se vê na classificação final da prova um pouco mais acima, pilotos de oito das dez equipes pontuaram, o que é muito legal. Só ficaram de fora da festa a McLaren e a Williams.

[bannergoogle]Na primeira, Alonso, depois do incrível sétimo lugar no grid de ontem, esbarrou em Massa na largada, foi para a brita, despencou lá para trás, e não se recuperou mais. Na segunda, um vexame. OK, Massa teve de fazer a primeira troca imprevista, mas depois ficou se arrastando na pista. Is Troll Venga também andou como uma tartaruga, levando ultrapassagens por todos os lados de pilotos como Ericsson, Palmer & companhia bela. Dos que terminaram a prova, foi o último colocado. Aliás, até Ericsson fez uma boa corrida. E Magnussen, coitado, que teve um pneu furado na última volta após toque com Kvyat, perdendo a chance de pontuar.

Wehrlein merece um parágrafo à parte. Embora não tenha tido seu nome mencionado na transmissão da TV, fez uma corrida extraordinária. Parou uma vez apenas, na volta 33, e ficou o tempo todo andando em sétimo, com uma segurança absoluta e quase inacreditável, considerando-se o carro que tem. No fim, foi punido com 5s por pegar o lado errado da entrada dos boxes no seu pit stop e caiu para oitavo. Uma pena perder uma posição, mas ainda assim uma proeza levar a Sauber aos pontos com tamanha autoridade. Fico imaginando se fosse um brasileiro… Seria tratado como herói nos noticiários globais.

Após a corrida, gentileza e sorrisos por todos os lados. Hamilton elogiou Vettel (“É um privilégio correr contra alguém tão bom quanto ele”, disse), comemorou muito com a equipe e saiu aliviado de Barcelona. Afinal, reduziu bem a desvantagem que tinha para o alemão na classificação, depois da má atuação de Sóchi. Sebastian foi a 104 pontos com o segundo lugar, e Lewis subiu bem para 98. Bottas ficou com seus 63 após o abandono, deixando a impressão de que o que aconteceu na Rússia foi mesmo apenas o tal ponto fora da curva num campeonato que, ao fim e ao cabo, terá apenas dois personagens principais até o final. Um deles é esse moço aí embaixo na foto.