Blog do Flavio Gomes
F-1

VENDE A MÃE (10)

SÃO PAULO (público pagante: 141.218 espectadores nos três dias) – Abrir com o quê? A bela — e previsível — atuação de Hamilton, ou a digna despedida de Massa de Interlagos? Fiquemos com o brasileiro. Se é verdade que o adeus do ano passado foi repleto de lágrimas e emoções — com a providencial ajuda […]

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Massa em sétimo: o primeiro dos outros

SÃO PAULO (público pagante: 141.218 espectadores nos três dias) – Abrir com o quê? A bela — e previsível — atuação de Hamilton, ou a digna despedida de Massa de Interlagos?

Fiquemos com o brasileiro. Se é verdade que o adeus do ano passado foi repleto de lágrimas e emoções — com a providencial ajuda do acaso, que o tirou da corrida com uma batida bem na reta dos boxes, diante das arquibancadas –, o deste, do ponto de vista esportivo, foi bem mais intenso. Afinal, ele foi até o fim da prova, que é o que qualquer piloto deseja. E acabou sendo aquilo que, nesta temporada, a gente tem chamado de “primeiro dos outros”, a saber: o melhor de todos, descontando os favoritos das três equipes grandes, Mercedes, Ferrari e Red Bull.

Felipe terminou o GP do Brasil em sétimo, com uma atuação bem convincente a partir da largada. Era nono no grid, fechou a primeira volta em sexto. Isso foi determinante para o resultado final. O quinto era Fernando Alonso, a quem ultrapassou na relargada da prova, neutralizada com safety-car já na primeira volta, após acidente entre Magnussen, Ricciardo e Vandoorne no S do Senna. Só o australiano sobreviveu. Os outros dois abandonaram.

Alonso aplaude o brasileiro: despedida digna

O reinício se deu na volta 5, e Felipe foi decidido para cima do espanhol, que acabaria acompanhando-o de perto até o fim da corrida. E conseguir segurar o asturiano acabou sendo o ponto alto da atuação de Massa, que era mais rápido nas retas, mas mais lento no miolo. Qualquer erro poderia ser fatal, tanto que Fernando cruzou a linha apenas 0s481 atrás do brasileiro. E foi Alonso, também, o responsável por uma das mais belas imagens do domingo, ao sair do cockpit de seu carro e esperar pela passagem do ex-companheiro de Ferrari, para aplaudi-lo de pé.

Depois da cerimônia de pódio, com Vettel, Bottas e Raikkonen — exatamente os três primeiros na primeira volta, que acabaram nas mesmíssimas posições sem um atacar o outro em nenhum momento, exceto na largada, quando Sebastian passou o pole Valtteri –, Massa foi chamado ao local para saudar o público das tribunas e também a turma do Setor A que invadiu a pista para festejar o GP.

Com Barrichello: dois últimos vencedores

Subiu com o filho, Felipinho, e foi recebido por Rubens Barrichello, que assistiu à prova nos boxes da Mercedes. Ali estavam os dois últimos pilotos brasileiros que venceram na F-1. Massa ganhou pela última vez quando ainda era piloto da Ferrari, em Interlagos/2008. Rubens, e Monza/2009, pela Brawn. “Uma salva de palmas pro Felipe por tudo que ele fez pra gente”, pediu Barrichello ao público, antes de trocar algumas palavras com ele em inglês.

Massa, bem emocionado, agradeceu aos torcedores. “Amo vocês, vou sentir muita falta, o que vivi hoje foi uma emoção imensa, que não vou esquecer nunca”, disse. Antes, pelo rádio, recebera uma mensagem em inglês do filho, e desabafou gritando um “vamo, porra!“, depois de receber uma bandeira verde de um comissário, na falta de uma do Brasil. Estava valendo. “Foi uma corrida maravilhosa, depois de uma largada incrível. O resultado foi como uma vitória para mim”, completou.

Como era quase um GP amistoso, depois da conquista antecipada do tetra por Hamilton, Felipe acabou virando um dos personagens do dia. Talvez não o principal, porque afinal era uma corrida, e o vencedor sempre merece algumas palavras elogiosas — pronto, Vettel, sinta-se elogiado, especialmente pela largada que você mesmo definiu como “crucial” para chegar à quinta vitória no ano, 47ª na carreira. Outro, sem dúvida, foi Hamilton.

Na véspera, o inglês bateu na classificação e, por isso, teve de largar dos boxes. Era de se esperar uma prova interessante, com ultrapassagens em profusão e a busca por um pódio difícil, mas possível. Ontem mesmo o inglês já tinha traçado seus planos: “Vou me divertir o máximo que puder”.

Hamilton parte para cima de Verstappen: ultrapassagens fáceis

A escalada de Hamilton pode até parecer impressionante nos números ao longo da corrida, mas também não foi nenhuma epopeia, pela facilidade que encontrou em todas as ultrapassagens. De último para 16º na primeira volta, graças aos abandonos dos primeiros acidentados; na volta 7, P11; na nona, P10, a 12 segundos do líder Vettel. Mesmo com pneus macios — menos velozes que os supermacios da maioria –, foi subindo, subindo, até chegar ao sétimo lugar na 16ª volta, com Alonso e Massa na mira. Levou os dois tranquilamente pouco depois e, na volta 21, era quinto, atrás apenas de Vettel, Bottas, Raikkonen e Verstappen.

Seu ritmo era muito forte, e como tinha pneus mais duros, iria fazer seu pit stop depois de todos eles. O que o levou à liderança na 30ª volta, para espanto de muita gente. E foram sólidas 13 voltas na ponta, até fazer sua parada para colocar pneus supermacios, o que significava que faria um segundo stint bem veloz.

Lewis voltou dos boxes em quinto e começou a descontar a diferença que o separava de Verstappen muito rapidamente. Em dez voltas, da 44ª à 54ª, a vantagem do holandês caiu de 10s7 para 3s. Não tinha como segurar. Na 59ª, no meio da Reta Oposta, sem nem precisar disputar freada, passou por Max como se ele estivesse parado. Havia ainda uma chance de pódio, porque Raikkonen estava apenas 4s8 à frente.

Vettel: vitória tranquila e, reconheça-se, inútil

E Hamilton bem que tentou. Começou a emplacar voltas na casa de 1min11s até diminuir a diferença para 0s5 a cinco voltas do final. A ultrapassagem parecia inevitável. Só que o adversário era de certa estirpe, campeão mundial, experiente e gelado como sempre. Kimi não se assustou, não se apavorou, não se esgoelou e, simplesmente, se manteve na frente. “Meu ritmo era bom”, justificou.

Lewis acabou num ótimo quarto lugar, que se não chega a ser glorioso dado o equipamento de que dispõe, foi admirável pela diferença que o separou do vencedor Vettel: apenas 5s468. O que deixou o britânico da Mercedes bem feliz. “Me diverti muito”, afirmou.

Mas essa diferença também tem de ser relativizada. Quando o GP foi retomado após o safety-car na volta 5, ele era 14º e estava só 4s770 atrás do líder — o pelotão estava “achatado” pela intervenção do carro de segurança, outro sopro do destino que anulou a desvantagem de largar dos boxes. Essa diferença chegou a 17s824 na volta 21, a maior antes de seu pit stop. Depois da parada, bateu nos 18s323, na volta 44. Dali até o final, 27 voltas depois, ele conseguiu descontar 12s855 para Vettel, o vencedor, o que dá pouco menos de 0s5 por volta — nada de outro mundo, considerando os pneus que tinha.

De qualquer maneira, é algo que, do lado de fora, empolga o público. Ainda mais quando o sujeito sai de último para, ainda que só por algumas voltas, assumir a liderança. Por conta do esforço, Hamilton mereceu o voto do amigo internauta e foi eleito o Piloto do Dia. Depois dele fecharam a zona de pontos Verstappen, Ricciardo, Massa, Alonso, Pérez e Hülkenberg.

A torcida de Anitta: negócio é negócio, amigos à parte

Não foi exatamente um daqueles GPs do Brasil inesquecíveis, como o de 2016 e quase todos os que tiveram na chuva uma grande aliada no passado. O domingo foi luminoso, ensolarado, sem uma nuvem num céu azul de doer — bem diferente do sábado cinzento, úmido e gelado.  O público foi bom, vibrou com as manobras de Hamilton e aplaudiu Massa no final.

Ao contrário das corridas dos EUA e do México, marcadas por muitas atrações extrapista e cerimônias mirabolantes — algumas de gosto bem duvidoso, diga-se — estimuladas pelos novos donos da F-1, Interlagos viveu um dia mais discreto, que teve como maior atração pop a cantora Anitta, responsável pelo Hino Nacional antes da largada.

Agraciada com polpudo cachê da Renault, andou também num carro da marca pela pista e foi cercada por repórteres assim que chegou ao paddock. “Anitta, você vai torcer pro Hamilton, que é seu amigo, ou pro Felipe, que é brasileiro?”, perguntou uma delas. “Vou torcer pra Renault, é por isso que eu estou aqui”, respondeu.

Sinceridade é tudo. Gosto dessa moça.