Blog do Flavio Gomes
F-1

TOO BAD I’M LOSING A FRIEND (3)

RIO (um alento) – E não é que Kimi ligou o “foda-se”? E, graças a isso, não teve pentacampeão hoje nos EUA. A decisão ficou para domingo que vem no México. De lá não deve passar. Vamos agradecer ao “Iceman”, que se tornou o finlandês com mais vitórias na F-1, 21, e deixou seu país […]

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RIO (um alento) – E não é que Kimi ligou o “foda-se”? E, graças a isso, não teve pentacampeão hoje nos EUA. A decisão ficou para domingo que vem no México. De lá não deve passar. Vamos agradecer ao “Iceman”, que se tornou o finlandês com mais vitórias na F-1, 21, e deixou seu país com redondos 50 triunfos na categoria.

E que delícia de vitória, foi essa de Raikkonen em Austin. Ele merecia se despedir da Ferrari ganhando, cinco anos e meio depois da última vez em que ouviu o hino da Finlândia com uma taça na mão — na Austrália, em 2013, pela Lotus.

Ganhou na pilotagem e na estratégia que, desta vez, sorriu para a turma de Maranello, e não para a da Mercedes. E olha que nem parecia. Porque quando Hamilton deixou clara sua tática de duas paradas, elaborada às pressas graças a um safety-car virtual, deu a impressão de que iria acertar de novo. Só que no segundo pit stop tive a sensação de que os prateados escolheram os pneus errados. E aí a estratégia foi para o beleléu.

Raikkonen, porém, não se deixou abalar pela parada antecipada do #44. Logo depois da troca de Hamilton, ele deu a letra, como se diz, pelo rádio. Ao ser informado de que o adversário iria para duas paradas, o tagarela de gelo decretou, numa de suas mais longas sentenças na comunicação radiofônica com o time: “OK, mas não vamos fazer nada estúpido”. Parecia querer dizer: problema deles, não vão inventar nada agora, sei o que estou fazendo. Sabia mesmo.

Kimi mostrou a que vinha no domingo ensolarado de Austin logo na largada, partindo para cima de Hamilton nos primeiros metros, com um pneu mais aderente que o do inglês. Não tinha nada a perder e resolveu disputar a freada para a curva 1 sem medo de ser feliz. Lewis, claro, recuou. E a Ferrari #7 assumiu a ponta para ditar o ritmo da prova.

Vettel, responsável pelas últimas 13 vitórias da Ferrari na F-1, passou a ser um coadjuvante no Texas logo na segunda volta, quando mais uma vez se precipitou ao tentar uma ultrapassagem e se esfregou com Ricciardo tentando ganhar a quarta posição. Rodou e caiu para 15º, dando adeus a qualquer possibilidade de pódio.

Um dos que passaram por ele junto com a boiada foi Max Verstappen, 18º no grid, nono já na segunda volta. Assim, como um foguete, o holandês se colocou rapidamente no jogo, que para ele terminaria com uma brilhante segunda colocação num final de prova eletrizante.

O GP dos EUA, por conta disso, acabou sendo uma das provas mais interessantes do ano: táticas diferentes para dois pilotos lutando pela vitória — Raikkonen e Hamilton — e dois vindo lá de trás com fome e sede — Verstappen e Vettel.

Sebastian tratou de se recuperar logo, embora a distância para a turma da frente, no cronômetro, fosse intransponível. Foi até legal acompanhar seu esforço, mas as estrelas do dia eram outras. Quando Ricciardo quebrou — mais uma vez — na nona volta, o safety-car virtual foi acionado para que seu carro pudesse ser retirado do acostamento.

Demorou um pouco, dando chance aos mercêdicos de fazerem contas no pit-wall. Até que alguém gritou “eureca!” e resolveu chamar Hamilton para os boxes, na 12ª volta. Lewis estava em segundo, espetou pneus macios e voltou em terceiro, a apenas 10s da Ferrari de Kimi. Era uma ideia interessante. Praticamente anulava o pit stop extra em relação ao rival, desde que conseguisse, com pneus novos, se aproximar de novo e passar. Porque teria como fazer a última parte da corrida com pneus mais macios e velozes.

O plano parecia que iria dar certo. Já na volta 14 Hamilton passou Bottas e estava a 6s8 da liderança, descontando o tempo rapidamente. Na 17ª, a diferença era de 2s3. Na 21ª, já não existia. Então, Raikkonen parou. Como fizera o líder do campeonato, colocou pneus macios. Voltou em quinto, a 20s de Hamilton — que teria de parar de novo, mas tinha condições de ampliar a vantagem se impusesse um ritmo forte.

Ocorre que Lewis não abria. Lá de trás, Raikkonen começou a virar rápido, enquanto Hamilton sofria com bolhas em seus pneus. Em 15 voltas, a diferença caíra de 20s para 10s. Quando a Mercedes finalmente chamou seu piloto para o segundo pit stop, na volta 37, ele estava apenas 8s7 à frente do finlandês. Voltaria bem atrás, coisa de 12s, com pneus macios novamente — aí, para mim, o erro da Mercedes. Eram pneus 16 voltas mais jovens, verdade, só que não muito amigáveis, nem tão rápidos. E, além do tempo que o cronômetro não escondia, havia dois pilotos ainda entre ele e Raikkonen: Verstappen, num quase inacreditável segundo lugar de supermacios, e Bottas, que nem conta.

As últimas 15 voltas da corrida foram de cálculos e observações: tempos de volta de cada um, mais o estado da borracha que se degradava rapidamente para os três. Raikkonen se mantinha firme na ponta, mas Max se aproximava. Lewis vinha em terceiro com pneus novinhos, e tirava volta a volta. Até que, a cinco voltas do final, as diferenças entre eles mal passavam de um mero segundo.

Raikkonen, gelado como sempre, parecia nem olhar no espelho. Hamilton, babando, aproveitou uma escorregada de Verstappen na volta 54 e tentou o bote. Chegou a passar, mas Verstappen se defendeu e ao ver o segundo lugar escapando entre seus dedos gritou “ele não!”, e passou de volta. Com isso Kimi respirou e, finalmente, ganhou a primeira pela Ferrari desde a volta ao time, em 2014.

A comemoração foi como nos velhos tempos: nada de empolgação, nada de festa com mecânicos, nada de lágrimas, nada de euforia exagerada. Mandou um “obrigado” e um “finalmente” pelo rádio, tomou seu champanhe e foi cuidar da vida. Max se manteve em segundo com seu macacão de caubói e Hamilton, meio sem graça, terminou em terceiro, com Vettel em quarto — passou Bottas no fim.

Lewis foi a 346 pontos, contra 276 de Sebastian. São 70 pontos de vantagem, com 75 em jogo nas três últimas provas do ano. O alemão da Ferrari precisa vencer no México de qualquer forma para se manter vivo na disputa. Mas esse “se manter vivo” é apenas retórica. Na salinha antes do pódio, Max e Kimi perguntaram a Hamilton se ele tinha sido campeão. Não, não foi. Será campeão com um sétimo lugar no Hermanos Rodriguez, mesmo em caso de vitória de Vettel.

Não precisa perder o sono na noite texana.