Blog do Flavio Gomes
F-1

N’ANIVERSÁRIO (3)

RIO (caí do cavalo) – Isso porque escrevi ontem que a estratégia do Verstappinho de largar com pneus duros não ia dar em nada, que os dois carros da Mercedes sumiriam na frente, que ele lutaria no máximo por um terceiro lugar com Hülkenberg… Que bom errar de vez em quando. Mostra que, primeiro, não […]

RIO (caí do cavalo) – Isso porque escrevi ontem que a estratégia do Verstappinho de largar com pneus duros não ia dar em nada, que os dois carros da Mercedes sumiriam na frente, que ele lutaria no máximo por um terceiro lugar com Hülkenberg…

Que bom errar de vez em quando. Mostra que, primeiro, não se devem fazer previsões tão categóricas num esporte que tem gente tão competente trabalhando para melhorar o tempo todo, caso da Red Bull hoje em Silverstone, no GP dos 70 Anos. Segundo, que a F-1 ainda pode surpreender às vezes. Não será a regra até o fim do ano, claro, mas se de vez em quando alguém puder dar o pulo do gato em cima da Mercedes, é ótimo. E Max é esse alguém.

O primeiro pulo do gato de Verstappen foi dado ontem, no Q2, quando resolveu fazer sua volta rápida com pneus duros, para largar com eles e adiar sua primeira parada na prova. O segundo, na largada, ao não perder tempo com Hülkenberg para se colocar imediatamente atrás de Bottas e Hamilton, que partiram em primeiro e segundo. O terceiro, na volta 13. Já bem perto de Hamilton, que tinha pneus médios, Max recebeu a instrução para tomar cuidado com sua borracha. Retrucou: “Não vou guiar que nem a minha vó!”. O recado era claro. Seus pneus estavam bons, ainda, estava chegando na dupla da Mercedes e não faria sentido diminuir o ritmo.

Max com os médios por apenas algumas voltas: seus pneus duraram

Verstappen nem precisou passar ninguém para assumir a ponta pela primeira vez na corrida. Na mesma volta 13 Bottas foi para os boxes e trocou seus pneus médios para duros. Na seguinte, Hamilton fez o mesmo e o holandês ganhou a liderança. E foi levando. Enquanto a dupla da Mercedes se apavorava com bolhas assustadoras em seus pneus, Max era só elogios à borracha. “Tá tudo bem”, dizia ao time pelo rádio, enquanto construía uma vantagem segura para os rivais. Só foi parar na volta 27 para colocar médios, com os quais, se preciso fosse, levaria o carro até o final. Saiu dos boxes em segundo, atrás de Bottas e à frente de Hamilton, e nem deu tempo de piscar os olhos: passou o finlandês e retomou o primeiro lugar.

A Mercedes, então, tentou dar o troco chamando Bottas para os boxes para novos pneus na volta 33. A Red Bull nem pestanejou. Mandou Max parar também, para que os dois ficassem nas mesmas condições na fase final da prova. Ambos colocaram pneus duros e Verstappinho se manteve à frente. Hamilton, então, virou o novo líder. Mas tinha apenas uma parada.

A diferença de Lewis para Verstappen era de 11 segundos na volta 35. Em condições normais, ganharia a corrida. É dificil tirar 11s de Hamilton em 17 voltas. Só que ninguém acreditava que o inglês seria capaz de ir até o fim com seus pneus em petição de miséria. Ele até que aguentou algumas voltas, mas o medo de um estouro, como na semana passada, foi maior do que a ousadia de tentar completar a corrida daquele jeito. Na volta 41 parou de novo, voltou em quarto a 12s do novamente líder Verstappen, passou Leclerc na 45ª volta, foi para cima de Bottas, que tinha pneus bem piores àquela altura, passou o companheiro de equipe na volta 50 e já não havia mais nada a fazer. Lá na frente, Max se divertia com o time fazendo piadas pelo rádio e, assim, chegaria à sua primeira vitória no ano e nona na carreira, tirando a invencibilidade da Mercedes na temporada.

O pole Bottas, terceiro na corrida, com Hamilton: “A equipe dormiu no ponto”, reclamou

Foi uma vitória espetacular, construída com esmero, inteligência, estratégia e, sobretudo, muito talento. Diante dela, o novo recorde igualado por Hamilton — 155 pódios na F-1, como Michael Schumacher — perdeu um pouco do brilho. “Temos de analisar tudo para saber o que aconteceu”, falou o inglês, meio contrariado com a derrota inesperada. Ele se referia à profusão de bolhas nos seus pneus e nos de Bottas, que enfrentou os mesmos problemas durante a corrida e terminou em terceiro. “Para quem largava na pole, claro que foi uma frustração”, disse Valtteri. “A equipe hoje dormiu no ponto.”

Leclerc foi o quarto e merece muitos aplausos, por conseguir fazer a corrida toda com apenas uma parada e tirar da Ferrari muito mais do que o carro pode dar. Foi uma de suas provas mais consistentes na categoria, disputada com sabedoria e paciência. Albon terminou em quinto — e teve trabalho, depois de um início de prova complicado — e a dupla rosa da Force Martin acabou decepcionando, com Stroll em sexto e o incrível Hulk em sétimo. Ambos sofreram muito com os pneus. E pelo menos nisso acertei ontem, ao mencionar o ritmo de corrida da equipe — que tem sido muito pior do que na classificação. Ocon, Norris e Kvyat fecharam a zona de pontos, e aqui vale uma menção honrosa ao russo, espinafrado por este escriba ontem, mas que conseguiu um pontinho muito digno — Gasly, que largou bem à sua frente, nem pontuou. Na classificação, Hamilton mantém 30 pontos sobre o vice-líder. Só que agora este é Verstappen, e não Bottas: 107 x 77. Sapattos tem 73. Fico imaginando como seria de Max não tivesse tido problemas na primeira corrida do ano, que zerou. Sei lá, uns 15 pontinhos. Estaria na cola de Lewis. Esse menino, com todo respeito, é foda.

Pit stop da Racing Martin: Stroll e Hulk sofreram na corrida e decepcionaram

No mais, acho que vale a pena dizer que Ricciardo foi outro que desapontou depois de se destacar nos treinos — sobre ele falaremos amanhã no nosso rescaldão –, que a McLaren não está conseguindo repetir as boas atuações do início do campeonato e que o dono da Force Martin, Lawrence Stroll, está pistola com as acusações contra seu time — que seria o terceiro colocado hoje entre os construtores com 56 pontos, à frente de Ferrari (55) e McLaren (53) nessa briga boa pelo título de “melhor do resto”, já que Mercedes e Red Bull estão bem à frente.

E temos de relatar o que aconteceu com Vettel, claro.

Vettel à frente de Leclerc: “Nossa estratégia não fez o menor sentido”

Putz. Putz. Putz. Vettel rodou sozinho na primeira curva na primeira volta! Caiu para último, e aí foi se recuperando do jeito que dava, para terminar em 12º. Está dando pena do alemão. O ambiente na equipe se deteriorou, as estratégias de pneus são invariavelmente equivocadas — o piloto disse que, hoje, a que escolheram para ele “não fazia o menor sentido” –, está guiando mal, comete erros grotescos, e seu ano se transformou num calvário que só terminará quando o Mundial se encerrar — não se sabe quando, ainda.

É óbvio que diante desse quadro tive de ligar para Gola Profonda, meu espião em Maranello, que ontem me deixou na mão — enquanto eu esperava um telefonema, vi que postou umas fotos num pub de Towcester em suas redes sociais, furando a quarentena e arriscando seu emprego e minhas informações exclusivas.

Hoje, para evitar novas falhas de comunicação, nos falamos imediatamente depois da corrida. Como está Seb?, perguntei, sugerindo uma intimidade com Vettel que jamais tive. “Seb? Ui ui ui”, respondeu Gola por um novo aplicativo de mensagens que estamos usando, totalmente criptografado, impossível de ser rastreado, chamado “MyCheque” — usamos a versão “Keyróz 2.0”, das mais seguras. Vai logo, rapaz, tenho coisa para fazer, reclamei, e ele engatou uma sequência meio desconexa de frases. “Seb, como você chama seu amiguinho, nem passou pelos boxes. As câmeras de segurança flagraram ele [nota minha: Gola não sabe usar pronomes direito] com um cara daquela equipe rosa indo para a fábrica que fica do outro lado da rua. Saiu de lá com um banco debaixo do braço e depois as câmeras flagraram ele no box daquela equipe rosa arrancando o banco do carro do Hülkenberg e colocando o novo e dizendo que domingo que vem vai correr lá e dane-se.” Oxe, exclamei. “Oxe?”, ele perguntou. Não é nada, é só espanto. E daí, o que aconteceu? “Ele mandou uma mensagem para o Sainz pelo WhatsApp que a gente interceptou.” E o que dizia essa mensagem?, fiquei curioso. “Ele mandou pro Sainz uma foto do nosso carro do ano que vem, ainda sem a pintura, e estão todos putos com ele na equipe por vazar segredos industriais. Vai dar rolo.” Você tem essa foto?, pedi, mais curioso ainda. “Está aí.”

A nova Ferrari, segundo Gola Profonda: será que vai?

Depois disso não nos falamos mais.