Blog do Flavio Gomes
F-1

NÃO ENCHE O SAKHIR (2)

SÃO PAULO (fervendo) – Leiam a tuitada da Mercedes abaixo: Ah, tá bom! Me engana que eu gosto, como dizia não sei quem. Quem dizia me engana que eu gosto? Era alguma música? Escrevi ontem, num final apoteótico do textão da sexta, que a moleza acabou. Na F-1, todo mundo mente. Mas o cronômetro, não. […]

SÃO PAULO (fervendo) – Leiam a tuitada da Mercedes abaixo:

Mercedes contente com o adversário? Sei…

Ah, tá bom! Me engana que eu gosto, como dizia não sei quem. Quem dizia me engana que eu gosto? Era alguma música?

Escrevi ontem, num final apoteótico do textão da sexta, que a moleza acabou. Na F-1, todo mundo mente. Mas o cronômetro, não. Verstappen fez a pole para o GP do Bahrein com uma folga de 0s388 para Comandante Amilton, o segundo colocado. Foi a quarta da carreira dele. A primeira da Red Bull numa abertura de temporada desde 2013 — com Vettel, na Austrália. E a primeira da Honda em corrida inaugural de um Mundial desde 1991, com Senna no GP dos EUA, em Phoenix.

Mais uma: desde 2014, só a Mercedes fazia pole na abertura do campeonato. Todas de Hamilton, menos a do ano passado, que foi de Bottas, na Áustria.

O jogo virou, não é mesmo?

Verstappen: quarta pole na carreira

E isso é bom. A Mercedes vai levar um tempo para entrar nos eixos. Christian Horner, chefe rubro-taurino, chamou a atenção para um fato que não deve ser desprezado. Todo mundo dava (ou torcia para) a equipe preta-prata como descartada, fim de uma era, aquelas coisas, mas rapidamente já houve uma reação. “Eles já estão lá”, falou.

É uma meia-verdade, ou meia-mentira — como queiram. De fato, dois carros da Mercedes estão entre os três primeiros. Para quem fez uma pré-temporada tão ruim, deu para ver que o trabalho na fábrica nos últimos dias foi intenso e já mostrou resultados. É a meia-verdade. Porque dizer que já estão lá é uma meia-mentira. A diferença de Lewis para a pole foi gigantesca, ainda mais quando se ouve dele que tirou o máximo que podia do carro. Sapattos ficou ainda mais longe: 0s589.

Os tempos estão aí embaixo. Cronômetro não mente.

O grid para o GP do Bahrein: Max estraçalhou a concorrência

Na noite quente e seca barenita, 30°C na hora da classificação, Max confirmou o domínio imposto em todas as sessões desde ontem. No último treino livre, ainda sob o sol inclemente do deserto, enfiou 0s7 em Hamilton, o segundo. Só perderia a pole se cometesse algum erro. Não cometeu.

O Q1 foi legal, com a primeira grande surpresa do dia: Tsunoda em segundo. A transmissão da F-1 informou que ele é o primeiro piloto nascido nos anos 2000 a disputar um GP de Fórmula 1. Nasceu em 11 de maio do primeiro ano deste milênio desgraçado. Não é o mais jovem a largar, porém. Essa primazia ainda é de Verstappen.

Outros três pilotos se destacaram na primeira parte da classificação: Alonso, El Fodón Azulón, da Alpine, em sétimo; Giovanudo, da Alfa Romeo, em nono; Jorginho Russell, da Williams, em 13º. Menino bom, esse Jorginho.

Tsunoda: P2 no Q1

Os degolados foram L’Ocon (a cada ano que passa, mais opaco), Lentifi, Tião Verdão, Schumaquinho e Mal-zepin. (Ah, para com esses apelidos! Não paro.)

Claro que a grande decepção foi Vettel, em 18º. A explicação foram bandeiras amarelas na hora em que tentou sua volta rápida. Sei não… Vamos dar a ele o benefício da dúvida, por enquanto. Mas que sua trajetória na Aston Martin começou meio pedregosa, disso não há dúvidas.

Alonso: nono no grid na volta

O Q2 teve quatro equipes optando por fazer tempos com pneus médios, para esticar o primeiro stint amanhã. É preciso alguma confiança para espetar borracha mais lenta nessas horas. Nos últimos tempos, Mercedes e Red Bull sempre fizeram isso, e repetiram. A novidade foi ver McLaren e AlphaTauri optando pela mesma estratégia.

Todos se deram bem, exceto Tsunoda, que acabou apenas com a 13ª posição. Como vamos chamar Tsunoda? Aceitamos sugestões. O japonês do novo milênio disse que não entendeu por que seu carro perdeu tanta aderência com os médios. Lição número 1 para a vida: isso acontece. Vai olhar a telemetria que ela explica.

Ficaram no Q2 Pérez (ainda apanhando um pouco de um carro feito desde a manjedoura para Verstappinho guiar), Giovinazzi, o já mencionado Tsunoda, mais Raikkonen e Russell. Surpresa, aí, a degola de um carro da Red Bull, claro. Mas, como Vettel, Pérez ainda tem a justificativa do noviciado na equipe. A curva de adaptação é mais rápida para uns, mais lenta para outros.

Norris: McLaren tranquila no Q3

Três equipes levaram seus dois carros ao Q3: Mercedes, Ferrari e McLaren. As outras quatro vagas foram distribuídas entre Red Bull, AlphaTauri, Alpine e Aston Martin.

Olha o Gás-ly! fez um tempo que me impressionou logo de cara, 1min30s014, mas Hamilton o superou em seguida com uma volta em 1min29s549, botando alguma pressão em Verstappen. O holandês deu o troco na hora, 0s023 mais rápido. A diferença, irrisória, pode ter iludido os torcedores da Mercedes. Mas ela seria ampliada na segunda volta rápida, com o temporal que garantiu a pole a Max.

Bottas, que só tinha um jogo novo de pneus macios, terminou em terceiro. Leclerc foi o quarto, a 0s681 de Max. Charlinho reagiu bem às seguidas sessões atrás de Sainz, que chegou agora à Ferrari. Os dois pilotos, aliás, só fizeram uma volta no Q3, por escassez de macios. Alonso e Stroll também tiveram apenas uma chance.

O quinto foi Gasly, que melhorou seu tempo da primeira saída e mostrou que a antiga Toro Rosso será protagonista no segundo pelotão neste ano — a Honda tem um papel importante nisso, o carro nasceu bem, os pilotos são muito interessantes.

Gasly, quinto no grid: Honda e AlphaTauri, tudo a ver

A McLaren se colocou logo atrás de Pierre, com Ricardão em sexto e Chuck Norris em sétimo. Esses foram o que se classificaram a menos de um segundo de Verstappen. Sainz, Alonso e Stroll, que fecharam os dez primeiros, ficaram um pouco mais distantes no relógio.

Logo depois da entrevista dos três primeiros colocados ainda na pista, conduzida por David Coulthard, vimos a cena mais divertida do dia. O escocês faz 50 anos hoje. Depois das perguntas de praxe a Verstappen, Hamilton e Bottas, ele viu o holandês vindo em sua direção com um bolinho de aniversário e abriu um sorriso.

O resultado:

Max: bolo na fuça de Coulthard

É ótimo que a temporada comece assim. Garantia de disputa, porque a Mercedes sabe que está atrás, mas sabe também que a jornada é longa prevista para 23 etapas — digo “prevista” porque acredito que a pandemia fará vítimas no calendário. E tem tempo para dar a volta por cima.

Horner tem alguma razão quando detecta uma reação rápida de seus adversários entre a pré-temporada e a primeira classificação do ano. Mas quanto a Mercedes vai conseguir melhorar? E a Red Bull? Tem alguma sobra? Talvez. Max fez a pole com o assoalho de seu carro ligeiramente danificado. Esses quase quatro décimos de segundo sobre Hamilton poderiam ser um pouco mais. A diferença é grande. Que os mercêdicos corram atrás. A gente fica aqui assistindo de camarote.

Red Bull: será que tem mais para tirar desse carro?

Falemos agora da TV. Depois de 40 anos, foi a primeira definição de um grid na F-1 transmitida para o Brasil por uma emissora não pertencente ao grupo Globo. Participaram o narrador Sérgio Maurício, os comentaristas Reginaldo Leme e Felipe Giaffone e a repórter Mariana Becker.

Não percebi muita diferença entre o que se fazia no outro canal, o que é natural. Afinal, todos eles vieram do mesmo lugar. Notei que nas redes sociais muita gente falou sobre o clima descontraído, que todos estavam mais soltos etc. Também acho um exagero. Sérgio Maurício conduzia suas transmissões da mesma forma no SporTV.

De bom, o fato de a transmissão só ser encerrada depois das entrevistas, com comentários de todos e a sensação de que ela teve começo, meio e fim bem definidos. Não fosse isso, inclusive, não teríamos visto o bolo na cara de Coulthard. Na Globo, os caras pareciam loucos, correndo para encerrar a transmissão um segundo depois de definida a pole, como se tivesse estourado a Terceira Guerra Mundial e William Bonner estivesse a postos no estúdio para dar a notícia — e no fim o que vinha depois da F-1 era apenas mais alguma partida chata de algum esporte aborrecido. Nunca entendi a pressa.

Os três no estúdio pareciam à vontade — Sérgio talvez tenha começado um pouco nervoso, trocando alguns nomes, mas nada comprometedor — e foram se entrosando na medida em que as coisas aconteciam na pista. No balanço geral, uma transmissão correta, honesta, que satisfez os fãs.

F-1 na Bandeirantes: transmissão correta, mas sem audiência

Problema para a Bandeirantes, porém, é a audiência. Pelo que vi nos índices prévios divulgados, o canal oscilou entre 1,8 e 2,6 pontos no Ibope na Grande São Paulo, enquanto a Globo, com seu programa de bricolagem, se mantinha estável na casa dos 14 pontos. Isso explica, talvez, o fato de a emissora do Morumbi ter vendido até agora apenas uma cota publicitária para a cobertura da temporada, para a operadora de celular Claro.

É um caminho longo para gerar receita e audiência, que exigirá resiliência e paciência dos envolvidos. A F-1 fora da Globo, como negócio, perde muito — como o futebol.