Blog do Flavio Gomes
F-1

MARRUÁ RING (3)

SÃO PAULO (quase zebra) – Mesmo com dificuldades técnicas no fim, um pedal de acelerador “enroscado”, Charles Leclerc reverteu o favoritismo da Red Bull e venceu o GP da Áustria na casa dos rivais. Max Verstappen ficou em segundo. Lewis Hamilton fechou o pódio numa tarde em que as equipes dominantes da temporada tiveram abandonos: […]

Ferrari vira o jogo e ganha na casa da Red Bull: domingo vermelho

SÃO PAULO (quase zebra) – Mesmo com dificuldades técnicas no fim, um pedal de acelerador “enroscado”, Charles Leclerc reverteu o favoritismo da Red Bull e venceu o GP da Áustria na casa dos rivais. Max Verstappen ficou em segundo. Lewis Hamilton fechou o pódio numa tarde em que as equipes dominantes da temporada tiveram abandonos: Pérez no início pela Red Bull e Sainz no final, com o motor da Ferrari quebrado quando lutava pelo segundo lugar.

Foi a quinta vitória da carreira de Leclerc, terceira no ano, primeira que ele conquista sem ter largado na pole — era segundo no grid. Verstappen segue tranquilo na liderança do Mundial, embora um sinal amarelo tenha acendido na equipe austríaca. Depois de seis vitórias seguidas, o time amargou a segunda derrota consecutiva para os italianos. “Foi um dia difícil, a gente teve dificuldades com os pneus a corrida inteira. Mas segundo lugar é um bom resultado, nessas circunstâncias”, disse o holandês que, ontem, venceu a Sprint com facilidade. O placar aponta, agora, 208 x 170 para ele na tabela de classificação. Charles retomou a vice-liderança, que estava com Pérez. O mexicano caiu para terceiro com 151.

Falemos da corrida, pois.

Russell: remando de penúltimo até a quarta posição final

A Mercedes, apesar dos acidentes de sexta-feira, não precisou trocar nada “punível” e foi à luta no GP com algumas gambiarras nos carros de Hamilton e Russell. Quem precisou mexer demais nos automóveis foram Alfa Romeo — Bottas largou dos boxes — e Alpine — Alonso partiu da última posição. No grid, apenas quatro pilotos escolheram os pneus duros para esticar a primeira parada o máximo possível – Zhou, Tsunoda, Vettel e Alonso. Os demais foram de médios.

Verstappen largou muito bem e trouxe com ele os dois carros da Ferrari. Quem precisou se defender muito foi Russell, atacado por Pérez desde os primeiros metros. O mexicano quis resolver a corrida na primeira volta, acabou tocando no inglês e rodou. Caiu para último, foi para os boxes e abandonaria a prova pouco depois. Os comissários entenderam que Jorginho foi o culpado pelo toque e aplicaram nele uma multa de 5s que seria paga no pit stop. Quando o fez, caiu para penúltimo e teve de se virar naquilo que Galvão Bueno chamava de “corrida de recuperação”.

Leclerc na luta: equipe lidou bem com os pneus e venceu

Hamilton x Schumacher, quem diria, foi o primeiro bom duelo do dia, repetindo o que havia acontecido na Sprint, na véspera. Logo na quinta volta, Lewis deu uma rabeada na zebra e o jovem Mick não teve muito respeito por seus cabelos brancos, não… Foi lá e passou, assumindo o sétimo lugar.

Na nona volta, Verstappen e Leclerc já haviam se descolado do resto em primeiro e segundo. Sainz aparecia solitário em terceiro e Russell puxava um trenzinho a partir do quarto lugar com Ocon, Magnussen, Schumacher e Hamilton nas oito primeiras posições. Lewis, pelo rádio, dizia espantado: “A velocidade de reta deles é uma loucura!”. Falava da Haas.

Com a possibilidade de abrir a asa móvel, Charlinho partiu para cima de Max na décima volta. Chegou a colocar seu carro à frente, mas o holandês se recuperou e deu o troco. “Não sei se vou conseguir segurar, não”, disse o piloto da Red Bull pelo rádio. O monegasco seguiu fustigando o rival. Na volta 12, mergulhou para cima dele e consumou a ultrapassagem. Foi a primeira das três que faria sobre o rival. Assumiu a ponta com garbo e elegância.

Verstappen com problemas para segurar Leclerc: não conseguiu

No mesmo momento, Russell foi para os boxes, pagou a punição, trocou o bico danificado no toque com Pérez e despencou lá para o fundão, penúltima posição. Na volta 14, Verstappen antecipou sua primeira parada e colocou pneus duros, insinuando uma estratégia de dois pit stops. Voltou em oitavo. Estava tendo mais problemas com a borracha do que esperava, numa corrida em que pintava como franco favorito à vitória.

Um pouco mais atrás, Hamilton finalmente se livrou dos dois carros da Haas e assumiu a terceira posição na volta 16. Mais gente começou a parar, mostrando que os pneus estavam durando menos do que se imaginava.

Verstappen, com pista livre, começou a virar bons tempos. Rapidamente chegou em Hamilton e precisou de duas curvas para passar o inglês, levantando as arquibancadas. A conta da Red Bull era simples: Max precisava reduzir sua diferença para Leclerc, o líder, para menos de 20s. Conseguindo, retomaria a ponta quando a Ferrari chamasse o #16 para os boxes, o que já estava demorando um pouco, dando a entender que o time vermelho faria apenas uma troca. Mas seria, como veremos adiante, apenas impressão.

Parada de Sainz: tudo indicava uma dobradinha

Na volta 27, apenas, Charlinho fez seu pit stop. Voltou em terceiro, porque Max já tinha dado uma espancada no cronômetro com pneus mais novos, abrindo uma vantagem superior a 6s sobre o monegasco. Sainz trocou seus pneus na volta seguinte. Hamilton, na 29ª – o último da turma da frente a parar os boxes; uma parada ruim que o devolveu à pista atrás de Ocon.

Na volta 30, Verstappen liderava, como a Red Bull imaginou, mas os pneus mais gastos já começavam a perder rendimento. Leclerc, de borracha nova, llegaba y llegaba: 2s2 na volta 31. Sainz aparecia distante em terceiro e Hamilton em quarto, depois de passar o francês da Alpine.

Charles retomou a ponta na volta 33 sem que Max oferecesse resistência. “O carro está imprevisível”, queixou-se o líder do campeonato pelo rádio. A equipe vivia momentos tensos. Pouco antes, Pérez havia abandonado. Depois de perder a primeira posição, Verstappen olhou pelo retrovisor e viu Sainz se aproximando. Foi a senha para fazer o segundo pit stop, colocando pneus duros novamente. Era a volta 37. Seus pneus para a parte final da corrida eram dez voltas mais novos que os da Ferrari, caso o monegasco não parasse mais. E ele estava, de novo, 20s atrás do líder.

A corrida era muito boa no meio do pelotão, com disputas intensas entre carros da McLaren, Aston Martin, Alpine, Haas e Alfa Romeo — todos trocando de posições freneticamente. As diferenças de estratégia – basicamente ligadas ao momento das trocas de pneus – faziam com que os pilotos se encontrassem em condições distintas e, assim, o passa-repassa divertia o público.

Na volta 49, surpresa para os que achavam que a Ferrari faria apenas um pit stop: Leclerc nos boxes. Voltou em terceiro, pouco mais de 3s atrás de Verstappen e, agora, com pneus 12 voltas mais novos. Sainz parou na volta seguinte, atrás do companheiro. Na verdade, ninguém aguentaria as 71 voltas da corrida com uma única parada — ainda que a Pirelli afirmasse, antes da prova, que um pit stop seria a estratégia mais rápida para o GP.

Leclerc colou em Verstappen na volta 52 sem nenhum esforço. Abriu a asa e passou na 53ª. Era dia da Ferrari, mesmo. A preocupação de Max passava a ser Sainz, que vinha em terceiro com pneus novos. Mas Ferrari é Ferrari, né? Na volta 57, o espanhol embutiu no #1 e, quando ia passar, seu motor quebrou. “Não, não, não!”, lamentou o espanhol. Seu carro começou a pegar fogo. Houve uma certa confusão para que ele saísse do cockpit, com o carro solto num aclive, em movimento. Mas acabou tudo bem – exceto pelo abandono.

Com o safety-car virtual acionado, a Ferrari chamou Leclerc correndo para colocar pneus médios, prevendo que a Red Bull faria algo parecido. E fez. Ambos nos boxes, 12 voltas para o fim, diferença entre líder e vice-líder na casa dos 5s.

A prova foi reiniciada na volta 60. Para desespero dos torcedores ferraristas, Leclerc entra no rádio e diz que seu pedal de acelerador está “estranho”. A equipe respondeu que estava tudo bem. Mais um pouco, e Charles: “O que está acontecendo com o acelerador?”. Verstappen foi avisado: “Olha só, o cara lá tá com umas paradas estranhas no acelerador”.

Era a única chance de vitória para o holandês, um problema técnico com a Ferrari #16. A equipe relatou que o pedal às vezes não voltava a 0% quando ele tirava o pé. Fosse de acionamento por cabo, como em carros convencionais, diríamos que estava “enroscando”. Mas não são carros convencionais, os de F-1. Com o acelerador “enroscando”, as reduções de marchas se tornaram problemáticas. Max estava 3s atrás, ainda. Começou a descontar a diferença, mas a prova estava muito no fim. Leclerc abriu a última volta com 2s de vantagem para o holandês. Foi o bastante para receber a quadriculada 1s532 na frente. Hamilton, Russell, Ocon, Schumacher, Norris, Magnussen, Ricciardo e Alonso completaram a zona de pontos.

Final na Áustria: recuperação da Ferrari

O pódio foi festivo, com Leclerc aliviado por voltar a vencer depois de três meses — a última fora na Austrália, em abril. Verstappen se conformou com o segundo lugar e Hamilton festejou seu quarto troféu na temporada. Outras equipes também comemoraram, como a Haas com seus dois pilotos nos pontos, assim como McLaren e Alpine.

Schumacher, em sexto, obteve o melhor resultado de sua carreira. Alonso, em décimo, lamentou apenas ter de fazer uma terceira parada não prevista, porque depois da segunda seu carro passou a vibrar muito. “Foi uma das minhas melhores corridas, daria para terminar em sexto se não fosse esse pit stop extra”, disse o espanhol.

Para quem esperava um passeio de Verstappen em casa, caso deste que vos escreve, a corrida acabou saindo melhor que a encomenda. E não atirou ninguém na Red Bull a um estado de depressão profunda. Como disse Max ao final da contenda, a diferença que o separava de Leclerc na classificação caiu apenas cinco pontos, agora com uma prova a menos na longa temporada que chegou à metade. Faltam 11, ainda.

Um total de 303 mil ingressos foram vendidos pelos organizadores para os três dias do evento. Muitos deles para holandeses que tingiram o autódromo de laranja. Mas nem tudo foi festa. Pela manhã, diversas torcedoras relataram em suas redes sociais casos de abuso, assédio, homofobia, racismo e misoginia por parte de fãs de Verstappen nas arquibancadas e áreas comuns do autódromo. As reclamações chegaram aos dirigentes, e muitos pilotos e equipes se manifestaram sobre o tema. Será o assunto de minha coluna no UOL que, amanhã, coloco aqui. E, também, do “Fórmula Gomes” às 19h em meu canal no YouTube.