Blog do Flavio Gomes
F-1

CIAO, BELLO

SÃO PAULO (acontece, mas só na Ferrari) – Mattia Binotto caiu, como qualquer bom técnico de futebol “prestigiado” pela diretoria antes de ser demitido. Hoje pela manhã a Ferrari emitiu um comunicado com as palavras de agradecimento de sempre para informar que o suíço (que tem nacionalidade italiana) deixa o cargo e a equipe em […]

Mattia Binotto: como no futebol

SÃO PAULO (acontece, mas só na Ferrari) – Mattia Binotto caiu, como qualquer bom técnico de futebol “prestigiado” pela diretoria antes de ser demitido. Hoje pela manhã a Ferrari emitiu um comunicado com as palavras de agradecimento de sempre para informar que o suíço (que tem nacionalidade italiana) deixa o cargo e a equipe em 31 de dezembro.

É duro para Binotto, 28 anos de casa, que desde molequinho sonhava em trabalhar em Maranello e conseguiu. Chegou em 1995, fez parte, como engenheiro de motores, daquele timaço montado por Jean Todt a partir de 1993, e em 2013 assumiu o comando dessa área na equipe. Em 2016, foi promovido a diretor-técnico. Em 2019, virou chefe geral, assumindo o lugar do ex-vendedor de cigarros Maurizio Arrivabene.

Binotto foi o quarto chefe de equipe da Ferrari desde o início da era híbrida, o que evidentemente não é algo que funcione num esporte tão sofisticado e complicado como a F-1. Antes dele, desde 2014, estiveram na função Stefano Domenicali, Marco Mattiacci e Arrivabene. Como comparação, as duas equipes dominantes da categoria, Red Bull e Mercedes, têm seus chefes no cargo desde 2005 (Christian Horner) e 2013 (Toto Wolff). Estabilidade — parece clichê, mas é assim — é algo essencial no mundo das corridas. Não dá para ficar trocando de técnico toda hora, a cada derrota em casa para um XV de Jaú da vida.

Binotto não vinha fazendo um trabalho desastroso, longe disso. Assumiu o manche da Ferrari em 2019 num rabo de foguete, foi vice-campeão de construtores, mas viveu um momento delicado na segunda metade do campeonato até hoje mal explicado. A equipe foi pega na mentira, como diria nosso Erasmo, e descobriu-se alguma irregularidade motorística que poderia ter rendido multa e/ou punição pesadíssimas.

A FIA passou uma flanela e ninguém sabe exatamente o que a Ferrari estava fazendo de errado, mas deve ter sido algo grande, porque em 2020 o time fez um campeonato pavoroso, terminando o Mundial em sexto lugar — atrás de Mercedes, Red Bull, McLaren, Racing Point e Renault. Um vexame.

Mas aí Binotto começou a colocar ordem na casa, subiu para terceiro no ano passado e para o vice nesta temporada. Um ano que teve início auspicioso, com duas vitórias nas três primeiras corridas e um vislumbre de título, quem sabe…

Só que a maionese desandou. Uma sequência de erros de estratégia, quebras e trapalhadas dos pilotos foi empurrando a Ferrari para o abismo — que no caso, atualmente, é não lutar para ser campeã de nada. Junte-se aos maus resultados de pista um ambiente político quase sempre tóxico, que parece só ter funcionado nos anos de glória de Todt, Ross Brawn, Schumacher & cia. A Ferrari vive em ebulição. Binotto foi alçado ao cargo por Sergio Marchionne, que morreu em 2018. O novo CEO da companhia, Louis Camilleri, gostava dele, mas no fim de 2020 pegou o boné e foi embora. John Elkann, presidente da empresa e herdeiro de Gianni Agnelli — a Ferrari ainda é um negócio de família, embora tenha acionistas de todos os cantos –, nomeou como seu sucessor Benedetto Vigna, um sujeito que ganhou fama e fortuna como inventor de sensores para airbags. Elkann não é fã de Binotto. Vigna nem sabe direito quem é Binotto.

Em 2022, a Ferrari conseguiu quatro vitórias, 12 poles e 20 pódios. A última vitória aconteceu em julho na Áustria, com Leclerc. O monegasco, dizem os fofoqueiros da imprensa italiana, não conversa com Binotto desde o GP da Inglaterra, não manda mensagem nem curte suas fotos no Instagram. Também teria tido algum peso na demissão do chefe — que, oficialmente, pediu para sair numa “decisão dura”, segundas suas próprias palavras.

Sucessor? A equipe vai ter de cortar um dobrado, porque precisará não só de um chefe para ficar sentadinho no pitwall apertando botões e falando pelo rádio, como também de um novo diretor-técnico, já que Binotto acumulava as funções. Esse cargo talvez seja mais difícil de preencher que o outro, e alguém de dentro da estrutura deve ser promovido. Para boi-de-piranha, dar entrevistas, assumir as derrotas e comemorar as vitórias, o principal candidato, neste exato instante, é o francês Frédéric Vasseur. Ele é o chefe da Alfa Romeo e já trabalhou com Leclerc nos primeiros anos do piloto na F-1. Antes, montou a ART com Nicolas Todt e foi campeão da GP2 com Rosberg e Hamilton. Depois, fundou a empresa que até hoje faz os chassis da Fórmula E, a Spark. Também chefiou a Renault na F-1. E é acionista da Sauber, que toca a operação da Alfa e, a partir de 2026, levará no bico as quatro argolas da Audi.

Um chamado da Ferrari é sempre atraente, mas Vasseur não está desesperado atrás de emprego. Dependendo das negociações com a Audi, pode assumir o papel de liderança do projeto alemão na F-1, um trabalho de longo prazo. Em Maranello, pode durar bastante — ninguém sabe. Mas, também, pode cair em dois meses se perder para o Noroeste de Bauru. Mesmo jogando melhor, metendo cinco bolas na trave e tendo dois gols anulados injustamente.

Tem gente falando em Ross Brawn, que vai deixar a Liberty e o comando técnico da F-1. Uma espécie de sebastianismo italiano. Não se deve descartar. Mas não é muito prudente fazer apostas certeiras, agora. Melhor esperar pela fumacinha vermelha que anuncia “habemus chefus” em Maranello.