Blog do Flavio Gomes
F-1

AUSSIES (3)

SÃO PAULO (vai um café?) – Às vezes Max Verstappen dá a impressão de que não sabe brincar. O holandês não ficou na ponta em nenhum treino para o GP da Austrália, longe disso. Desde ontem à noite, o máximo que fez foi ciscar perto das primeiras posições, sem assustar a concorrência. Enquanto isso, desenhava-se […]

Verstappen, mais uma pole: massacre continua

SÃO PAULO (vai um café?) – Às vezes Max Verstappen dá a impressão de que não sabe brincar. O holandês não ficou na ponta em nenhum treino para o GP da Austrália, longe disso. Desde ontem à noite, o máximo que fez foi ciscar perto das primeiras posições, sem assustar a concorrência. Enquanto isso, desenhava-se um certo favoritismo da Ferrari — só para a classificação, que fique bem claro. Afinal, o time italiano tem um carro reconhecidamente rápido para voltas lançadas, e andou bem nos treinos. Assim, era justo colocar seus dois pilotos pelo menos na condição de candidatos à pole-position em Melbourne.

Mas a ilusão dos adversários do #1 da Red Bull, ultimamente, dura muito pouco. Na hora em que precisou acelerar, Verstappen acelerou. Foi, claro, no Q3, a última parte da sessão que definiu o grid para a terceira etapa do Mundial de F-1. Fez a pole, mais uma. Deixou a Ferrari para trás, a ver cangurus. Segue invicto em 2024 – ganhou as duas primeiras corridas e fez a pole nas três. Se vencer amanhã no Albert Park, chegará a dez vitórias consecutivas igualando a maior série da história, que é dele mesmo – registrada no ano passado entre os GPs de Miami e Monza.

Está chato? Depende do ponto de vista. Ver Max pilotando, para quem gosta de corridas, é um deleite. O rapaz beira a perfeição, não comete erros, faz tudo com uma naturalidade irritante. Trucida os rivais com requintes de crueldade, como diziam os antigos cronistas policiais. Seu talento se funde à qualidade do RB20, uma obra-prima de engenharia.

RB20 em ação: obra-prima da Red Bull

Sim, seria mais legal se houvesse mais disputa, mais competição. Mas se não há, a culpa não é de Verstappen. Tampouco da Red Bull. As outras equipes e pilotos, sejamos sinceros, estão devendo. Assistem passivamente a um domínio que parece determinado por algum desígnio divino, e portanto não adianta querer combatê-lo. O que acontece com Mercedes, Ferrari, McLaren, Aston Martin? Aceitam o massacre e não lutam para mudar as coisas porque é impossível ganhar, ou não ganham porque não se esforçam o bastante para reverter o quadro que se repete desde 2022?

Ah, estamos divagando de madrugada, e tais divagações não levam a nada. Vamos logo saber como foi a sessão que deu a Verstappen mais uma pole, a 35ª de sua carreira, segunda seguida na Austrália.

Sainz, segundo no grid: ainda convalescendo da cirurgia de apêndice

A tarde de sábado foi ensolarada e agradável em Melbourne, lindíssima cidade do litoral sudeste australiano. Os termômetros marcavam 18°C quando os carros começaram a ir para a pista para encontrar seu lugarzinho ao sol no grid.

As primeiras voltas no Q1 não foram lá muito impressionantes, com os tempos dos ponteiros ficando acima de 1min17s. Talvez por causa da temperatura do asfalto, mais alta do que na última sessão livre, realizada com tempo nublado. Nela, Leclerc fez a melhor volta em 1min16s714. O sol que apareceu na hora da classificação esquentou a pista. Carros de F-1 são muito sensíveis a essas alterações de temperatura. Mas, da mesma forma, qualquer mexidinha nos milhões de acertos possíveis no automóvel resolve esses problemas.

Alonso foi o primeiro a entrar na casa de 1min16s, reforçando a boa impressão que a Aston Martin vinha deixando desde o início dos treinos. Na sequência, Sainz e Leclerc entraram no mesmo segundo, assim como Pérez e Verstappen. Na quadriculada, Sainz, Pérez, Verstappen, Leclerc e Alonso ficaram com as cinco primeiras posições. O tempo do espanhol convalescente: 1min16s731. Russell foi o sexto; Hamilton, o 12º. E Albon, com o carro do desafortunado Sargeant, terminou numa ótima sétima colocação. Os quatro eliminados foram Hülkenberg, Gasly, Ricciardo (teve sua melhor volta cancelada porque passou por fora da pista na curva 5) e Zhou. A punição ao australiano da Débito ou Crédito? levou Ocon ao Q2, com o lamentável carro da Alpine. Nem ele acreditou quando perguntou pelo rádio onde tinha terminado, e ouviu de volta que passara de fase.

No Q2, Max começou a mostrar as garras que estavam recolhidas até então. Meteu 1min16s387 logo na primeira volta, abrindo 0s284 sobre Sainz e 0s350 sobre Leclerc. Na sequência, Piastri se imiscuiu entre o holandês e a dupla da Ferrari, colocando a McLaren em segundo – arrancando aplausos e sorrisos da torcida. Sainz não se deu por vencido. Voltou à pista e superou o #1 da Red Bull com 1min16s189, numa bela volta. A Ferrari não estava disposta a entregar os pontos facilmente.

A grande decepção da segunda parte da classificação foi a Mercedes. Russell avançou ao Q3 na bacia das almas, em décimo, e Hamilton foi degolado. Terminou em 11º, a 0s059 de seu companheiro de equipe. “Estou me acostumando a ser eliminado no Q2”, disse, desolado.

Lewis fez oito poles em Melbourne ao longo da carreira, um recorde para GPs da Austrália. Só na Hungria conseguiu mais – nove poles. Amargar uma eliminação no Q2 nessa pista, para alguém como ele, é dose pra leão. É a primeira vez desde 2010 que ele não vai ao Q3 em Melbourne. Seu último ano de Mercedes – acho que já escrevi isso – será melancólico. Não porque está sendo sabotado, ou coisa parecida. Como se diz hoje, é um “mix de sentimentos”. Uma mistura de carro ruim com desmotivação, distanciamento natural da equipe, esfriamento das relações internas diante da saída do time daqui a alguns meses. A taça de cristal caiu quando ele assinou com a Ferrari, quebrou e não dá mais para colar.

Nossa, estou cheio de clichês horríveis, hoje.

Hamilton: fora do Q3 na Austrália pela primeira vez desde 2010

Junto com Hamilton dançaram Albon, Bottas, Magnussen e Ocon. Desta vez, não teve milagre para o Kwid azul e rosa do francês. Sainz, Leclerc, Verstappen, Piastri e Pérez ficaram com as cinco primeiras posições. Passaram com eles ao Q3, pela ordem, Alonso, Norris, Stroll, Tsunoda (muito bem de novo) e o supramencionado Russell.

A luta pela pole, isso era claro, estava restrita à dupla vermelha de Maranello e a Verstappen. Sainz foi o primeiro a fazer volta rápida no Q3 e virou em 1min16s331. Não foi um primor; tinha sido mais rápido no Q2. Leclerc fechou sua primeira tentativa 0s104 acima do companheiro, também sem brilho. Então veio Max acelerando seu garboso automóvel para superar os dois e bater o cronômetro em 1min16s048, abrindo quase 0s3 sobre o #55 da Ferrari.

A tarefa de Sainz e Leclerc era cruel na segunda e derradeira saída dos boxes. Ambos precisavam achar cerca de meio segundo em suas voltas rápidas para bater Verstappen, e meio segundo não cai do céu num carro de F-1. Max, sádico, foi para a pista antes deles e baixou seu tempo para 1min15s915. Carlos até melhorou seu tempo, fez 1min16s185, mas não foi o bastante. Ficou 0s270 atrás. Uma façanha, para quem há duas semanas estava no hospital arrancando o apêndice. Leclerc, desanimado, abortou sua segunda volta resmungando que o carro saía de traseira.

O grid de Melbourne: desloquem o punido Pérez três posições para trás

Verstappen, Sainz, Pérez, Norris, Leclerc, Piastri, Russell, Tsunoda, Stroll e Alonso. Essa foi a ordem dos dez primeiros na fase final da classificação. Mais tarde, Pérez tomou uma punição de três posições no grid por ter atrapalhado Hülkenberg no Q1 e caiu para sexto. Norris, Leclerc e Piastri subiram uma posição cada.

Nem vamos brincar muito de fazer prognósticos para a corrida, que tende a ser uma repetição do Bahrein e de Jedá. Paciência. O negócio é torcer para que a prova seja divertida de Max para trás. E a tendência é que seja, mesmo. Serão duas paradas para troca de pneus, há sempre uma possibilidade iminente de safety-car, talvez Bottas mostre a bunda nos boxes.

A gente precisa de agarrar a alguma esperança, não?