Blog do Flavio Gomes
Pequim 2008

POR QUE PEQUIM?

PEQUIM (estufado) – Eu estava na França em 2005, quando o Comitê Olímpico Internacional escolheu Londres como sede dos Jogos de 2012. Paris era cidade-candidata e considerada favorita por muita gente, porque o projeto dos organizadores era um dos mais bem elaborados de todos, com ênfase no meio-ambiente e na inserção do evento no dia-a-dia […]

PEQUIM (estufado) – Eu estava na França em 2005, quando o Comitê Olímpico Internacional escolheu Londres como sede dos Jogos de 2012. Paris era cidade-candidata e considerada favorita por muita gente, porque o projeto dos organizadores era um dos mais bem elaborados de todos, com ênfase no meio-ambiente e na inserção do evento no dia-a-dia da cidade, sem grandes obras faraônicas e prevendo, por exemplo, que os deslocamentos do público e da imprensa seriam feitos majoritariamente a pé.

Os parisienses estavam confiantes na vitória e foram à praça que fica em frente à Prefeitura esperar pelo anúncio do COI, mas acabaram saindo frustrados. Fiquei triste pelos franceses. Os planos eram lindos e uma Olimpíada em Paris, convenhamos, não é algo de se desprezar. Londres ganhou com uma proposta bem diferente, de revitalizar uma área decrépita da cidade. Haverá um legado, pois, embora o custo seja muito mais alto.

O mesmo aconteceu em Barcelona em 1992. Estive na cidade um ano antes, quando a F-1 realizou sua primeira corrida em Montmeló. A capital catalã era um canteiro de obras e se transformou graças à Olimpíada. De cidade decadente e cheia de problemas, virou uma das mais belas da Europa, graças a um sólido projeto de reurbanização que não terminou com os Jogos, ao contrário — persiste até hoje, com planejamento e controle.

Pequim gastou os tubos para fazer esta Olimpíada, ergueu uma estrutura que não dá para reclamar, mas não é uma unanimidade. Não desperta grande simpatia de todos os participantes, apesar do esforço dos chineses em fazer tudo direitinho. Ontem, por exemplo, a equipe de ciclistas dos EUA desembarcou na cidade com máscaras negras sobre a boca e o nariz, num “protesto contra a poluição”. A poluição não se importou muito com as reclamações e continua por aqui.

E é o máximo que veremos em termos de protestos, porque as manifestações políticas, em geral ligadas à violência no Tibete, estão proibidas — os comitês olímpicos nacionais orientaram seus atletas a não meterem o bedelho na questão. Assim, a vilania chinesa fica reduzida à poluição, um pouquinho à censura na internet, e o resto que se dane.

A China, até outro dia — na minha escala de tempo, 20 anos são “outro dia” — era abominada pelo Ocdiente, por seu regime fechado, de desrespeito aos direitos humanos e tudo mais. Aí, deu uma guinada econômica, virou uma potência que cresce a taxas inacreditáveis e fez com que o mundo passasse a depender dela. Afinal, é um país de 1,3 bilhão de pessoas que precisa comprar muita coisa por aí afora para continuar crescendo. E, por isso mesmo, ninguém mais ousa criticar a China. De inimiga, virou parceira.

Não deixa de ser uma enorme hipocrisia. O mundo se curva ao poder econômico chinês e já não se importa se seu regime político não se encaixa naquilo que se convencionou chamar de democracia.

O Ocidente fechou definitivamente os olhos para os pecados chineses em troca de seu mercado de 1,3 bilhão de pessoas. E é por isso, só por isso, que Pequim foi escolhida sede dos Jogos de 2008. Não tem nada a ver com os belos olhinhos amendoados de seu povo, nem com o sorriso acolhedor de sua gente.