Blog do Flavio Gomes
Automobilismo internacional

IS JUST WAITING (18)

LE MANS (fim de papo) – Em vez da quadra, tripleta. Seria isso? Bem, 1-2-3 para a Audi em Le Mans. Esperava-se a vitória, era meio barbada. Mas quando a Toyota começou a andar bem, antes de anoitecer ontem, passou pela cabeça a possibilidade de uma briguinha. Só que não é fácil, no primeiro ano. […]

LE MANS (fim de papo) – Em vez da quadra, tripleta. Seria isso? Bem, 1-2-3 para a Audi em Le Mans. Esperava-se a vitória, era meio barbada. Mas quando a Toyota começou a andar bem, antes de anoitecer ontem, passou pela cabeça a possibilidade de uma briguinha. Só que não é fácil, no primeiro ano. Um acidente, um motor quebrado, e lá se foram os alienígenas da Corollândia para o espaço.

O trio formado por André Lotterer, Marcel Fässler e Benoit Tréluyer (em negrito, neste post, estará sempre o nome do piloto que chegou dirigindo) recebeu a bandeirada em primeiro com o Audi R18 e-tron quattro #1 depois de 378 voltas e 33 pit stops. Foram os únicos dos áudicos que não tiveram nenhum tipo de problema ao longo das 24 horas de corrida. Nas duas últimas voltas, os quatro monstrengos de Ingolstadt se encontraram na pista para cruzarem a linha de chegada juntos. Uma cerimônia bonita, uma celebração à marca e aos homens e mulheres que constroem esses carros e os transformam em máquinas imbatíveis.

O outro e-tron quattro chegou em segundo com Tom Kristensen/Allan McNish/Rinaldo “Dindo” Capello, 377 voltas percorridas com o #2, 32 paradas nos boxes. No final, quando faltavam três horas, McNish bateu e acabou com as chances de a Audi escolher o trio vencedor. Os dois carros estavam muito próximos e o time poderia se dar ao luxo de, por exemplo, homenagear Capello, que deve parar de correr. Foi a primeira vitória de um carro híbrido em Le Mans: um motor diesel atrás, um elétrico na frente.

O terceiro colocado foi o R18 ultra #4 de Oliver Jarvis/Marco Bonanomi/Mike Rockenfeller, 375 voltas, 32 pit stops. Esse não tem nada de híbrido. O quarto carro das quatro argolas, que idealmente para a turma de Ingolstadt chegaria em quarto, terminou em quinto graças ao acidente de Marc Gené também na hora do almoço. Seus parceiros foram Romain Dumas e Loic Duval. No fim, o ultra #3 percorreu 366 voltas com 32 paradas, e chegou atrás do Lola-Toyota da Rebellion de Nicolas Prost/Neel Jani/Nick Heidfeld. Grande corrida e grande resultado para o belíssimo protótipo preto e dourado que correu com a grife Lotus estampada na carenagem.

Os cinco, claro, da categoria LMP1, os protótipos mais potentes e de regulamento menos restritivo. Na LMP2, a vitória ficou com Vicente Potolicchio/Ryan Dalziel/Thomas Kimber-Smith, pilotando um HPD-Honda da Starworks americana, 354 voltas, 32 pits, sétimo na geral. O pódio foi fechado com Pierre Thiriet/Mathias Beche/Christophe Tinseau, 353 voltas, 30 paradas, oitavo na geral, com um Oreca-Nissan da Thiriet by TDS Racing, e Luiz Perez-Companc/Pierre Kaffer/Soheil Ayari, 352 voltas, 33 paradas, nono na geral, com outro Oreca-Nissan, da Pecom Racing.

Finalmente, os vencedores das categorias GTE. Na “Pro”, Fisichella/Bruni/Vilander, Ferrari 458 Italia da AF Corse, 336 voltas (23 pits), 17° na geral, à frente de Makowiecki/Melo/Farnbacher, Ferrari 458 Italia da Luxury Racing, 333 voltas (25 pits), 18° na geral, e Mücke/Turner/Fernandez, Aston Martin Racing, 332 voltas (26 pits), 19° na geral. Esse Melo é Jaime Melo, o único brasileiro na prova. O Fernandez é o velho Adrian, que ficou conhecido na Indy. Na “Am”, de amadores (a maioria, ruins; mas sempre tem um profissa no time), deu Bornhauser/Lamy/Canal com o Corvette da Larbre Competition, 329 voltas (25 pits), 20° na geral, seguido pelo Porsche 911 da Matmut com Pons/Narac/Armindo, 328 voltas (26 pits), 21° na geral, e pela Ferrari 458 Italia da Krohn Racing com Krohn/Jonsson/Rugolo, 323 voltas (28 pits), 25° na geral.

Vejam as marcas que foram ao pódio, de um jeito ou de outro, em quatro categorias: Audi, Honda, Nissan, Ferrari, Aston Martin, Corvette e Porsche. É uma corridaça, sempre chiquérrima.

Mas todos chegam arrebentados. E não há nada de chique nos macacões encardidos, nas mãos sujas de graxa, nas lanternas quebradas, nas pinturas riscadas, nas carrocerias remendadas, nos para-brisas trincados e emporcalhados, nos adesivos descascados, nas rodas lascadas, na borracha deformada, nas manchas de óleo espalhadas pelo chão e pela alma. Todos, quando largam às 15h do sábado, embarcam na mesma aventura com um único objetivo comum: chegar ao fim, do jeito que der.

Alguém sempre haverá de vencer. Tem sido a Audi, nos últimos anos. Será durante um tempo, ou não. Não se sabe. Outros vencedores certamente virão, o mundo do automobilismo é assim. Mas esta é uma corrida que tem muitos vitoriosos: todos aqueles que terminam, que veem a bandeira quadriculada depois de 24 horas passando por todo tipo de provação que se possa imaginar. Cada um dos 168 pilotos que se inscreveram para Le Mans neste ano terá uma história a mais para contar e para guardar na memória. Em Le Mans, a grande vitória é ir até o final, não importa como, nem onde. E a grande derrota, o grande lamento, é não ver o painel verde com números amarelos da Rolex zerados, na reta de chegada, depois de tanto esforço, sacrifício e sofrimento.

Por isso, em Le Mans, a história não é só a dos vencedores. É, também e principalmente, a dos perdedores. Porque estes voltarão. Até vencerem um dia. Até serem capazes de chegar ao final do mais longo dos dias.