Blog do Flavio Gomes
Nas asas

5 ANOS

SÃO PAULO – Hoje faz cinco anos do maior acidente aéreo do Brasil. Eu estava por perto, moro perto. As cinzas ficaram por alguns dias na varanda. Cinco anos atrás, escrevi algumas coisas, depois de ir até lá. Reproduzo, caso alguém se interesse. Hoje vão inaugurar um memorial no local. Num dia tão frio e […]

SÃO PAULO – Hoje faz cinco anos do maior acidente aéreo do Brasil. Eu estava por perto, moro perto. As cinzas ficaram por alguns dias na varanda. Cinco anos atrás, escrevi algumas coisas, depois de ir até lá. Reproduzo, caso alguém se interesse. Hoje vão inaugurar um memorial no local. Num dia tão frio e chuvoso quanto cinco anos atrás.

O silêncio da morte

Chove sem parar. Conheço a área. E não há por que alguém impedir minha passagem. Chego à larga avenida, que liga o norte ao sul. Pela contramão. Há um silêncio ensurdecedor, escreveria alguém. Nem o fogo crepita.

Encosto o carro. São poucos metros até as chamas, a fumaça e os carros de bombeiro. Aquele cheiro de novo.

Fico ali, olhando. Há uma fita impedindo as pessoas de passarem, mas não há muitas pessoas, e as que há não querem passar. E as que querem passar, passam. Ninguém fala, só o fogo e a fumaça.

Fico por ali, saio a pé. Nas casas e nos prédios vizinhos vivem pessoas vivas. Há silêncio e vida. Algumas luzes acesas, alguns televisores ligados para ver melhor o que está acontecendo ali do lado.

Há alguns bares abertos e toma-se café. Pego o carro, vou até o outro lado. Empaco atrás do caminhão de lixo. É preciso recolher o lixo, eles recolhem o lixo. Desviam ali, aquela quadra vai ficar com lixo esta noite. Espero recolherem o lixo. Atrás de mim, dois carros do IML esperam também, sem pressa.

Paro o carro de novo, sobre a calçada, olhando para a cabeceira xadrez. Não há sinal algum que explique nada, apenas um prédio do outro lado da rua ardendo, e a chuva que não pára.

Chegam quatro jovens. Uma moça chama o policial e pede para ir a algum lugar onde lhe digam alguma coisa. Minha mãe estava lá. No avião, diz, sem desespero. Era para estar, acrescenta.

Aquele cheiro de novo, agora com chuva. Volto ao carro, que anda lento e silencioso. Não tenho muito mais o que fazer ali. Nas casas lá perto as TVs já foram desligadas. Há silêncio, escuridão e normalidade. Há um motel funcionando. Há um hotel um pouco além, com manobrista e gente na recepção.

Está tudo normal. Só aquele pedacinho ali é que está meio esquisito, sai fumaça. Amanhã limpam tudo.