Blog do Flavio Gomes
F-1

SOBRE PNEUS E ULTRAPASSAGENS

SÃO PAULO (e tenho dito) – A essa altura, acho que todos já sabem que a Pirelli vai colocar novos pneus na pista a partir do GP do Canadá. Os 79 pit stops de Barcelona (78 para trocas, para ser preciso) assustaram um pouco. Precisar de quatro paradas para ganhar uma corrida, idem. Lembro de […]

SÃO PAULO (e tenho dito) – A essa altura, acho que todos já sabem que a Pirelli vai colocar novos pneus na pista a partir do GP do Canadá. Os 79 pit stops de Barcelona (78 para trocas, para ser preciso) assustaram um pouco. Precisar de quatro paradas para ganhar uma corridaBorracha, idem. Lembro de uma vitória de Schumacher assim em Magny-Cours que todos acharam espetacular, mas ele só fez isso para tirar uma onda. Naquele ano (2004?), estava tão fácil que o alemão resolveu ganhar corridas de todos os jeitos possíveis: uma parada, duas, três, com uma mão só, sem duas marchas, com freio a tambor, sem água no radiador, apenas com mecânicos canhotos, de óculos escuros… Essa da França foi para se divertir em ritmo de classificação durante a prova toda. Não havia a menor necessidade.

Mas domingo, não. Ou Alonso parava quatro vezes, ou se lascava. E muitos outros pilotos fizeram o mesmo.

Aí acaba a prova e ouço aqui e ali odes ao GP. Que em Barcelona nunca ninguém passava ninguém, e neste ano foi demais, um festival de ultrapassagens e tal.

Bobagem.

Reparem que a imensa maioria das ultrapassagens aconteceu entre carros cujas diferenças nos tempos de volta, no momento das ditas cujas, as ultrapassagens, eram de 2 a 3 segundos. Ninguém se esforçou demais. Era chegar e passar. Bico. Até eu passo por cima de um carro 2 segundos mais lento que o meu em qualquer pista.

Assim, é uma falácia dizer que o GP da Espanha foi “imprevisível”, “emoção do começo ao fim”. Ele foi é confuso para o público. Era fácil prever que Alonso venceria, depois de passar em terceiro na primeira volta. Ali sim houve corrida, nos primeiros metros, nas ultrapassagens que fez na largada. À frente dele havia um carro manco, de Rosberg, que duraria dez voltas, se tanto, e Vettel. OK, Vettel poderia ser um adversário. Então digamos que a corrida ficou imprevisível até a volta 11, quando Alonso saiu dos boxes na frente de Vettel. Ali o GP da Espanha acabou. Dali em diante, nada do que acontecesse seria real. As mudanças de posição seriam tão artificiais quanto um Big Mac de isopor. Só mesmo uma cagada num pit stop poderia alterar o resultado final. E jogar nas costas do erro de mecânicos o desfecho de um GP é uma pobreza esportiva.

Passamos a ter um campeonato de gestão de borracha. Quando Hamilton diz “não consigo dirigir mais devagar que isso”, é uma derrota. Quando ele mesmo se espanta, “uma Williams me passou!”, pelo rádio, é a indignação de quem tem um carro que depende só de pneus para funcionar. Se é assim, de que vale todo o esforço para se projetar um carrinho bacana?

Ótimo que a Pirelli vai mexer nisso. GPs confusos para quem assiste não são legais. É bom que a pessoa entenda o que está acontecendo quando está vendo uma competição esportiva qualquer. Senão, fica iludido o tempo todo, achando que algo anormal está acontecendo diante de seus olhos, ou vai acontecer. Não vai. As ultrapassagens de Barcelona foram de mentira. É como colocar o Bayern para jogar contra o Velo Clube começando o jogo com cinco jogadores contra 11 do adversário. Em 15 minutos, vai estar perdendo de 3 a 0. Aí para o jogo, coloca 11 contra 11, e o Bayern vira. Imprevisível, isso? Não. Confuso e mentiroso.

Fora que para a Pirelli me parece uma desgraça mercadológica botar a cada duas semanas na pista, para milhões de almas na TV, pneus que acabam depois de cinco ou seis voltas. Eu não me animaria muito a comprar pneus assim para meu carro.

Tomara que voltemos a ter um campeonato de carros, motores e pilotos. Se for para ter campeonato de pneus, que se abra a F-1 para outras marcas. Aí sim. As disputas Michelin x Bridgestone eram interessantes. Com o modelo de fornecedor único, não faz sentido submeter os pilotos a esse martírio de ter de andar devagar numa competição cuja objetivo é ser mais rápido que os outros. Conservar pneu hoje é mais importante do que ser veloz. É uma distorção da natureza do automobilismo.