Blog do Flavio Gomes
DKW & cia.

BLUE CLOUD, DIA 1

POÇOS DE CALDAS (longa quinta…) – Bem, fechamos a primeira noite com 59 carros. Acho que está bom, não? Saímos de São Paulo, eu e Crispim, bem cedo desta vez. Ano passado atrasei a caravana paulistana e levei broncas homéricas, com razão. Hoje (na verdade, já é ontem), às 8h estávamos no primeiro posto da […]

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POÇOS DE CALDAS (longa quinta…) – Bem, fechamos a primeira noite com 59 carros. Acho que está bom, não? Saímos de São Paulo, eu e Crispim, bem cedo desta vez. Ano passado atrasei a caravana paulistana e levei broncas homéricas, com razão. Hoje (na verdade, já é ontem), às 8h estávamos no primeiro posto da Bandeirantes. Café rápido, últimos acertos, e partimos em cinco carros para Poços.

O dia estava bonito e frio. Fizemos apenas duas paradas, e na primeira delas avistamos dois Belcar na estrada. Saímos atrás deles, dois casais de Pelotas que estavam havia três dias na estrada, mas de 1.500 km, para ir ao Blue Cloud. Como cresceu, esse encontro… Coisa de doido.

A viagem transcorreu sem o menor problema com os sete carros que por volta das 12h30 chegaram ao Hotel Palace. Havia uma certa muvuca. Parece que a Globo está gravando aqui cenas de uma novela que ainda vai estrear, e aquele rapaz bonitão, Thiago Lacerda, é um dos atores. Centenas de adolescentes malucas cercaram o hotel para ver os atores e atrizes globais.

Como não tenho nada a ver com isso, estacionei a meia-um  no local indicado e começou meu 12° BC.

A gente reencontra muitos amigos nestes dias. É uma delícia. Os assuntos não acabam nunca. Crispim foi sequestrado por fumacentos que, como sempre, o bombardearam com perguntas técnicas, históricas e filosóficas. Eu tratei de tirar umas fotos, almoçar, ver os carros, saber das novidades, aquelas coisas de sempre. E curtir meu quarto, que parece a suíte que Getulio Vargas usava quando ficava por aqui.

Neste ano, montamos uma área “social” numa das extremidades do parque, coberta, com bar e tudo. O cardápio, aliás, é o máximo. Tem Amendoim Auto Union, Fissore Mineiro, Pastel Vemaguet e Caldo Universal. Morram.

Já havia mais de 30 carros quando nossa turma chegou. De cara me chamou a atenção a surpresa do ano: um Candango Praiano montado pelo Davi Troncoso, de Brasília. O Praiano foi apresentado no Salão de 1960 pela Vemag. Nunca passou de um carro de exibição. Era um jipe “alegre”, com estofado e portas em padrão xadrez, capota sem fechamento nas laterais e atrás, o maior barato. Esse carro, nós vemagueiros só conhecíamos de duas fotos. Hoje, temos uma réplica exatamente igual. Uma coisa linda de doer.

Entre as surpresas deste 12° BC está o trio de Blumenau formado pelo Roberto, 94 anos, seu filho Otto e o mecânico Tenebroso. Eles vieram de avião, mas mandaram um Belcar 62 que tem uma história de arrepiar.

O Roberto comprou esse carro zero em 1962. Ficou com ele três anos, depois vendeu e seguiu a vida. Pois que há alguns anos o Otto teve um “insight” e resolveu achar o carro que fora de seu pai para dar de presente a ele — ah, não se enganem; o Roberto, aos 94 anos, é mais jovial que eu. O Belcar ficara 38 anos “perdido”, mas Otto encontrou quem comprara o carro de seu pai. Que já tinha vendido para outra pessoa, cujo endereço o filhote (modo de dizer, o cabra tem dois metros de altura!) conseguiu num papo de bar pelas redondezas, até descobrir o paradeiro do DKW: ele estava em Registro, no interior de São Paulo.

Otto foi atrás. O carro pertencia a um colecionador, que estranhou aquele rapaz aparecer do nada num dia de semana, perguntando de DKWs. Simpático, mostrou o que tinha. E na garagem apareceu ele: o Belcar 1962 vermelho Tanganica, um tom bem escuro, quase vinho, num estado razoável, funcionando, mas com as marcas do tempo. Otto, então, pegou da bolsa um papel. Era o imposto de renda de seu pai de 1963, com o carro declarado, incluindo o número do chassi. E a nota fiscal. E o dono não acreditou quando confrontou os dados. Imediatamente, fez o que qualquer pessoa sensível faria: “É para seu pai? OK. O carro é seu. Mando amanhã mesmo uma plataforma entregá-lo na sua casa”. E, contou o Otto, o colecionador vendeu por um preço justo, e nem por um segundo sequer cogitou ficar com um carro que voltaria para seu primeiro dono mais de 50 anos depois.

O Belcar passou por uma restauração absolutamente impecável, e hoje é dirigido alegremente pelo Roberto pelas ruas de Blumenau. Roberto que, repito, tem 94 anos. E acabou de renovar sua carteira de motorista por mais três.

São essas histórias que fazem a vida valer a pena.

Ah, e teve também uma coisa engraçada. No meio da tarde, as adolescentes malucas gritavam tanto para ver o rapaz da TV que eu resolvi colocar um chapéu, meus lindos óculos escuros e saí na varanda acenando e mandando beijinhos. Todas as birutas me filmaram com seus celulares, gritaram meu nome loucamente (“Thiagooooooo!!!!”) e voltaram para casa felizes da vida.

Ou são cegas, ou são malucas, mesmo. Mas pelo menos sossegaram.

Ah, tem vídeo no ar, já, gravado na quarta-feira. Divirtam-se.