Blog do Flavio Gomes
Gomes

KOMBOSA TRIP, DIAS #2, #3 E #4

MONTEVIDÉU (sempre chega) – Tivéssemos de fazer um relatório mecânico da Kombosa até agora, com mais de 2 mil km rodados desde sábado, seria necessário anotar: 1) boia do carburador travada; 2) fio do alternador solto; 3) para-sol do lado do motorista quebrado; 4) escapamento furado. Para o primeiro problema, fomos ao Rodrigo, mecânico da […]

MONTEVIDÉU (sempre chega) – Tivéssemos de fazer um relatório mecânico da Kombosa até agora, com mais de 2 mil km rodados desde sábado, seria necessário anotar: 1) boia do carburador travada; 2) fio do alternador solto; 3) para-sol do lado do motorista quebrado; 4) escapamento furado.

Para o primeiro problema, fomos ao Rodrigo, mecânico da Pinheira, do lado da Guarda. Talvez seja preciso desmontar o carburador, disse. Mas não vou conseguir fazer isso hoje, emendou. Como estava pingando gasolina, achei que deveríamos fazer algo. Ele pegou um bico de ar, colocou numa mangueira e assoprou. E sugeriu que fôssemos ao Rigatoni, mecânico do lado, não sei bem se o nome era esse.

Fomos. Estacionei no Rigatoni, abri a tampa do motor, o vazamento parou e a marcha lenta estava OK. Resumo do primeiro problema: se auto-resolveu, como tudo em carros antigos. Fomos para a estrada. A esticada era longa, exatos 666 km até Pelotas, e saímos às 14h, quando o plano inicial era deixar a Guarda às 9h. Mas atrasamos por causa do meu rim, ou algo assim.

Já na BR, acende a luz do alternador. Ora, ora. Paramos no primeiro posto onde havia um auto-elétrico. Abrimos a tampa do motor, um fio solto. Trocamos um terminal, prendemos o fio, gastamos 10 reais. Resumo do segundo problema: não era um problema.

O para-sol, eu que quebrei. Estava para quebrar há um bom tempo, em São Paulo troco. Já o escapamento, foi aqui perto, já, a uns 60 km de Montevidéu. O barulho aumentou, pode ter furado, pode ser uma junta. Veremos amanhã com especialistas no assunto, o que não falta por aqui.

O rim. Era terça de manhã, ontem, estava tudo pronto para picarmos a mula quando senti uma pontada no lado esquerdo da barriga. Aí começou a doer de verdade e Aguena, esta santa, arrumou transporte para me levar a um hospital.

Fomos parar no posto de saúde da Pinheira, do SUS. Em menos de 20 minutos eu estava medicado e assistido, e foi um jovem médico paraense quem fez o diagnóstico e acertou na mosca. Das 10h ao meio-dia fiquei me contorcendo de dor e queria morrer. Só quem tem essas cólicas renais sabe como dói. É foda. Aí, de repente, ela para. Não sei se é pedra, cálculo, picas. Sei que, do nada, a dor some, você levanta, agradece às enfermeiras e vai embora.

Foi o que fizemos. Ah, mas você foi no SUS? E seu plano de saúde premium-master? Não precisei dele. O SUS me atendeu perfeitamente, e o rapaz do Mais Médicos foi preciso e eficiente. Uma hora depois de sair do posto de saúde estávamos na Kombi despencando rumo ao sul do sul.

Mas não foi uma viagem fácil. Primeiro, um susto dos infernos chegando a Porto Alegre, na tal da Freeway. Escura, hostil, desprovida de serviços, e a uns 15 ou 20 km da entrada da cidade levamos uma pedrada. O barulho foi terrível, parecia que tinham explodido uma garrafa na minha porta. Olhei pelo espelho e vi dois ou três vultos atravessando a pista. Tentativa de assalto, claro. Miraram no vidro.

Quando paramos para abastecer, vimos onde a pedra acertou. No friso, bem abaixo da minha janela. Uns 5cm para cima, me mataria, simplesmente. Nem mais, nem menos. Entraria pela janela e acertaria minha cabeça. A pedra bateu no friso, que é grosso e tem uma borracha no meio, e espalhou pedaços (parecia ter sido arrancada do asfalto) pela canaleta da janela, machucando um pouco a pintura na coluna da porta e riscando levemente o vidro.

Foi assustador. Bela recepção. Anotado mentalmente: estrada brasileira à noite, no more.

Passamos por Porto Alegre e pegamos a BR116 de novo, pista única, sem sinalização de solo, uma merda federal. Não há explicação aceitável para essa estrada, nesse trecho, continuar sendo a bosta que sempre foi. Nota zero para os dois governos Lula e o primeiro Dilma. Não tem cabimento, simplesmente. OK, a estrada sempre foi um cu. Mas em 12 anos o PT já deveria ter resolvido esse negócio. Nada que é urgente pode levar tanto tempo. E morre gente que nem mosca ali.

Por três ou quatro horas, a caminho de Pelotas, pegamos o maior dilúvio que uma Kombi jamais enfrentou em qualquer ponto do planeta. Foi bem tenso. Mas, finalmente, chegamos à terra do Xavante sãos e salvos. Saldo da terça: uma crise renal resolvida, um carburador que se autoconsertou, um fio de alternador solto, uma tantativa frustrada de assalto na Freeway, uma tempestade na madrugada e boas horas de sono no incrível Motel Arizona com sua fonte no pátio.

Depois disso, encarar mais 600 km até Montevidéu foi barbada. E a Casa Tatu é o máximo.