Blog do Flavio Gomes
F-1

TETRAMEX (3)

RIO (foi bom, afinal) – Não é todo dia que se vê alguém ganhar um quarto título mundial de Fórmula 1, então que se reserve a este 29 de outubro seu devido lugar no calendário da história do automobilismo. Lewis Hamilton deixou um grupo de gigantes — Brabham, Stewart, Lauda, Piquet e Senna. Se juntou […]

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RIO (foi bom, afinal) – Não é todo dia que se vê alguém ganhar um quarto título mundial de Fórmula 1, então que se reserve a este 29 de outubro seu devido lugar no calendário da história do automobilismo. Lewis Hamilton deixou um grupo de gigantes — Brabham, Stewart, Lauda, Piquet e Senna. Se juntou a dois igualmente grandes — Prost e Vettel. Está atrás de dois monumentos — Fangio e Schumacher.

Mas é um igual.

O inglês, como se imaginava, fechou a disputa hoje no México sem muito drama, embora tenha ficado bem longe de onde se acostumou a chegar neste ano — na frente. Terminou o GP no Hermanos Rodriguez em nono, algo incomum para quem já havia vencido nove corridas na temporada.

Mas desde a primeira volta ele sabia que seria campeão. Porque quem poderia adiar a conquista passou pelo mesmo calvário após a largada. Vettel não teve nenhuma chance de vencer a prova, nem de chegar em segundo, a partir do momento exato em que foi ultrapassado por Max Verstappen quando ambos chegaram à primeira sequência de curvas da pista mexicana. Sem nada a perder, o holandês foi para a ultrapassagem. E fez. Vettel vacilou e Hamilton, que vinha atrás, tentou aproveitar o momento. Passou também, mas quando Sebastian tentou se recompor, houve um toque de sua asa esquerda no pneu traseiro direito do Mercedão do britânico.

A asa quebrou. O pneu furou. E o Mundial acabou.

Ambos foram para os boxes ao fim da primeira volta, caindo para as duas últimas posições. Não há milagres possíveis, nessas horas. Vettel não teria como se recuperar para ganhar a corrida. Lewis, sendo bem sincero, só teria de esperar o tempo passar para comemorar.

Isso não significa que a prova tenha sido ruim. Ao contrário. Exceto pelos três primeiros, Verstappinho, Bottas e Raikkonen, que a partir da metade da prova se distanciaram demais de todo mundo, o resto se divertiu a valer. Inclusive, e principalmente, Vettel. Apesar do título perdido de forma precoce, acabou sendo o grande nome do domingo, ao menos no que diz respeito a recuperação. Terminou em quarto. E foi uma saga.

[bannergoogle]Tião italiano começou a escalar o pelotão lentamente, depois de trocar o bico e colocar pneus macios, intuindo que não faria mais nenhum pit stop. Na volta 15, depois de passar Massa reclamando pelo rádio, já era 15º. Hamilton seguia em 19º, com os mesmos pneus macios — que não rendiam. No pelotão da frente, algumas surpresas: Ericsson em nono, Magnussen em oitavo e Stroll em sétimo.

Enquanto Sebastian se esgoelava, Hamilton cozinhava o galo. Não havia muito o que fazer, lá atrás. Verstappen, na outra ponta, seguia abrindo de Bottas. A diferença era de 5s9 na volta 17. Só perderia para ele mesmo. Na 19ª volta, Vettel aparecia em 13º; Hamilton seguia em 19º. Nesse momento, muita emoção no autódromo: todo o público se levantou em silêncio, erguendo o punho. Era uma homenagem às vítimas do terremoto que atingiu o país no último dia 19 de setembro. Comovente e muito foda.

Na volta 21 começaram os pit stops para a maioria. E na 22ª, Hamilton levou uma bandeira azul pela primeira vez no ano. Como retardatário, depois de perder muito tempo com o pneu furado e a parada, levou uma volta do líder Verstappen. Um instante raro e curioso. Teve de tirar o pé para deixar o menino passar.

Vettel seguia ralando, ainda que inutilmente. Na 24ª volta estava em 11º. Passava todo mundo, num esforço tocante. Lewis, ao contrário, se arrastava em último. Sainz, que estava à sua frente, se distanciava. O inglês só foi subir uma posição na volta 26, quando Hülkenberg abandonou. Foi quando Vettel entrou nos pontos, aparecendo em décimo.

Finalmente, na volta 28, Hamilton passou alguém. Superou Sainz e foi para P17. Vettel se enroscou atrás de Alonso e Ericsson, mas apesar de demorar um pouco ganhou as duas posições com a parada do sueco da Sauber e uma ultrapassagem tranquila sobre Alonso, chegando a oitavo.

A quebra de Hartley, na volta 32, fez com que o safety-car virtual fosse ativado. Verstappen aproveitou e parou. Bottas também. Hamilton, que já reclamava dos pneus, fez o mesmo e colocou supermacios. Só quem ficou na pista foi Vettel — além, claro, dos que já tinham feito suas paradas, como a dupla da Force India. Sebastian subiu para sétimo. Mas acabou parando, também. Colocou pneus ultramacios e caiu para oitavo mais uma vez.

Vettel precisaria de um segundo lugar para adiar a decisão do título, mas na volta 38 estava mais de um minuto atrás de Bottas, o segundo colocado. Era impossível. Restava fazer uma corrida digna, e isso ele fazia. Chegou ao sétimo lugar ao superar Magnussen. Pérez, o sexto, estava mais de 14s à frente. Dava para alcançar. Poderia almejar um quinto lugar, até, já que tinha pneus mais rápidos e um carro muito bom nas mãos — Stroll, que ocupava a posição, era alvo igualmente possível. Um quarto já seria quase um milagre, porque Ocon estava bem na prova, com alguma folga para o canadense da Williams. Mas dava, com alguma luta. Mais que isso, era mesmo sonho de uma noite de verão. No caso, de uma tarde de outono no hemisfério norte. Os três primeiros estavam anos-luz à frente.

Enquanto Sebastian se esgoelava para cumprir sua inglória tarefa, estava engraçado acompanhar as conversas de rádio entre o líder Verstappen e a Red Bull. Max acelerava feito doido desnecessariamente, mais de 10s à frente de Bottas. O time pediu para ele “correr devagar”. O holandês assentiu. Mas, na volta seguinte, virou mais um temporal. “Max, não precisa. Foi igual à última”, chamou-lhe a atenção o engenheiro. “Desculpa”, respondeu Verstappinho. E continuou acelerando.

[bannergoogle]Fazendo suas contas nos boxes, a Mercedes informou Hamilton que a previsão era de que ele chegasse em oitavo, no ritmo que estava. Mais do que suficiente para ser campeão, porque Vettel só venceria em caso de hecatombe coletiva. Sebastian chegou em Pérez na volta 51 e passou, assumindo o sexto lugar.

Hamilton se animou com a perspectiva de levantar a taça pontuando, pelo menos, e partiu para cima de quem estava por perto. Vettel seguia com seu tormento e na volta 55 passou Stroll. Lewis entraria na zona de pontos duas voltas depois, ao passar Massa para assumir o décimo lugar. Vettel chegou ao seu limite possível pouco depois, deixando Ocon para trás.

Com Raikkonen em terceiro, 23s à frente, um pódio seria possível se o finlandês tirasse o pé. Seria uma bobagem monumental, porém, não resolveria nada e ainda deixaria Kimi irritado desnecessariamente. Vettel ainda perguntou qual era a diferença. Ao ser informado, ainda teve um rasgo de bom humor. “Mamma mia…”, respondeu.

De qualquer forma, Tião Italiano merecia algum reconhecimento pela obstinação. Foi valente e profissional. Os três primeiros, Verstappen, Bottas e Raikkonen, ganharam suas taças sem suar demais — mal apareceram na TV. Hamilton, que sofreu bastante até metade da corrida, também deu seu showzinho, e quase desistiu de buscar o oitavo lugar calculado pela Mercedes nas dez voltas finais, para acompanhar de camarote a disputa entre Alonso e Magnussen.

Mas como não tinha mais nada a perder, atacou Alonso nas últimas duas voltas e não teve moleza. O espanhol da McLaren, que lutou por pontos neste ano como um esfomeado atrás de um prato de comida, resistiu o quanto pôde. Na segunda tentativa, tocaram rodas e Lewis passou. Valeu o ingresso.

Verstappen, então, apareceu nas imagens da TV na última volta, para chegar à sua segunda vitória no ano, terceira na carreira. Sua atuação foi soberba, mais uma vez. Bottas e Raikkonen receberam a quadriculada bem depois, seguidos por Vettel, Ocon, Stroll, Pérez, Magnussen, Hamilton e Alonso.

Lewis recebeu uma bandeira da Inglaterra de um comissário de pista e quando chegou ao estádio saiu comemorando, depois de fazer zerinhos e chorar falando com a equipe pelo rádio. “Viva México!”, gritou ao microfone de David Coulthard em sua primeira declaração oficial como tetracampeão. Agradeceu a todos, equipe, família e amigos — até uma gravação de Neymar lhe dando os parabéns foi passada a ele pelo rádio –, correu para os boxes pelo meio do povo e, depois, foi receber sua taça.

Merecidíssima.