Blog do Flavio Gomes
F-1

PESTINHAS (3): NÓ TÁTICO

RIO (nas nuvens) – “Quando você está em segundo, pode apostar um pouco mais alto e fazer um segundo pit stop. No pior cenário, você fica em segundo. No melhor, passa e ganha.” Foi assim que Max Verstappen, conformado e realista, analisou o que aconteceu no ótimo GP da Hungria encerrado agora há pouco. Foi a […]

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RIO (nas nuvens) – “Quando você está em segundo, pode apostar um pouco mais alto e fazer um segundo pit stop. No pior cenário, você fica em segundo. No melhor, passa e ganha.” Foi assim que Max Verstappen, conformado e realista, analisou o que aconteceu no ótimo GP da Hungria encerrado agora há pouco. Foi a quarta corrida seguida que encheu os olhos de quem gosta de F-1. Depois daquela prova chatíssima da França, parece que os deuses do automobilismo acordaram.

Em Budapeste, a beleza ficou por conta da tensão criada pelos estrategistas de Mercedes e Red Bull. Além, claro, da pilotagem excepcional de Verstappinho e Lewis Hamilton, que acabou vencendo mais uma — a oitava na temporada, 81ª na carreira. Desta vez, os prateados aplicaram um xeque-mate nos rubro-taurinos. E o nome do domingo acabou sendo James Vowles.

Quem?

Engenheiro nascido em Felbridge, Inglaterra, 40 anos, Vowles responde pelas estratégias de corrida da Mercedes. Apesar da juventude, não é um novato neste mundo veloz. Estava na Brawn em 2009, campeã com Button — equipe que sucedeu a Honda e, no final daquele mesmo ano, foi comprada pela Mercedes. Carrega muitos títulos no currículo, um deles com Rosberg, em 2016.

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Foi dele a decisão de chamar Hamilton para os boxes na 49ª das 70 voltas do GP da Hungria, quando o inglês perseguia o líder Verstappen de muito perto, com diferenças que mal passavam de 1s, mas com dificuldades para ultrapassar. Dez voltas antes, Lewis fizera uma tentativa que deixou o autódromo sem respirar, e Max se de defendeu com frieza e talento.

Naquela altura, ambos já haviam feito suas paradas. Verstappen, na volta 26, colocando pneus duros. Hamilton, na 36ª — optando pelos mesmos compostos. Teoricamente, os dois iriam até o fim com apenas um pit stop. Mas Vowles fez as contas depois da tentativa frustrada de ultrapassagem na volta 39 e concluiu que se o líder do Mundial colocasse um novo jogo de pneus (médios, no caso) teria um carro muito veloz na parte final da corrida. E que quando chegasse novamente no holandês as condições de ultrapassagem seriam mais favoráveis.

A parada inesperada também anulava uma possível mudança de estratégia da Red Bull, que só conseguiria responder à altura se Max fizesse um segundo pit stop imediatamente, ainda correndo o risco de perder a posição. O time austríaco perdeu o “timing” e optou por manter seu piloto na pista. E passou a rezar para que a corrida acabasse logo.

Só que reza braba não resolve muita coisa na F-1. O que se viu nas voltas seguintes foi uma exibição de gala de Hamilton, que passou a andar em ritmo de classificação para descontar a diferença de 20s que Verstappen abriu depois do pit stop do britânico. Ele precisaria descontar pelo menos 1s por volta para chegar no rival. E, depois, ainda teria de fazer a ultrapassagem.

Lewis socou o pé. Na volta 55, a diferença caíra para 15s. Na 60ª, 12s. Na 64, já estava no retrovisor de Max, a 5s. Na 66ª, a vantagem do holandês era de menos de 1s, o que já permitia a Hamilton abrir a asa móvel para dar o bote. Na 67ª, a três do final, o piloto da Mercedes passou. Max, com os pneus em más condições, nem resistiu, dessa vez. Já em segundo, foi para os boxes colocar pneus macios para, pelo menos, fazer a melhor volta da prova — o que lhe daria um ponto extra. Ele tinha folga suficiente para o terceiro colocado para fazer o pit stop sem perder a posição.

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“Eu queria muito ganhar esta corrida, principalmente depois do que aconteceu na Alemanha”, falou Hamilton, ainda debilitado por uma forte gripe. “Cheguei a duvidar que daria certo. Estou muito grato à equipe por ter assumido o risco e acreditar que eu era capaz.”

E como foi. A prova se desenhara para Verstappen desde a largada, com o rubro-taurino saltando à frente e deixando os dois pilotos da Mercedes brigando atrás pela segunda colocação. Lewis se saiu melhor no duelo das primeiras curvas com Bottas — que ainda perdeu um pedaço da asa dianteira num toque com Leclerc e acabou saindo da disputa ao fazer uma parada precoce para trocar o bico.

O finlandês, diga-se, voltou a ter seu futuro na Mercedes ameaçado. Fez mais uma corrida ruim e terminou apenas em oitavo. Era a cara do desânimo ao final do GP húngaro. A possibilidade de ser demitido no final do ano é cada vez maior, se não reagir.

Ainda tem algum crédito, porém, nas palavras do chefe Toto Wolff. “Precisamos analisar todos os dados, entender o que saiu errado, pesar os prós e os contras de tudo que ele tem feito até aqui na equipe. Temos de ponderar o que é melhor: arriscar com algum piloto jovem, ou ter alguém como ele, que também traz coisas muito positivas para o time. Não acho justo reduzir essa discussão a um simples ‘ele fica ou vai embora'”, disse o dirigente.

Voltando à corrida, Verstappen se manteve razoavelmente seguro na frente até a parada, mesmo tendo trocado seus pneus seis voltas antes que Hamilton. Teve de se virar para segurar o inglês na tentativa da volta 39, mas depois reassumiu o controle da situação até a sacada da Mercedes de parar Lewis pela segunda vez. Dali até o fim, conviveu com a perspectiva iminente de ver o adversário no cangote de novo, sem muita chance de se defender.

A prova teve outra atuação digna de nota, de Vettel, que só fez seu pit stop na volta 40 e colocou pneus macios, para ganhar a posição do companheiro Leclerc a duas voltas do final e levar o terceiro troféu do dia. Aliás, que troféus! A Hungria sempre faz as mais lindas taças da temporada.

Sebastian e a Ferrari, porém, não tinham muito a comemorar. O alemão recebeu a quadriculada mais de um minuto depois do vencedor — os três do pódio e Charlinho, quarto colocado, foram os únicos que terminaram a corrida na mesma volta. Sainz Jr. chegou em quinto, seguido por Gasly (ô menino apagado…), Raikkonen, Bottas, Norris e Albon na zona de pontos.

Foi a sétima vitória de Hamilton na Hungria. Ele igualou Michael Schumacher curiosamente no dia em que Mick, filho do alemão, venceu pela primeira vez na F-2 na mesma pista. Lewis subiu para 250 pontos na classificação. Bottas tem 188 e Max, 181. Há quem acredite que Verstappinho está na briga pelo título. É otimismo demais. São 69 pontos de diferença, e ainda que Red Bull e Honda tenham crescido assustadoramente nas últimas provas, é óbvio que a Mercedes segue tendo o melhor pacote e não é preciso ser adivinho para afirmar que Hamilton conquistará seu sexto título mundial.

Isso, no entanto, não empana o brilho da temporada. Sempre digo que campeonato bom é feito de boas corridas, ainda que o resultado final seja previsível. E não dá para reclamar do que a F-1 ofereceu ao distinto público nas últimas quatro provas.

Agora, férias. Para eles. Nós seguimos aqui, firmes e fortes. Na resistência à barbárie cotidiana.

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