Blog do Flavio Gomes
F-1

INTERLEWIS (10): MEMORÁVEL

SÃO PAULO (a gente ama esta pista) – O autódromo de Interlagos deveria ser tombado como patrimônio histórico-esportivo da humanidade. Ô pista para fazer corrida boa! Mesmo quando se caminha para um desfecho previsível, daqueles que farão a prova ser lembrada como “disputada”, mas não “épica”, alguém estala os dedos no Céu do Automobilismo, habitado […]

Verstappen e Gasly: os grandes nomes de um GP inesquecível

SÃO PAULO (a gente ama esta pista) – O autódromo de Interlagos deveria ser tombado como patrimônio histórico-esportivo da humanidade. Ô pista para fazer corrida boa! Mesmo quando se caminha para um desfecho previsível, daqueles que farão a prova ser lembrada como “disputada”, mas não “épica”, alguém estala os dedos no Céu do Automobilismo, habitado por deuses galhofeiros, e decide bagunçar o coreto.

Hoje foi assim, com uma prova mais ou menos normal se desenrolando para consagrar a superioridade de Verstappen no fim de semana, até um coadjuvante juramentado, Bottas, quebrar e estacionar seu carro no fim da Reta Oposta. A direção de prova, com uma pontinha de malícia, acionou o safety-car e juntou o pelotão. Não precisava. Um safety-car virtual ali já seria suficiente para remover a Mercedes do finlandês, mas se podemos melhorar as coisas, por que não?

Fizeram muito bem, os homens na torre de controle.

Àquela altura da corrida, já na volta 54 das 71 previstas, Verstappen dominava as ações não sem alguns imprevistos, como a perda da posição para Hamilton quando saía dos boxes em seu primeiro pit stop, na volta 21. Isso porque a Williams, na extremidade do pit-lane, liberou Kubica de sua parada e ele quase joga o holandês no muro.

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O tempo perdido na manobra evasiva para evitar a batida com o carro do polonês foi suficiente para Hamilton assumir a ponta, ele que tinha parado uma volta antes e perseguia o holandês de perto desde o início. Ambos colocaram pneus macios, indicando claramente a estratégia de dois pit stops. Mas já na volta em que saiu dos boxes Max nem quis saber de lamentar o atraso e passou o inglês, retomando o lugar que era seu.

Na volta 44, Lewis parou de novo, para pneus médios. Max fez o mesmo na volta seguinte, momento em que Vettel, que havia largado mal e tentava se recuperar para pelo menos garantir um pódio, assumiu a ponta. Como tinha apenas uma parada, a liderança era ilusória. Ele faria seu segundo pit stop na volta 50, pouco antes do momento decisivo do GP.

Bottas, que vinha numa corrida apagada em sexto, estava com pneus médios novos e tentava passar Leclerc. O monegasco saíra de 14º para sexto nas dez primeiras voltas, e tinha uma estratégia de apenas uma parada. Já estava com pneus duros quando o finlandês chegou nele. Mas não conseguia passar. E o motor do Mercedes #77 acabou abrindo o bico.

Assim que o safety-car entrou na pista porque o carro de Bottas precisava ser removido do acostamento, na volta 54, a Red Bull foi ligeira e chamou Verstappen para uma terceira parada. Ele colocou pneus macios. Hamilton ficou na pista com médios já gastos. Leclerc também parou e colocou macios. Na relargada, na volta 60, Lewis liderava seguido por Verstappen, Vettel, Albon, Leclerc e Gasly, todos com pneus macios novos.

Nos braços da Red Bull: vitória espetacular de Verstappen

Max, com o estilo que todos conhecem, foi para cima de Hamilton sem dar tempo de o rival entender o que estava acontecendo e passou o hexacampeão por fora no S do Senna. Albon, na outra Red Bull, fez o mesmo com Vettel e assumiu o terceiro lugar, partindo para cima do inglês. A corrida ficou espetacular. E melhor ainda na volta 65, quando Leclerc atacou Vettel e passou o companheiro no S do Senna.

Furioso, o alemão embutiu no monegasco na Reta Oposta e foi por fora para retomar a quarta posição. Os dois se tocaram, a suspensão dianteira direita de Leclerc quebrou e o pneu de Vettel furou. Em frações de segundo, dois carros da Ferrari fora da corrida e o ódio entre seus dois pilotos exposto para o mundo, via satélite. Caos na Itália. Amanhã falaremos sobre os desdobramentos da crise.

Vettel x Leclerc: mais um capítulo de uma briga que vai longe

De novo o safety-car foi acionado e, dessa vez, a Mercedes chamou Hamilton para colocar um jogo de pneus macios e tentar alguma coisa no fim. Na fila indiana atrás do Mercedão que conduzia o pelotão estavam três carros da família Red Bull — Verstappen, Albon e Gasly, da filial Toro Rosso –, com Hamilton em quarto. Na relargada, na volta 69, Hamilton passou o francês sem dificuldade. Na sequência, tentou o mesmo com Albon, no Bico de Pato, e bateu no tailandês. Já na entrevista ao sair do carro, Lewis assumiu a culpa. Uma hora depois, recebeu a punição de 5s e perdeu o terceiro lugar, herdado por Carlos Sainz Jr., que largou em… último! E o espanhol fez apenas uma parada, conseguindo de forma espetacular o primeiro pódio de sua carreira. Foi também o primeiro da McLaren desde o GP da Austrália de 2014 — que teve Magnussen em segundo e Button em terceiro.

Festa da McLaren no pódio: primeiro depois de mais de cinco anos

Como também chegou ao pódio pela primeira vez o renascido Gasly, dispensado da Red Bull depois do GP da Hungria e rebaixado para o time B dos energéticos, sediado em Faenza. Quando Hamilton se enroscou em Albon, ele assumiu o segundo lugar e na última volta, na Subida do Café, segurou o inglês de forma comovente, para receber a bandeirada em segundo lugar. Foi quase inacreditável.

Verstappen venceu pela oitava vez na carreira, terceira neste ano. Foi o 18º piloto diferente a ganhar em Interlagos em 30 edições do GP do Brasil desde 1990, quando a prova voltou a São Paulo. Por alguma razão inexplicável, o velho autódromo — que no ano que vem completa 80 anos — é pródigo em oferecer ao distinto público espetáculos estranhos, imprevisíveis e inesquecíveis. Quando não é a chuva é o calor, quando não é um acidente é uma quebra acompanhada de um safety-car brejeiro e gaiato, e o fato é que sempre acontece algo diferente por aqui — para não falar nos seis títulos decididos nas franjas da cidade em 2005 e 2006 (Alonso), 2007 (Raikkonen), 2008 (Hamilton), 2009 (Button) e 2012 (Vettel).

E é possível que nas próximas horas mais acontecimentos insólitos emanem deste local sagrado que fica entre as represas Billings e de Guarapiranga. No momento em que escrevo, seis pilotos podem ser punidos por uso da asa móvel na segunda relargada, o que vai embaralhar totalmente a classificação final da corrida — Sainz é um deles, e pode perder o pódio.

Mas disso só saberei quando pousar no Rio daqui a algumas horas, porque tenho um avião saindo agora que não vai esperar. Acompanhem tudo no Grande Prêmio. A noite vai ser longa.

As noites de Interlagos são sempre longas e memoráveis.

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Atualizando…

Cheguei ao Rio e ninguém foi punido, exceto Hamilton, que caiu de terceiro para sétimo. Sainz e a McLaren foram para o pódio por conta para fazer sua festa e a Alfa Romeo foi dormir em êxtase, com um quarto lugar de Raikkonen e um quinto de Giovinazzi. Ricciardo ficou com a sexta colocação e, depois de Hamilton, fecharam a zona de pontos Norris, Pérez e Kvyat. Foi demais, em resumo.