Blog do Flavio Gomes
F-1

WILLIAMS NUNCA MAIS

RIO (abaixo de zero) – Por € 152 milhões, a Williams foi vendida para um fundo de investimento americano chamado Dorilton Capital. Estima-se que depois de quitadas as dívidas, a família ficará com € 112 milhões, as gavetas serão esvaziadas e a história do time como a conhecemos, iniciada em 1977, chega ao final. Virão […]

RIO (abaixo de zero) – Por € 152 milhões, a Williams foi vendida para um fundo de investimento americano chamado Dorilton Capital. Estima-se que depois de quitadas as dívidas, a família ficará com € 112 milhões, as gavetas serão esvaziadas e a história do time como a conhecemos, iniciada em 1977, chega ao final. Virão novos CEOs, diretores, executivos. A saga de Frank Williams sobreviverá apenas no nome, que os americanos prometem manter, e no endereço atual da fábrica, em Grove.

É tentador escrever “fim de uma era” num dia como hoje, decretando a extinção definitiva das equipes fundadas por nossos queridos e estimados garagistas e o desaparecimento de sobrenomes históricos da F-1, mas a precisão jornalística me obriga a lembrar ao distinto público que ainda temos ao menos um time que segue sob o controle de seu criador, a Haas, e outros três que carregam sobrenomes famosos desde sempre — a própria Williams, McLaren e Ferrari.

Equipes de F-1 mudam de dono o tempo todo. Estão aí a AlphaTauri, a McLaren, a Alfa Romeo, a Racing Point (de todas, essa é disparado a pior combinação), a Red Bull e a própria Mercedes que não me deixam mentir. Outras simplesmente fecham as portas. E o desaparecimento dessas marcas familiares é igualmente rotineiro. Sem pesquisar no Google, lembro de supetão de Brabham, Tyrrell, Minardi, Jordan, Sauber, Ligier, Stewart, Fittipaldi, Prost, e devo ter esquecido outras tantas.

Assim, nada de novo acima da linha do equador.

Mas também não dá para negar que a venda da Williams carrega um enorme significado. OK, a sobrevivente Haas é de um garagista ianque, mas ele chegou outro dia e é bem capaz que desapareça sem deixar vestígios qualquer hora dessas. A equipe de Frank, não. São 43 anos, e não são 43 anos quaisquer. São 43 anos com 114 vitórias, 128 poles, nove títulos mundiais de construtores e sete de pilotos. A Williams é Jones, é Rosberg, é Piquet, é Mansell, é Hill, é Villeneuve, é Prost e é Senna — que morreu num de seus carros em 1994.

A Williams é história.

E é essa história que agora passa às mãos da incrível Dorilton Capital, que até o momento em que escrevo não registrou na área de “notícias” de seu site oficial a compra da equipe — o que dá a exata medida da importância que essa aquisição tem para seus cotistas.

O fundo, como descreve sua homepage, é especializado em comprar, capitalizar e possivelmente passar para a frente empresas de diversas áreas de atuação, como indústria, alimentação, engenharia e saúde. Até onde se sabe, corridas de carro não fazem parte do rol de interesses dos engravatados que batem ponto no 26° andar de um edifício de Nova York. A compra de um time que tem uma fábrica e disputa umas corridas estranhas na Europa é apenas mais um negócio, como as recentes aquisições de hospitais em Oklahoma e na Geórgia no começo de agosto por uma das empresas nas quais seus cotistas investem uns cobres.

O que será da Williams a partir de hoje é impossível dizer. Não se sabe quem fica, quem sai, o que será feito do acervo do time, se a partir de amanhã Claire e Frank terão seus crachás cancelados pelo RH. A equipe não vai fechar, o que a princípio é uma boa notícia. De repente alguém percebe que é um bom negócio, dá uma graninha, e ela segue existindo até o fim dos tempos. Ou não. Daqui a um ano um cheirosinho qualquer decide passar o troço adiante e lá se vai a Williams para outro endereço aleatório em algum canto do mundo.

Não sei se o pai de Latifi, milionário canadense que certamente já tomou um uisquinho com a divertida turma da Dorilton (que nome horrível, parece remédio), ajudou nessa negociação — fazendo alguma indicação, talvez até participando de alguma forma. O que sei é que ainda que mantenha o nome, a partir dessa venda a Williams não é mais a Williams. Ela passa a ser uma equipe de F-1 que não pertence a ninguém em especial — fundo de investimento não é gente — e que, na falta de nome melhor, se chama Williams.

A Williams de verdade vai deixar saudades.