Blog do Flavio Gomes
F-1

N’ASTON MARTIN

RIO (vida que segue) – Quando Pérez anunciou ontem que estava fora da Force Point, não era preciso ser nenhum bidu para saber que o movimento seguinte do tabuleiro seria a confirmação de Vettel na futura Aston Martin. O alemão quer seguir. Sabe que não será campeão de novo, mas quem sabe o que vai […]

RIO (vida que segue) – Quando Pérez anunciou ontem que estava fora da Force Point, não era preciso ser nenhum bidu para saber que o movimento seguinte do tabuleiro seria a confirmação de Vettel na futura Aston Martin.

O alemão quer seguir. Sabe que não será campeão de novo, mas quem sabe o que vai acontecer em 2022? Quem sabe até onde vai o domínio da Mercedes? Quem sabe quais mudanças bruscas acontecerão a partir de um novo regulamento, teto de gastos, tomadas de decisão dos grandes grupos envolvidos com a F-1?

O mundo está mudando muito rapidamente, em tudo. E Vettel optou por estar no seu mundo particular, o das corridas, para viver de perto a próxima era da categoria. Vettel é um cara que ama o esporte, mas detesta a F-1 como ela está. Numa entrevista antes da prova de Monza, disse que a categoria precisa encontrar um caminho, sob o risco de deixar de existir daqui a algum tempo. Citou a F-2, que só nesta temporada já teve dez vencedores diferentes em oito rodadas duplas, comparando-a com a F-1: “Desde 2014, início da era híbrida, foram só oito vencedores diferentes”. Agora são nove, com Gasly. Mesmo assim, é claro que ele tem razão. Nove vencedores em sete anos na F-1. Dez vencedores em 16 provas disputadas em dois meses na F-2. O que você prefere?

Não há garantia nenhuma que isso vá acontecer na nova F-1 a partir de 2022, e o mais provável é que não. Mas também não precisa ser um samba de uma nota só. Uns três ou quatro acordes diferentes ajudariam. Time grande é time grande e time pequeno é time pequeno, os grandes em geral vencem, mas custa estruturar um campeonato que ofereça alguma chance a quem hoje não tem nenhuma?

Se a nova Aston Martin se colocar entre as que têm alguma chance, Vettel já estará satisfeito. Alguns pódios, quem sabe uma vitória aqui, outra ali… A equipe rosa, ainda que seja de propriedade de um sujeito que fez fama e fortuna vencendo cuecas de grife, tem uma filosofia esportiva bastante funcional: estrutura enxuta, bons carros, técnicos competentes, consciência de seu lugar a partir de parcerias sólidas, como a com a Mercedes. Tendo estreado na F-1 em 1991 com o nome de seu fundador, Eddie Jordan, o time passou por várias mãos e se firmou no Mundial quase sempre no pelotão intermediário, sem nunca dar vexame. Sob gestão indiana de Vijay Mallya beliscou pódios e muitos pontos. Com Lawrence Stroll no comando, pescou o primeiro troféu domingo com o filhote Lance em terceiro.

Associada a uma marca historicamente ligada ao esporte e ao glamour automobilístico, a britânica Aston Martin de James Bond & cia., a sequência da equipe na F-1 tende a ser próspera e interessante. Neste ano, todos sabemos, a — OK, vou me render à caretice — Racing Point optou por tirar uma xerox da Mercedes do ano passado para construir seu carro. O resultado disso até agora são 82 pontos conquistados no campeonato e o quarto lugar entre os construtores, atrás de Mercedes (281), Red Bull (158) e McLaren (98). Somem-se os 15 pontos subtraídos no GP da Estíria pelo uso de um duto de freio protestado pela Renault e seriam 97 pontos, apenas um atrás da McLaren e uma briga ferrenha pelo terceiro lugar. O futuro, portanto, parece promissor.

A dispensa de Pérez, que em 2018 ajudou até a salvar o time da falência, pode parecer dolorosa. Ele tinha contrato até o fim de 2022, e a nova administração, que havia renovado com ele em agosto do ano passado, rasgou o acordo. Dois anos atrás, ele saiu em socorro de Mallya para que outros credores não pedissem o fechamento da equipe, num gesto que, pelo jeito, já caiu no esquecimento — afinal, Mallya já se mandou e os patrões agora são outros.

Do ponto de vista técnico, uma dupla Vettel-Pérez seria muito melhor, mas todo mundo sabe que o filho do dono jamais vai ser substituído. Portanto, alguém teria de rodar para a chegada de um tetracampeão mundial, e esse foi o mexicano. É cruel? É. Mas é assim.

Sebastian não precisa ficar com remorso, na F-1 pilotos mudam de equipe o tempo todo, uns saem e outros chegam, ele mesmo foi chutado da Ferrari há alguns meses. O pé é o mesmo, as bundas que se revezam. Além do mais, Pérez tem lugar em pelo menos dois times que devem mexer em suas duplas para 2021, Alfa Romeo e Haas. Ele conta com apoio de empresas mexicanas — leia-se Carlos Slim, o bilionário dono da Telmex, sexto homem mais rico do mundo — e vai acabar se arranjando.

Não acho que Vettel tenha fracassado redondamente na Ferrari. Seus números são interessantes, até, e creio que o pior momento foi no GP da Alemanha de 2018, onde chegou na liderança do campeonato, bateu sozinho e viu Hamilton virar o jogo. Naquele ano, desperdiçou a maior chance de ser campeão com o carro vermelho, ainda que fosse difícil pacas. Depois disso, passou a cometer muitos erros, fez uma temporada apagada no ano passado, levou fumo de Leclerc, brigou com o time e, neste ano, lhe deram uma cadeira elétrica inviável.

Motivado, Sebastian pode pelo menos relembrar seus bons tempos de Red Bull. Um piloto como ele não deve ser desprezado. A Aston Martin já chegará à F-1 como protagonista em 2021. Que ele seja feliz na nova casa.