Blog do Flavio Gomes
F-1

N’ALGARVE (1)

RIO (saudades da terrinha) – Como sou o rei das irrelevâncias, confesso que hoje minha maior expectativa era pela paisagem, na volta da F-1 a Portugal. E como é lindo, o Algarve! Lá pra 1989 ou 1990, não lembro direito, o GP de Portugal era seguido do GP da Espanha. Domingo no Estoril, domingo seguinte […]

RIO (saudades da terrinha) – Como sou o rei das irrelevâncias, confesso que hoje minha maior expectativa era pela paisagem, na volta da F-1 a Portugal. E como é lindo, o Algarve! Lá pra 1989 ou 1990, não lembro direito, o GP de Portugal era seguido do GP da Espanha. Domingo no Estoril, domingo seguinte em Jerez. Aí resolvi ir de uma corrida para a outra de carro, junto com o Celso Itiberê, d'”O Globo”. Era uma viagem de pouco mais de 500 km, tranquilo.

Ao final do primeiro dia, resolvemos pernoitar no Algarve. Havia — há — uma estatal chamada Pousadas de Portugal, uma rede de hotéis em prédios históricos administrada pelo governo. E caímos na Pousada Sagres, que, se vocês olharem o mapa de Portugal, fica bem na quina. Não é figura de linguagem. Portugal é quase um retângulo de pé, com um dos lados menores na base. O canto esquerdo inferior é a quina. Exatamente ali ficava a Pousada Sagres.

Pousada Sagres: na quina de Portugal

Para provar que não estou exagerando, vejam o mapa das Pousadas de Portugal. Daquele precipício pra lá, meu filho, na era das Grandes Navegações, só havia incertezas. Aliás, a Escola de Sagres é tida como a grande alavanca para os descobrimentos dos portugueses e a expansão do reino para além mar. Dom Henrique, no século 15, foi quem estimulou a fundação de uma vila lá embaixo, onde o oceano faz a curva, como ponto de apoio a quem se jogava no Atlântico. E também teria sido ele a estimular o estudo mais detalhado de disciplinas como cartografia, astronomia, matemática, engenharia naval e tudo que fosse necessário para construir boas embarcações que pudessem ajudar a estender os limites de Portugal. A essa barafunda se chamou genericamente de Escola de Sagres, que os historiadores garantem que não era escola nenhuma, com salas de aula, carteiras, lousa, giz, professores e intervalo para recreio.

Bem, foi uma viagem deliciosa, estradas ótimas, cenários maravilhosos, eu era bem moleque, terceira ou quarta vez na Europa, primeira vez de carro — nas outras todas, trem era meu meio de transporte — e a ótima companhia do Itiberê, um poço de conhecimento e sabedoria. E como comemos e bebemos bem, putz grila!

Assim conheci o Algarve, onde muitos brasileiros têm casa de praia, inclusive — Senna era um deles. Nunca mais voltei. Capaz de, quando voltar, não sair mais de lá.

Mas vamos ao que interessa.

Bottas: mais rápido em dia cheio de interrupções em Portugal

O autódromo de Portimão é lindíssimo e o traçado deve ser muito prazeroso com suas subidas e descidas e um punhado de curvas cegas traiçoeiras. Não sei se vai resultar numa boa corrida, mas há uma boa chance — porque o lidar com o desconhecido normalmente leva a uma maior incidência de erros por parte de pilotos e equipes. E ninguém chegará 100% preparado na hora do GP.

Hoje, boa parte das três horas de treinos livres foi anulada pelos tempo desperdiçado nos testes com os pneus de 2021 e com duas interrupções por bandeiras vermelhas — que comeram 32 minutos das atividades de pista. O resultado foi Bottas em primeiro e Hamilton em oitavo a 1s3 do companheiro. Claro que isso não faz o menor sentido, tecnicamente falando.

A primeira paralisação aconteceu após um princípio de incêndio no carro de Gasly. Notei na transmissão da TV e nas chiliquentas redes sociais muitas críticas ao resgate, à demora para apagar o fogo, tirar o carro e tal. Esquecem-se, todos, que é a primeira corrida de F-1 em Portimão. Que todos os procedimentos são novos. Que não há histórico de incidentes para a categoria no circuito. E, por isso, todo rigor é bem-vindo.

O mesmo vale para para a suposta demora para recolher o carro de Lance Stroll, que foi um dos protagonistas da vespertina lusitana ao bater em Verstappinho, numa patuscada ridícula dos dois. Felizmente nada de mais grave aconteceu, porque esses toques de roda com roda, muitas vezes, resultam em tragédias. Sobraram palavrões no rádio de Max, mas não tiro a culpa dele, não. Achou que Stroll tinha fechado volta rápida, e não tinha. Na pista, a gente não tem de achar nada. Quando viu que ao emparelhar com Lance o canadense não tirou o pé, tira. E Stroll não perceber que tinha um carro ao seu lado quando tomou a curva é o fim. “Cego” e “retardado” foram as definições usadas pelo piloto da Red Bull para se referir ao colega da Martin Point.

Duas bestas quadradas, em resumo.

Dos treinos de hoje, pois, não dá para falar muito — exceto o óbvio, de que a Mercedes é favorita e tal. No segundo pelotão, ainda não está clara a relação de forças entre McLaren, Red Bull, Racing India e Renault. Esperemos pelo terceiro treino livre, amanhã.

Apesar da nova onda de casos de Covid-19 que assola a Europa, o governo português autorizou a presença de público, em número reduzido, nas belas tribunas do Algarve. Foram longos 24 anos sem F-1 no país, e fico aqui imaginando como estão se sentindo meus amigos Zé Miguel Barros, Artur Ferreira, João Carlos Costa, Luís Vasconcelos, Henrique Cardão (este, no céu) e tantos outros com a volta à terrinha.

Tomara que fique no calendário, essa corrida. Até o fim dos tempos.

Portimão: lindo cenário, que fique para sempre