Blog do Flavio Gomes
F-1

¡TEQUILA! (3)

ITACARÉ (reverteu) – O pequeno soluço da Red Bull ontem, perdendo a pole e a primeira fila inteira para a Mercedes, foi curado hoje no autódromo Hermanos Rodríguez. Max Verstappen saiu de terceiro no grid para primeiro na primeira curva e, com enorme tranquilidade, ganhou pela terceira vez no México, nona no ano, 19ª na […]

Pérez, terceiro, abraça seu pai: festa mexicana

ITACARÉ (reverteu) – O pequeno soluço da Red Bull ontem, perdendo a pole e a primeira fila inteira para a Mercedes, foi curado hoje no autódromo Hermanos Rodríguez. Max Verstappen saiu de terceiro no grid para primeiro na primeira curva e, com enorme tranquilidade, ganhou pela terceira vez no México, nona no ano, 19ª na carreira. Com Lewis Hamilton em segundo, sua vantagem na classificação subiu de 12 para 19 pontos na classificação: 312,5 x 293,5. Sergio Pérez, com o outro carro da Red Bull, ficou em terceiro, para delírio da apaixonada torcida local.

O campeonato, a quatro provas do final, começou a ficar com as cores do time austríaco e da bandeira holandesa. Vai ser difícil para a Mercedes dar a volta por cima. A próxima etapa acontece no Brasil daqui a uma semana, onde tanto Max quanto seu time são favoritos, também, pelas características da pista e por causa da altitude de São Paulo em relação ao nível do mar. No caso da capital paulista, são 800 m, o que favorece os motores Honda em relação aos Mercedes como no México, mais alto ainda (2.385 m).

Verstappen: largada excepcional e nona vitória no ano

A largada foi esquisitíssima. O pole Bottas partiu bem, mas depois de alguns metros deu a impressão de que estava esperando Hamilton chegar à primeira curva na sua frente. Verstappen percebeu o vai-você-que-eu-vou-depois, pegou o vácuo do finlandês, jogou o carro para a esquerda e passou os dois por fora de forma espetacular. Valtteri, com um olho no peixe e outro no gato, acabou não vendo o canguru. Tocou em Ricciardo, ou foi tocado, o que nesse caso dá na mesma, e rodou. Caiu para a última posição e teve de ir para os boxes, assim como o australiano da McLaren. Ambos aproveitaram e colocaram pneus duros. Mais atrás, com os abandonos de Mick Schumacher e Yuki Tsunoda, que fizeram um sanduíche de Ocon, o safety-car foi chamado logo na primeira volta para arrumar a bagunça toda. Os que mais lucraram na confusão foram Giovinazzi, que apareceu em sexto depois de largar em 11º, e Russell, em nono, ganhando sete posições.

Na relargada, na volta 5, Verstappen pulou rápido e conseguiu abrir um pouco de Hamilton e Pérez, que vinham logo atrás, sem dar chance ao inglês de pegar um vácuo — o que ajudaria bem. E três voltas depois, com Max 2s5 à frente, Lewis fez seu primeiro boletim radiofônico direto do cockpit: “Ele está rápido”. Pois é. Te vira, jovem. (Parece que essa foi a resposta, mas não foi ao ar.)

A segunda mensagem de Hamilton para sua equipe, já na volta 14, tampouco foi muito animadora. “Meus pneus estão virando drops!”, gritou (ele usou “dropping”, que quer dizer outra coisa, mas costumo fazer traduções livres aqui). “Dulcora?”, replicou o engenheiro. “Não, esse não existe mais!” Em terceiro, em outra frequência do dial, Pérez tranquilizava sua equipe: “Meus pneus estão mehorando, melhorando o tempo todo”, cantarolou no ritmo de “Getting Better”, dos Beatles.

Verstappen se mantinha em silêncio e só acelerava. Na 20ª volta, sua diferença para Hamilton chegou a 7s. E, nas muretas de Mercedes e Red Bull, integrantes das duas equipes começaram a ensaiar os primeiros atos da ópera “Who Will Undercut — An Aztec Rhapsody”.

Torcida animada: 372 mil ingressos em três dias

Após os acordes iniciais, Hamilton soltou sua voz de barítono e entoou os primeiros versos da canção “These guys are obviously too fast for us”. “Não consigo escapar deeeeeele”, cantou em tom dramático, apontando para Pérez, o terceiro colocado. “Checo, let’s close it up”, soltou do pitwall o contratenor da Red Bull, em falsete muito elogiado pelos entendidos. “Mais seis voltas, mais seis voltaaaaas”, respondeu o tenor da Mercedes na volta 27 indicando o momento da parada de seu piloto. E era mentira, uma coisa meio teatral, porque já na 30ª Hamilton parou, colocou pneus duros, voltou em quarto e foi ultrapassado por Leclerc, que tinha pneus mais aquecidos. Charlinho parou na volta seguinte e deixou Lewis em quarto, mais de 30s atrás do líder imperturbável.

Verstappen parou na volta 34 sem preocupação nenhuma com a cotação do peso mexicano e já pensando nas tequilas que tomaria à noite. Pérez assumiu a ponta, para alegria do povo que, em três dias, lotou o autódromo comprando nada menos do que 372 mil ingressos. A corrida já não era mais entre Verstappen e Hamilton, mas sim entre Checo e o britânico pelo segundo lugar. A Red Bull resolveu manter o piloto da casa na pista por mais algumas voltas, para ter pneus melhores que Lewis na parte final da prova e, quem sabe, ganhar sua posição.

Parada de Bottas: domingo para esquecer

Na volta do pit stop, Max manteve sua vantagem confortável para cima do #44, acima de 7s. Em quarto vinha Sainz, que também não tinha parado, como o líder Pérez, seguido por Gasly, Leclerc e Alonso — outro que, por ele, não faria nenhum pit stop. Não era uma boa corrida. As poucas brigas lá atrás, como entre Bottas e Ricciardo, assemelhavam-se àquelas lutas de boxe em que os pugilistas trocam jabs, mas não acertam um golpe sequer no oponente. Para piorar, Valtteri, coitado, perdeu mais de 11s com uma trapalhada da Mercedes em seu segundo pit stop.

Pérez parou na volta 41. Quando saiu dos boxes, estava mais de 9s atrás de Hamilton, mas com pneus 11 voltas mais novos que o vice-líder do campeonato. A tendência era começar a descontar tempo para tentar um ataque no fim. Mas era preciso paciência, já que a diferença caía a conta-gotas. Dez voltas depois da parada, o cronômetro mostrava que ele ainda precisaria de 6s para encostar no inglês. O mexicano só chegou perto mesmo na volta 58, quando começou a se insinuar para cima de Lewis em busca de uma dobradinha para a Red Bull. A diferença caiu para menos de 2s. Nessa hora, só para não deixar passar em branco, a Ferrari ordenou uma troca de posições entre Leclerc e Sainz, que assumiu a quinta posição. Gasly era o quarto, correndo sozinho. Depois eles destrocaram.

Sainz pede passagem: Ferrari atende, mas depois devolve a posição a Leclerc

Mas quem estava ligando para a Ferrari e AlphaTauri nessa hora? As arquibancadas do Hermanos Rodríguez passaram a empurrar Pérez para cima de Hamilton, já em sua alça de mira. Lewis olhava no retrovisor e via sombreiros, tacos, fajitas e mariachis. Não ia ser fácil segurar o piloto e um país inteiro atrás dele.

A distância entre Hamilton e Pérez caiu para menos de 1s na volta 61, permitindo ao mexicano a abertura da asa móvel. Lewis, no entanto, resistia. Um retardatário aqui, outro ali, uma folguinha para dar uma resfriada nos pneus, e Pérez ali, babando guacamole. “¡Llegar es una cosa, pasar es otra!”, decretou ao microfone da Televisa o narrador Galván Bueño, cunhando uma frase que certamente entrará para os anais das transmissões esportivas. Enquanto a caça continuava, a Mercedes chamou Bottas aos boxes duas vezes para colocar pneus macios e fazer a melhor volta da prova, tirando o ponto extra de Verstappen.

No fim, Pérez não passou e chegou mesmo em terceiro. Mas no Foro Sol, antigo estádio de beisebol montado dentro da curva Peraltada, a festa dos torcedores para seu piloto foi enorme. Verstappen entrou na onda e ajudou seu companheiro a desfraldar uma bandeira do México. A Red Bull encostou na Mercedes no Mundial de Construtores. um pontinho atrás apenas: 487,5 x 477,5. Gasly, Leclerc, Sainz, Vettel, Raikkonen, Alonso e Norris fecharam a zona de pontos.

“Fiz o que pude”, disse Hamilton. “Estou grato de ter chegado em segundo. A pressão foi grande de Checo no fim, mas estou acostumado com isso. Se alguém como Checo chega no seu rabo, é porque o carro deles está rápido demais”, completou, sem se dar conta do teor um tanto deselegante da declaração. Pérez se tornou o primeiro piloto mexicano a subir no pódio em uma corrida de seu país. “É uma sensação inacreditável! Eu conseguia ouvir os torcedores de dentro do carro. A gente queria uma dobradinha, mas infelizmente não deu. De qualquer forma, meu coração está com eles aqui”, falou emocionado, apontando para o público. Max, por sua vez, evitou cantar vitória no campeonato: “Ainda tem muita coisa pela frente, mas as coisas estão parecendo boas para nós no momento”.

Estão mesmo. Acho que nunca estiveram melhores.