Blog do Flavio Gomes
F-1

PULASTONE (3)

SÃO PAULO (e foi bonito, viu?) – Aconteceu de tudo no GP da Inglaterra em Silverstone. Incluindo uma vitória inédita, do espanhol Carlos Sainz, da Ferrari. Era zebra, apesar da pole. Mas problemas com a Red Bull de Verstappen e uma bobeada da Ferrari com Charles Leclerc durante um safety-car no fim deram ao espanhol […]

Sainz, o grande vencedor: primeira da carreira

SÃO PAULO (e foi bonito, viu?) – Aconteceu de tudo no GP da Inglaterra em Silverstone. Incluindo uma vitória inédita, do espanhol Carlos Sainz, da Ferrari. Era zebra, apesar da pole. Mas problemas com a Red Bull de Verstappen e uma bobeada da Ferrari com Charles Leclerc durante um safety-car no fim deram ao espanhol o sonho do degrau mais alto do pódio. Pérez foi o segundo e Hamilton, o terceiro. Leclerc, Alonso, Norris, Verstappen, Schumacher, Vettel e Magnussen fecharam a zona de pontos.

Mick fez seus primeiros pontos na F-1. Max salvou o que deu com um carro todo estropiado — o assoalho quebrou — e segue tranquilo na liderança do Mundial. Tem 181 pontos, contra 147 de seu companheiro Pérez. Leclerc, com 138, aparece em terceiro.

Russell acompanha resgate de Zhou: tensão em Silverstone

A corrida começou muito tensa, com um acidente múltiplo nos primeiros metros envolvendo Russell, Tsunoda, Zhou, Albon e Ocon. A bandeira vermelha foi imediatamente acionada e a corrida, paralisada. Registre-se que Verstappen, com pneus macios, havia largado muito bem, ganhando a ponta na primeira curva em cima do pole Sainz, que tinha calçado pneus médios para o início da prova.

Por longos minutos a transmissão oficial não mostrou Zhou, que capotou, enquanto os outros carros voltavam para os boxes ou por meios próprios, como Tsunoda e Ocon, ou rebocados, casos de Russell e Albon.

No paddock, as expressões eram fechadas e preocupadas. A falta de informações sobre o estado do piloto chinês gerava uma agonia que parecia infinita.

Olhe bem: o piloto ainda está no carro

Só às 11h25, pelo horário de Brasília, as imagens foram liberadas na TV e deu para entender a dinâmica do acidente. Primeiro, Gasly tocou de leve no carro de Russell – que largara de pneus duros, sem aderência alguma, perdendo várias posições. O inglês da Mercedes perdeu o controle, apontou para a esquerda e acertou Zhou. O chinês, então, capotou e seu carro se arrastou de cabeça para baixo por um pedaço de asfalto e depois pela caixa de brita em altíssima velocidade, até decolar num “degrau” da área de escape, passar por cima de uma barreira de pneus e só parar numa grade de proteção a poucos metros do público que se encontrava ali numa arquibancada. O halo salvou sua vida.

Às 11h29, quase meia hora depois da largada, a Liberty colocou no ar uma comunicação de rádio entre a Alfa Romeo e Bottas, companheiro de Zhou. “Ele está OK”, disse o engenheiro. A emissão foi levada aos alto-falantes de Silverstone e o público aplaudiu, aliviado. Então, várias imagens impressionantes passaram a ser mostradas. E foi possível compreender também o que aconteceu um pouco mais atrás: Vettel bateu na traseira de Albon, que virou de repente e deu no muro, voltou para o meio da pista e foi atingido por Tsunoda, que acabou batendo também em Ocon. Zhou e Albon foram levados ao centro médico do autódromo. Depois, o tailandês seguiu de helicóptero para um hospital para exames.

O chinês não precisou de maiores cuidados. É incrível que ele tenha saído sem um arranhão. Um pouco mais tarde, Zhou gravou um vídeo para dizer que estava bem e agradeceu as mensagens que recebeu. No paddock, foi recebido pelo CEO da F-1, o italiano Stefano Domenicali.

Com Stefano Domenicali, CEO da F-1: tudo bem com o chinês

Pouco antes do meio-dia, sempre pelo horário de Brasília, os carros foram encaminhados para a pista atrás do safety-car para uma nova largada, com as posições originais de grid – já que a prova fora interrompida na volta 1 e o que vale para a retomada são as posições da volta anterior, no caso o grid definido um dia antes. Foram 54 longos minutos de paralisação. Tsunoda e Ocon tiveram seus carros reparados e foram para a corrida, reiniciada com o número original de voltas, 52. Gasly, Tsunoda, Ocon, Latifi e Vettel colocaram pneus macios. Os demais, médios.

Na nova largada, Sainz, Verstappen, Leclerc e Pérez se esfregaram por várias curvas, mas mantiveram as posições que tinham no grid. Hamilton, da turma da frente, foi ultrapassado por Norris e caiu para sexto. Na sexta volta, Pérez foi para os boxes com seu carro danificado. A Red Bull teve de trocar o bico por causa da refrega com Leclerc e ele despencou para o fundo do pelotão, iniciando uma excepcional recuperação.

Ferrari x Red Bull: disputa dura no início da prova

Lewis retomou a posição de Norris assim que a direção de prova autorizou o uso da asa móvel e subiu para quarto, com a parada prematura de Checo. Sainz e Verstappen, em primeiro e segundo, se distanciavam. E Max começou a preparar o bote para cima do espanhol.

Nem precisou se esforçar muito. No final da 10ª volta, Sainz deu uma “traseirada”, escapou da pista, conseguiu voltar, e Max passou, assumindo a liderança. Um pouco mais atrás, Tsunoda e Gasly se enroscaram pateticamente numa disputa caseira de posição e rodaram. O japonês seria punido.

A liderança de Verstappen durou pouco, duas voltas. Um suposto pneu furado o levou aos boxes logo depois de passar Sainz. Fez a parada e voltou em sexto. Mas as coisas não estavam nada boas para o holandês. Assim que retornou do pit stop, avisou pelo rádio que seu carro estava “100% quebrado”. O time respondeu que sim, tinha alguma coisa quebrada mesmo, mas que não era nada crítico. Perderia rendimento por falta de pressão aerodinâmica, mas daria para continuar. “Não é nada estrutural, você está seguro, não temos o que fazer.” Para Max, a partir dali, seria apenas uma questão de chegar ao fim e fazer o máximo de pontos possíveis.

Lá na frente, duas Ferrari. Sainz em primeiro, Leclerc em segundo. Disputando a ponta. O espanhol não queria nem saber: lutava pela primeira vitória de sua carreira. Charlinho reclamava pelo rádio que queria passar: “Ele tá fodendo minha corrida!”. Ouviu um cri-cri-cri de volta. Sainz, sim, foi alertado para dar uma apertadinha porque Hamilton, em terceiro, começava a se aproximar. Mais de uma vez. “Não me falem mais isso, por favor”, respondeu o #55, com toda calma possível. Norris, Alonso, Verstappen, Ocon, Bottas, Ricciardo e Pérez fechavam as dez primeiras colocações na altura da volta 20.

Ferrari em primeiro e segundo: muita conversa no rádio

Foi quando a equipe chamou Carlos para os boxes. Colocou pneus duros para ir até o fim da corrida. Voltou em terceiro. E Lewis começou a crescer na prova, descontando a diferença que tinha para o novo líder Leclerc. Fora da briga pela vitória com o carro todo torto, Verstappen parou de novo na volta 24 para colocar pneus duros e tentar salvar o domingo, voltou em oitavo e passou o resto da corrida reclamando que o carro não tinha aderência, que com aqueles pneus parecia que estava andando no gelo, que a frente estava ruim e a traseira, também. Hamilton assumiu a liderança de um GP pela primeira vez no ano na volta 26, quando Leclerc parou para trocar pneus. Voltou em terceiro, atrás de Sainz.

A vantagem do heptacampeão para o espanhol da Ferrari era de 17s, e ele ainda teria de fazer sua parada. Pelo rádio, informava à Mercedes o tempo todo: “Os pneus estão bons, lindos, maravilhosos, gostosos, redondinhos, coisa linda de Jesus”. Ele precisava abrir pelo menos 20s para fazer o pit stop e voltar ainda na frente das duas Ferrari, com pneus mais novos.

Hamilton disputando com Leclerc: Mercedes voltou a andar bem

A conversinha radiofônica no time italiano era divertida. “Vocês estão livres para lutar”, disse um macarrônico engenheiro a Leclerc, que estava a menos de um segundo de Sainz. Para o espanhol, porém, a informação foi outra: “Bonitón, você tem de entrar num ritmo de voltas em 1min32s2, senão vamos inverter as posições”. Ele respondeu, com total serenidade: “Me deem mais uma volta”. Passou a volta, o tempo não veio, a equipe pediu: “Sai da frente”. E Carlos, ainda calmo e tranquilo: “OK”. Saiu. Era a volta 31. Hamilton seguia 18s à frente, agora tendo a Ferrari #16 do monegasco em segundo.

Charlinho tinha seus motivos para solicitar que seu quase sempre depressivo companheiro não atrapalhasse sua jornada. Passou a fazer voltas muito rápidas, a senha para que Lewis entrasse nos boxes na volta 34. Colocou pneus duros e saiu em terceiro, longe dos dois carros vermelhos. A parada foi ruim: 4s3, contra uma média de 2s5 dos pit stops da Ferrari. O milagre de uma vitória em casa ficou mais distante.

Mais para trás, Verstappen se arrastava para se manter na zona de pontos. Foi ultrapassado por Ocon e caiu para nono. Schumacher, em décimo, se animou e foi buscar o holandês cuja equipe ele só conhece pelo nome – raramente se veem na pista. Só que Ocon quebrou na volta 39. Bomba de combustível. Parou o carro na reta dos boxes antigos. E, claro, entrou o safety-car, para desespero da Ferrari.

Mick recebe o abraço de Vettel: o pupilo fez seus primeiros pontos na F-1

Sainz e Hamilton correram para os boxes e colocaram pneus macios para a parte final da prova. Leclerc, que estava cerca de 4s à frente do companheiro, não parou. “Me mandaram ficar na pista, fiquei”, diria depois da corrida, puto dentro do macacão. Lewis ainda ficou na dúvida: “Gente, será que esse pneu aí é o melhor mesmo?”. Oxe. Claro que era! Faltavam 12 voltas, apenas. O espaguético engenheiro de Leclerc avisou: “Os caras estão aí atrás de pneus macios novos”. Charlinho, pneus duros com 16 voltas de vida, constatou, desolado: “Vai ser meio difícil”.

Ô, se ia… A relargada veio na volta 43. Sainz foi para cima. Leclerc, marrento, dificultou. Mas não resistiu. Pérez, de quem ninguém se lembrava até o safety-car, passou Hamilton e foi para cima do monegasco. Lewis tentou dar o troco. E a volta 46, pouco depois, foi daquelas históricas: Pérez atacou Leclerc, que se defendeu, e Hamilton passou os dois. Mas eles não se conformaram nem um pouco e foram para cima do inglês juntos, recuperando as posições.

Lewis ainda levaria três voltas para passar Leclerc e subir para terceiro. Pérez já estava longe, em segundo. Sainz mais ainda, na ponta. E assim terminaram os três do pódio. Carlos parecia não acreditar. Foram 150 GPs para chegar lá. “Vocês não imaginam como estou me sentindo”, disse, pelo rádio. O primeiro a cumprimentá-lo, no Parque Fechado, foi Leclerc. Sem muita empolgação, é verdade. Mas cumprimentou. Foi um bom esportista. “A única coisa boa hoje foi o Carlos ganhar.” Depois foi pedir explicações à Ferrari.

Sainz se tornou o segundo espanhol a vencer na F-1. O outro é Fernando Alonso, que ganhou 32 corridas — a última delas também pela equipe italiana, em Barcelona/2013.

Na entrevista antes do pódio, o carrancudo Sainz, finalmente, sorriu.