Blog do Flavio Gomes
F-1

PREZINHO (1)

SÃO PAULO (u-hu) – Talvez o melhor mesmo, hoje, seja abrir esta profunda análise do primeiro dia da pré-temporada da F-1 no Bahrein com uma tabela de tempos. Fria, direta, objetiva. Esteticamente nem muito bonita, embora já tenhamos nos acostumado com as fontes que se chamam F1 Reg, F1 Turbo e F1 Torque, pelo que […]

Os tempos do dia #1: massacre rubro-taurino

SÃO PAULO (u-hu) – Talvez o melhor mesmo, hoje, seja abrir esta profunda análise do primeiro dia da pré-temporada da F-1 no Bahrein com uma tabela de tempos. Fria, direta, objetiva. Esteticamente nem muito bonita, embora já tenhamos nos acostumado com as fontes que se chamam F1 Reg, F1 Turbo e F1 Torque, pelo que li num site aí, e que podem ser baixadas aqui, creio — não reclamem se vier algum vírus.

Uma tabela de tempos não deixa muitas dúvidas no ar. Quando se vê que Max Verstappen completou 142 voltas sem sequer um ranger de mola no banco do passageiro, quando o cara enfia 1s140 no segundo colocado, quando se pesquisa a pré-temporada de 2023 e se descobre que o carro da Red Bull foi 1s5 mais rápido que neste mesmo momento do ano passado (1min32s827 em 23 de fevereiro com o mesmo Verstappen), quando seu engenheiro Gianpiero Lambiase aparece rindo no momento em que o piloto mete 0s8 em Lando Norris por este ter ousado assumir a liderança da folha de tempos, e quando se vê onde começaram Mercedes, Ferrari, McLaren e Aston Martin, não precisa mais falar muita coisa.

Se é a pergunta que todos fazem antes de começar um campeonato que precisava ser respondida hoje, respondida está. Ah, mas ainda é cedo, ninguém sabe o que cada equipe está testando! É um clichê tão válido quanto qualquer outro, e normalmente clichês embutem verdades. É verdade: ninguém sabe o que cada equipe está testando. Não em detalhes, minúcias, pormenores, miudezas. Mas sabe-se que todas estão testando… carros.

A sequência de fotos abaixo não me deixa mentir. São carros.

As dez equipes, com 18 pilotos, passaram o dia andando, testando, experimentando, avaliando, fazendo tudo que é necessário para se preparar para a corrida que abre o Mundial na semana que vem no mesmo circuito. Apenas Lewis Hamilton e Sergio Pérez ficaram assistindo. Red Bull e Mercedes optaram por cumprir o primeiro dia com um piloto só. Os dois vão à pista amanhã. Em algum lugar aí embaixo publicarei a escala de trabalho até sexta-feira, quando terminam os testes.

As atividades foram autorizadas a partir das 10h locais, 4h de Brasília. Seguiram até o comecinho da noite, 19h lá no deserto, com um intervalo para quibes e esfirras no almoço. Certamente é a primeira vez na vida que escrevo “esfirra” com dois erres. Claro que muito mais elegante é grafar “esfiha”, assim como é estranho transformar “staff” e “stand” em “estafe” e “estande”, mas a língua é dinâmica e devemos aceitar certas evoluções. Muitas palavras de origem estrangeira foram aportuguesadas ao longo do tempo. Não fosse assim, ainda escreveríamos “beef” em vez de “bife”, ou “football” no lugar “futebol”, quiçá “abat-jour” ao invés de “abajur”.

(Antes de falar dos resultados, algumas irrelevâncias. A antiga AlphaTauri, agora Visa Cash App RB, vai aparecer nas tabelas oficiais apenas como RB. E a antiga Alfa Romeo, rebatizada pela Sauber (que toca a operação) como Stake (um de seus patrocinadores), apareceu como Kick Sauber. Kick também é um patrocinador, um negócio aí de videogames. Pessoalmente, já tinha decidido chamar a Sauber de Sauber, e acho que será assim até o fim da temporada. Quanto à bandeira de cartão de crédito, chamo até de Mastercard, se me pagarem bem. Mas, por enquanto, para não confundir com a Red Bull, acho que vou respeitar a Visa. Sei lá, ainda não cheguei a uma conclusão. Se sair outra coisa vocês vão conseguir identificar. E como ninguém mais lê blog, mesmo, acho que tanto faz.)

Três dias inteiros, podendo andar de manhã, de tarde e de noite é algo muito útil para todas as equipes e pilotos. Consegue-se acumular informação suficiente para todas as condições possíveis, exceto chuva. Não chove no Bahrein. No ano passado, o acumulado no país foi de 55,2 mm — o ano todo, reforço. Ontem choveu isso em meia hora em Embu das Artes. Vi no Datena. Senti falta ontem no Datena do delegado Nico. Gosto muito do delegado Nico, ele está sempre com cara de cansado, a gravata afrouxada, a barba por fazer, e tem uma pizzaria, um boteco, uma hamburgueria e uma cantina. Todos muito bons, pelos lados do Ipiranga.

Lambiase: o sorriso diz tudo

O delegado Nico, citado aleatoriamente, não sorri como Gianpiero Lambiase, engenheiro de Verstappen. Ele foi flagrado pelas câmeras que transmitiam os treinos no momento em que o holandês fez 1min31s662, a pouco menos de duas horas do final da sessão de hoje. Pouco antes, Norris tinha registrado um tempo melhor, desbancando o tricampeão mundial da ponta pela primeira vez. Max deu um recado que me pareceu claro: é só acelerar um pouquinho que tudo bem. Depois acelerou ainda mais e virou 1min31s344, a melhor volta do dia/noite. Vale lembrar, como referência: em 2023, ao final dos três dias, o melhor tempo de todos foi de Sergio Pérez, 1min30s305.

O RB20 com sua aerodinâmica peculiar: oooooh!

Quando apareceu sem disfarces à luz do sol, o carro de Verstappen causou furor em redes sociais, todos espantadíssimos com dois detalhes que as fotos do lançamento não tinham — propositalmente — deixado muito claros: um troço chamado “inlet”, que a gente pode traduzir como entrada de ar, e a função clara e escarrada desses dois calombos, ou ombreiras, que saem das extremidades do halo e percorrem as laterais da cobertura do motor.

A pequena entrada de ar vertical colada nas laterais do carro (na foto não dá para ver direito), estreitíssima, não precisa levar ninguém à loucura. É só uma entrada de ar. Tem muita coisa para refrigerar debaixo do capô. Há outra, horizontal, igualmente estreita, que tem sido chamada de “letterbox”, por lembrar aquelas frestas que encontramos em caixas de correio. Os dois tubões laterais me parecem mais interessantes. Terão funções de arrefecimento, claro, mas acho que a missão aerodinâmica dessas estruturas que lembram túneis é mais nobre. Seja como for, chama a atenção o fato de Adrian Newey dar uma radicalizada num projeto que, no ano passado, ganhou 21 de 22 corridas. Eu tiraria férias e disputaria o campeonato com o mesmo carro. Mas é por isso que ele é o Adrian Newey e eu fico apenas deitando regra aqui.

Como todas as outras equipes fizeram tempos patéticos, comparados com os de Verstappen, está na cara que ele será campeão de novo. Sim, ninguém sabe o que cada um está testando. Mas insisto: estão testando carros que precisam ser rápidos. Tirando o RB20, nenhum foi. Podem vir a ser? Claro. Mas vai levar algum tempo. Enquanto isso, a Red Bull já parte com um foguetinho muito simpático.

As outras que lutem.

DTS – Ou “Drive to Survive”. Os enzos que acham que a F-1 nasceu em 2019 com a série da Netflix estão excitadíssimos com a estreia da sexta temporada, prometida para sexta-feira. A plataforma de streaming divulgou os títulos dos dez episódios, que estão na primeira foto da pequena galeria acima. Como se vê, tiveram de correr com o último deles, surpreendidos que foram pelo anúncio de Hamilton de que vai para a Ferrari. Devem ter jogado fora alguma coisa com Günther Steiner. Espero que seja melhor que as últimas. “DTS” começou bem, mostrou algumas coisas que os fãs não estão acostumados a ver, mas depois da terceira temporada caiu na mesmice.

GIL – Bonita a homenagem de Lando Norris a Gil de Ferran. Não é com esse capacete que ele vai disputar o Mundial (deve mudar várias vezes), mas faz um tributo merecido e comovente a um nome importante para a McLaren e para a história do automobilismo. E querido por todos. A morte de Gil, no final de dezembro, ainda é difícil de digerir.

TRAMPO – Na penúltima imagem, a listagem de quem anda e quando nos testes. Como se nota, Ferrari, Aston Martin e Visa Cash dos Infernos ainda não definiram toda a programação. Hoje, 1.232 voltas foram completadas. A Haas, com 148, foi a que mais andou. A Williams teve problema de bomba de combustível, perdeu tempo nos boxes e percorreu 61 — a única abaixo de uma centena.

A turma de 2024: repetentes

OS MESMOS – A Liberty/FOM colocou essa foto aí nos perfis oficiais da categoria. É a turma de 2024, igual à de 2023, que normalmente posava numa pista, no grid, diante do semáforo que dá a largada para uma corrida. Desta vez foram todos a um estúdio que lembra o provódromo do BBB, convocados por Tadeu Schmidt. Faltou o capacete do Sargeant. Depois o estagiário coloca.

E CHRISTIAN HORNER? – Apareceu, o chefe da Red Bull, sem uniforme da equipe. E vestindo roupas da AlphaTauri — a grife, não a extinta equipe. A boataria é intensa na imprensa europeia. Uma rádio finlandesa (!), citada por sites ingleses, informou que em 28 de fevereiro ele se despede do time, um dia antes da abertura oficial do campeonato — as primeiras sessões de treinos para o GP do Bahrein acontecem dia 29. Especulam-se muitos nomes para uma eventual saída: David Coulthard (ex-piloto, embaixador da marca, ainda contratado da equipe), Otmar Szafnauer (ex-Aston Martin e Alpine), Mattia Binotto (ex-Ferrari) e Oliver Oakes (da Hitech) são alguns deles. Internamente, Pierre Waché e Jonathan Wheatley, que ocupam posições importantes no time, poderiam ser promovidos. A ver.

LIÇÃO – Mas o caso não passou em branco no primeiro dia de testes no Bahrein. Toto Wolff, chefe da Mercedes, falou em entrevista coletiva que o episódio deve servir como lição para todos na F-1, uma categoria que prega a diversidade, respeito etc. etc. etc. “Temos de viver segundo os padrões que defendemos. Somos uma categoria mundial que tem de servir de exemplo”, disse.