Blog do Flavio Gomes
F-1

MONTE REAL (3)

SÃO PAULO (bálsamo) – Como diz o ditado que inventei agora, depois de uma corrida ruim sempre vem uma corrida boa. E enquanto o Canadá vier depois de Mônaco no calendário, a chance é grande. Foi um grande GP, este de Montreal. Vencido por Max Verstappen, da Red Bull, que mostrou toda sua técnica excepcional […]

Verstappen: 60 vitórias, uma das das mais bonitas

SÃO PAULO (bálsamo) – Como diz o ditado que inventei agora, depois de uma corrida ruim sempre vem uma corrida boa. E enquanto o Canadá vier depois de Mônaco no calendário, a chance é grande. Foi um grande GP, este de Montreal. Vencido por Max Verstappen, da Red Bull, que mostrou toda sua técnica excepcional mas esteve longe de dominar o fim de semana. Mais uma vitória de piloto, não do carro — como em Ímola. O holandês ganhou pela sexta vez no ano, em nove etapas. E chegou a 60 triunfos na carreira. Lando Norris, da McLaren, e George Russell, da Mercedes, fecharam o pódio. Foi o primeiro troféu da equipe alemã neste ano.

A melhor prova da temporada teve o roteiro que a meteorologia escreveu desde sexta-feira. Com chuva e sol, pista seca e molhada, entradas do safety-car, muitas (e belas) ultrapassagens. A Red Bull passou com louvor pelo teste de quatro pistas nas quais sofreu mais do que o que tem sido habitual nos últimos dois anos e meio. Perdeu em Miami e Mônaco, venceu em Ímola e Montreal. Deve agradecer ao piloto que tem.

Início de prova: Haas atacando a Ferrari

A pista estava muito molhada na largada e foi com alguma surpresa que se constatou que a direção de prova não decidiu começar a corrida atrás do safety-car. Ainda bem. Todos estavam calçados com pneus intermediários, exceto a dupla da Haas, que optou pelos pneus de chuva forte.

E foram bem na escolha, pelo menos no início. Magnussen ganhou oito posições nas duas primeiras voltas e Hülkenberg, cinco. O dinamarquês subiu até a quarta colocação. Passava todo mundo. Tinha largado em 14º. Chegava rápido em todos e com muito mais aderência ia jantando quem via pela frente. O mesmo acontecia com Hülkenberg, que partiu em 17º e chegou a andar em sétimo.

Incrivelmente ninguém rodou ou bateu nas primeiras voltas, com água por todos os lados. O único rolo, lá no fundão, foi um toque entre Pérez e Gasly. Russell manteve a ponta e Verstappen tentou acompanhá-lo. Naquela condição, com pouca visibilidade, as coisas caminhavam bem para o inglês da Mercedes. Para a Ferrari, que já tinha fracassado na classificação, muito mal. Pelo rádio, Leclerc foi informado de que tinha algum problema de motor. “Mas continua aí”, falou seu engenheiro. Ele estava em 11º. De acordo com a equipe, a perda era de meio segundo nas retas em relação aos demais. Seria uma longa tarde para o monegasco.

Largada no molhado: Russell mantém a ponta

A primeira escapada, sem batida, foi de Logan Sargeant. Não precisou de safety-car. O americano deu marcha-à-ré e voltou à pista em último. Na altura da sétima volta, com um trilho se formando, parecia que a farra da Haas iria terminar, com os pneus de chuva intensa perdendo rendimento em relação aos intermediários. Então Magnussen parou, na oitava volta. O sol estava aparecendo. Voltou em 14º de intermediários, depois de um pit stop lerdo da equipe, que não estava esperando o piloto entrar nos boxes. Hulk permaneceu na pista fazendo voltas muito lentas, mas sustentando a sétima posição.

Na medida em que a pista ia secando, o spray ia sumindo. E quem podia se aproximava daquele que ia à frente. Caso de Verstappen, que chegou a ficar 3s atrás de Russell, mas na volta 11 reduziu a diferença para menos de 1s. Exímio piloto no molhado, Max se animou e foi para cima. Mais atrás, Ricciardo (punido com 5s por queima de largada) se livrou de Hülkenberg, que puxava uma longo trem de sete carros. Seus pneus “wet” já não aguentavam mais o tranco contra os “inters”. Na volta 13, ele parou.

A briga pela liderança ficou ótima. Hamilton x Alonso, pela quinta posição, era outra batalha belíssima. Max era mais rápido que Russell, mas não conseguia passar. Lewis tinha mais carro que Fernandinho, mas também era arriscado demais sair do trilho, escorregar, parar no muro. Na tela de todos os engenheiros, o alerta: chuva dali a 18 minutos.

Hamilton: elogiou o carro, mas criticou sua própria atuação

Com a dificuldade para passar Russell, Verstappen viu Norris, o terceiro, se aproximar perigosamente. Na abertura da volta 17, deu uma escapada pela área de escape e George respirou. Landinho viu e disse: opa, agora é comigo.

A diferença de Max para o líder subiu para quase 3s. Aí a direção de prova resolveu habilitar o uso da asa móvel, o que prejudicou o piloto da Red Bull, já que Norris poderia atacá-lo com o dispositivo. Mas Verstappen é holandês não desiste nunca. Voltou a acelerar para diminuir a diferença para Russell. Precisava ficar a menos de 1s do líder para usar, ele também, sua asa móvel.

Mas não deu tempo. No final da 20ª volta, com a asa aberta e o vácuo na grande reta que leva aos boxes, Norris conseguiu a ultrapassagem. E foi para cima de Russell, que já não tinha um bom ritmo. Max ficou observando. Na 21ª, Lando passou e assumiu a liderança. O inglês da Mercedes ainda foi reto na chicane e perdeu também a segunda posição, ultrapassado por Verstappen.

O pau continuava comendo mais atrás, com Hamilton brigando com Alonso pelo quinto lugar. Norris, Verstappen, Russell, Piastri, Alonso, Hamilton, Ricciardo, Stroll, Albon e Tsunoda eram os dez primeiros quando, pela tela, a transmissão da TV avisou: chuva em três minutos. O solzinho tímido desapareceu. As nesgas de céu azul se tornaram menores. Vinha água, sim.

Nuvens escuras: corrida toda sob ameaça de chuva

Norris, aproveitou muito bem o momento de pista quase seca das voltas seguintes às ultrapassagens sobre Verstappen e Russell. Na volta 25, tinha 8s de vantagem para o líder do campeonato. E então Sargeant rodou e bateu na curva 4. Seu carro ficou atravessado na pista e o safety-car foi acionado. Norris não parou para trocar pneus porque já tinha passado da entrada dos boxes quando a direção de prova indicou a neutralização com a placa “SC”. Acontece. A sorte que Lando deu em Miami, também com safety-car, não se repetiu em Montreal. Verstappen, Russell e Piastri pararam e trocaram pneus. Hamilton e Alonso também, e Lewis ganhou a posição.

Norris foi chamado na volta seguinte pela McLaren. Perdeu as duas primeiras posições. Saiu dos boxes à frente de Piastri e atrás de Verstappen e Russell. Ainda com o safety-car na pista, na volta 29, Leclerc foi para os boxes e colocou pneus slicks. A corrida já estava perdida, mesmo.

A relargada aconteceu na volta 30. A chuva estava voltando. A Ferrari avisou Leclerc, pelo rádio, que ia chover durante umas duas ou três voltas, e que depois a pista iria secar. “Se vira aí”, pediu o engenheiro. Não deu. Seus tempos de volta, com slicks, eram mais de 15s piores que os do líder Verstappen. E a chuva apertou. E Charlinho parou. Que tarde, a da Ferrari.

Na frente, Verstappen não conseguia escapar de Russell, que o acompanhava a menos de 2s de distância. Norris tentava se aproximar, com Piastri também perto dele, em quarto. Na zona de pontos, Albon e Ocon eram os destaques, em nono e décimo. O piloto da Williams fez uma ultrapassagem dupla maravilhosa, sobre Ocon e Ricciardo — coadjuvantes à altura do bom GP do Canadá até ali.

A prova chegou à metade, 35 voltas, com quase uma hora de duração e naquele momento a chuva tinha dado uma trégua. A tendência era, de novo, de formação de um trilho e asfalto secando. Pelo menos até chover de novo. Verstappen, Russell, Norris, Piastri, Hamilton, Alonso, Tsunoda, Stroll, Albon e Ocon eram os dez primeiros. Max conseguiu abrir um pouco de Jorginho, 2s5. Mas não era uma vantagem muito segura. Na volta 40, conseguiu abrir 3s. E na 41ª, Gasly colocou pneus slicks e todo mundo ficou de olho nele e em seus tempos de volta. Se não chovesse mais, seria uma boa sacada. E uma necessidade para os demais.

Norris deu uma escapada na curva 1 na volta 42, mas ficou onde estava, em terceiro. Verstappen, de grão em grão, ia construindo uma vantagem mais confortável sobre Russell: 4s1 na volta 43. Foi quando Leclerc, melancolicamente, encostou o carro e abandonou. Duas semanas atrás, estava mergulhando no Mediterrâneo para comemorar sua vitória em Mônaco.

Na volta 44, Hamilton, o quinto, foi para os boxes e colocou slicks médios. Caiu para décimo, mas iria voar a partir dali. Os tempos de Gasly, monitorados por todos, eram promissores. Piastri, Alonso, Tsunoda, Stroll, Ocon e Albon fizeram o mesmo e Lewis recuperou o quinto lugar, com pneus de pista seca. A Red Bull, então, chamou Verstappen. Ele parou, Russell parou, mas Norris continuou. Com intermediários na pista seca, agora na liderança. Foi uma aposta arriscada da McLaren. Daria certo?

Norris na chuva: azar no safety-car, mas terminou em segundo

A diferença de Norris para Verstappen, agora segundo, era de 20s. Mais uma volta, e Lando não parou. Mas seus tempos não eram ruins. A vantagem na volta 47 subiu para 21s. E só então ele parou, colocando pneus médios. Na saída dos boxes, viu Verstappen chegando. Ali a pista estava molhada. O holandês manteve a ponta, por muito pouco. Mas tinha pneus quentes e abriu rápido mais de 4s para Noirrs. Russell encostou em Lando, trazendo com ele Piastri. Max respirou. A briga ficou bem melhor atrás, e Russell aproveitou um errinho de Norris no cotovelo, ganhando o segundo lugar na volta 50. Os tempos de volta despencaram, de 1min35s com intermediários para 1min19s com os slicks entre os ponteiros.

Faltando 20 voltas, Verstappen tinha 4s2 de vantagem sobre Russell. No seco, a Mercedes rendia mais. George estava com pneus duros, contra médios de Max, que reclamava pelo rádio: “Não posso passar nas zebras! A suspensão está travada! O rádio não funciona! O ar não tá gelando!”. Russell, como Norris na volta anterior, também cometeu um erro e perdeu o segundo lugar para o #4 da McLaren. Verstappen só agradecia as trapalhadas dos rivais. Tinha mais de 5s de vantagem sobre Lando. Piastri também passou Russell e foi para terceiro.

Na volta 53, Pérez bateu sozinho, arrebentou a asa traseira, mas conseguiu voltar para os boxes para abandonar sem atrapalhar ninguém. Na 54ª, nova batida: Albon com Sainz. O espanhol da Ferrari rodou e acertou o tailandês da Williams. Os dois abandonaram. Péssima notícia para Verstappen. Seus mais de 5s sobre Norris evaporaram. O safety-car foi acionado. E, na hora, Russell e Hamilton foram de novo para os boxes. Desta vez, pneus duros para Lewis (eram os únicos não usados que tinha à disposição) e médios para George. Nenhum dos dois perdeu posição e ambos teriam borracha novinha nas últimas voltas, em quarto e quinto. Era uma tentativa.

A relargada foi dada na volta 59. O asfalto estava seco na maior parte do circuito, com nuvens muito escuras perto do autódromo. Max socou o pé no porão e conseguiu abrir mais de 1s5 para Norris em menos de uma volta, como se desse um soco no estômago do adversário.

Ocon: pontos para a Alpine, junto com Gasly

No seco, a Mercedes melhorava. Russell atacou Piastri no final da volta 62, ficaram lado a lado, mas o australiano resistiu. O engenheiro perguntou: “Oscar, você acha que pega o Verstappen se a gente trocar sua posição com Lando?”. Era muita informação para processar. “Me deixa aqui que preciso me concentrar em Russell!”.

Na volta seguinte, George tentou no mesmo ponto, Piastri jogou duro, se tocaram na chicane, e o McLaren #81 ficou na frente. Hamilton aproveitou que o companheiro foi para a área de escape e assumiu o quarto lugar. Max, se estivesse acompanhando pela TV, estaria adorando as confusões atrás dele. Faltavam cinco voltas para o fim e ele tinha 3s2 sobre Norris.

Hamilton aproveitou os pneus mais novos, atacou e passou Piastri na volta 65, entrando na zona de pódio. Russell fez o mesmo na seguinte e, dessa vez, passou fácil o australiano. Lá atrás, um susto pesado: Tsunoda rodou e, felizmente, ninguém bateu nele. Faltando três voltas, Russell foi para cima de Hamilton para tentar recuperar o pódio. Passou no final da 68ª. A equipe não interferiu na disputa. Na última volta, Lewis ainda esboçou uma nova tentativa, mas não arriscou acabar com a corrida dos dois.

Final em Montreal: Alpine nos pontos com Gasly e Ocon

Verstappen venceu, com Norris em segundo e Russell em terceiro. Hamilton, Piastri, Alonso, Stroll, Ricciardo, Gasly e Ocon fecharam a zona de pontos. Lewis agradeceu à equipe pelo carro “que podia vencer”, mas rasgou críticas a si mesmo: “Foi uma das minhas piores atuações”. Menção honrosa para a Alpine, com dois entre os dez primeiros, embora a equipe tenha feito a patuscada de mandar Esteban trocar de posição com Pierre. O mesmo vale para a Aston Martin, que pontuou com sua dupla.

Com o abandono de Leclerc, Max abriu mais 25 pontos na classificação, passando a 194. Charlinho ficou com 138 e agora vê a vice-liderança ameaçada por Norris, que tem 131. Sainz é o quarto com 108 e Pérez aparece em quinto com 107. No Mundial de Construtores, a Red Bull lidera com 301 e a Ferrari, agora, já enxerga a McLaren no retrovisor: 252 x 212.

Ficou claro, depois das últimas quatro provas, que a superioridade da Red Bull sobre as demais não é igual à demonstrada no ano passado. Mas, ainda assim, a equipe continua vencendo. As próximas três corridas, na Espanha, Áustria e Inglaterra, em finais de semana seguidos, serão disputadas em circuitos onde o time do energético terá vantagem, pela natureza das pistas — com curvas de média e alta velocidade, sem tanta necessidade de saltar sobre as zebras comprometendo a aerodinâmica refinada do RB20.

Talvez, nesses três GPs, a briga não seja tão intensa, o que é uma pena. Porque ver Verstappen pilotando quando as condições não são as melhores para seu carro é um colírio para os olhos de quem gosta de corrida de verdade. Inclusive porque ele pode perder, como se viu na Flórida e no Principado. E ver gente batendo o melhor de todos é, igualmente, uma delícia.

Para quem gosta de corrida, claro.