Blog do Flavio Gomes
F-1

MIL E UMA NOTAS (5)

SÃO PAULO (o dia começa agora) – Vettel é o maior talento que surgiu na F-1 depois de Alonso, e acho que isso não se discute. Por isso, é ótimo ver um título de um campeonato tão disputado nas mãos de alguém como ele. Jovem, o mais jovem campeão de todos os tempos aos 23 […]

SÃO PAULO (o dia começa agora) – Vettel é o maior talento que surgiu na F-1 depois de Alonso, e acho que isso não se discute. Por isso, é ótimo ver um título de um campeonato tão disputado nas mãos de alguém como ele. Jovem, o mais jovem campeão de todos os tempos aos 23 anos, 4 meses e 11 dias. Atirado, marrento, precoce. Ganhou sua primeira corrida de Toro Rosso em 2008, lembrem-se. Na época, eu disse que ele já tinha feito mais que Senna. E tinha, mesmo. Não quer dizer que será um piloto melhor que Senna, ou que Prost, ou Schumacher, ou que ninguém. Isso não importa muito. Hoje ele é o melhor do mundo. O que importa é que a taça foi para o lugar certo.

Lugar certo porque a Red Bull, e as circunstâncias colaboraram, mostra que esse negócio de jogo de equipe é bem discutível. Se tivesse ordenado a troca de posições em Interlagos, perderia a taça. Webber, com sua corrida apagada em Abu Dhabi, ajudou muito. Graças a ele, opaco nesta reta final do Mundial, o time não precisou fazer escolhas. Ao menos escolhas visíveis. Porque é clara a preferência da equipe por Tião Alemão. Uma preferência que, no entanto, não se manifesta com sacanagens. O hoje triste Canguru Man não pode reclamar de muita coisa, exceto aquela asa dianteira de Silverstone, que no fim não deu em nada — ele ganhou a corrida. A Red Bull lhe deu as mesmas chances de fazer o que Vettel fez. E, se não deu, ele que conte.

A corrida árabe foi, como se esperava, chata, pouco digna do grande campeonato de 2010. E lá pela metade já dava para saber que Vettel seria o campeão. Porque só uma série de quebras ou batidas levaria Alonso para a frente. E em pistas como essa, nada acontece.

Alonso, El Fodón de las Astúrias, não correu como campeão. Ao contrário, mostrou-se um péssimo perdedor ao reclamar de Petrov e ao não cumprimentar, pelo menos diante das câmeras, o novo campeão. Foi, hoje, El Chorón de las Astúrias. Perdeu o título ao ser ultrapassado na largada por Button e porque no safety-car da primeira volta dois pilotos, Rosberg e Petrov, aproveitaram para trocar pneus. Assim, quando Fernandinho parou, voltou atrás de ambos. E ficou encaixotado atrás do russo, sem ameaçá-lo em nenhum momento. Houve apenas uma tentativa real de ultrapassagem. No mais, ficou atrás dele, inerte, apático, quase. Mesmo se passasse, ainda teria um longo caminho pela frente. Precisaria passar Rosberg, primeiro. E depois Kubica, que adiou sua parada e quando voltou, o fez à frente do parceiro de mesas de pôquer — Alonso e Kubica gostam de uma jogatina.

Em resumo, foi um desastre o domingo ferrarista. Alonso largou em terceiro e chegou em sétimo. Massa largou em sexto e terminou em décimo. O time foi conservador e medroso. E teve gente que se virou, como a Renault e a McLaren. E até a Mercedes. Nada, absolutamente nada a contestar no título de Vettel.

Ganhou o melhor carro, feito pelo melhor projetista, de uma equipe que de um modo ou de outro mostrou que dá para ser campeão sem muitas patacoadas extrapista. Claro que se Alonso ganhasse o título por menos de sete pontos, todos incensariam a troca de posições de Hockenheim, que no fim se revelou uma tolice, mais uma, de um time que não dá muita bola para a opinião pública. Talvez porque quem compra seus produtos, carros Ferrari, não dê também. Mas quem compra latinhas de energéticos cuja publicidade é movida pelo culto à jovialidade, aos desafios, à aventura, gosta desse estilo “fazemos aquilo que nossos corações mandam”. Ingenuamente, talvez, sou levado a acreditar que Didi Mateschitz realmente não se importaria de perder o título se tivesse de ordenar algo que vá contra os princípios que norteiam a venda daquilo que fabrica. E como não precisou, jamais saberemos.

E se é verdade que Alonso fez uma corrida medíocre, assim como Webber, é verdade também que é uma pena ver um título sendo decidido numa pista tão sem graça, que oferece tão poucas alternativas a quem briga por alguma coisa. Para ser honesto, Alonso e Webber não foram os únicos que tiveram atuações ruins em Abu Dhabi. Ninguém fez nada. Massa, por exemplo, ficou a corrida toda atrás de Alguersuari. Os que se deram bem, como Button, Rosberg e a dupla da Renault, conseguiram escalar o grid mais por conta de estratégias arriscadas do que propriamente por arrojo ou algo que o valha.

Mas, voltando ao início, está em ótimas mãos o troféu de 2010. Sebastian Vettel é um garoto que combina com aquilo que a gente que gosta de corridas quer ver na pista. É o Tião Campeão. Chora de alegria, não de ressentimento. Gosta de carros, faz carinho nos pneus. É simpático, como Hamilton, outro jovem campeão. E como Button, mais veterano, mas um gentleman. Ou até Raikkonen, encantador em sua indiferença, seu jeitão desengonçado e “cool”.

O grande perdedor de 2010 foi Alonso. Menos por ter sido derrotado na pista, que isso acontece. No esporte, ganha-se e perde-se. E, tecnicamente, foi uma façanha lutar pelo título até o fim com um carro que não é lá essas coisas.

O espanhol foi o grande perdedor do ano porque não soube perder. E isso é feio.