Blog do Flavio Gomes
F-1

SEPANGOLAS (3)

SÃO PAULO (calma, não tem milagre) – Há vários simbolismos nesta vitória de Vettel em Sepang — a quarta dele no circuito malaio, primeira pela Ferrari, já em seu segundo GP pelo time de Maranello. Quando ganhou uma corrida pela primeira vez, em 2008, Sebastian também estava a bordo de um carro italiano, da Toro […]

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SÃO PAULO (calma, não tem milagre) – Há vários simbolismos nesta vitória de Vettel em Sepang — a quarta dele no circuito malaio, primeira pela Ferrari, já em seu segundo GP pelo time de Maranello. Quando ganhou uma corrida pela primeira vez, em 2008, Sebastian também estava a bordo de um carro italiano, da Toro Rosso, a antiga Minardi. E era empurrado por um motor… Ferrari. E aquela vitória aconteceu em… Monza.

O que tudo isso quer dizer? Nada em especial, apenas ajuda a compreender a intimidade de Vettel com as coisas da Itália, hino e idioma incluídos, mas sobretudo o espírito latino que não combina com sua origem tedesca. Logo depois de receber a bandeirada e de ouvir de Maurizio Arrivabene um “Ferrari is back”, Sebastian respondeu em italiano com infinitos “grazie!”, “fantastico!”, “si, ragazzi!” e “forza, Ferrari!”. No pódio, a emoção era visível — e rara, porque este alemãozinho costuma sorrir mais do que chorar. É claro que é emocionante vencer com a Ferrari. Claro que é importante se tornar o 38° piloto a receber uma taça de primeiro lugar pelo time vermelho. Claro que é uma façanha derrotar a Mercedes na pista, “fair and square”, como se diz. Claro que é marcante encerrar um jejum ferrarista de vitórias de 34 GPs (o último fora na Espanha em 2013, com Alonso). Claro que é um alívio voltar a ganhar depois de passar uma temporada toda em branco no ano passado e de tomar uma decisão difícil, largar a Red Bull, onde faturou nada menos do que quatro títulos mundiais. Claro que não é qualquer um que chega a 40 vitórias na F-1, algo que só três pilotos conseguiram na história.

E claro que emociona ouvir o hino alemão e logo depois o italiano no pódio, com um cara de vermelho no meio. Muito menos pela nostalgia esportiva daqueles que vibraram com Schumacher em seus anos de hegemonia com a Ferrari, muito mais pela situação em que Michael se encontra, fechado em sua casa na Suíça, sabe-se lá em quais condições — se vivo, morto, morto-vivo, vegetando, consciente, sofrendo, vivendo, morrendo. A última vitória de Schumacher pela Ferrari, para constar, aconteceu na China em 2006. Mas a última dobradinha musical “über alles/fratelli d’Italia”não foi essa, mas a de Monza/2008. Com Sebastian e Toro Rosso.

Vettel ganhou hoje por vários motivos, e quando se elencam dois deles é o caso de, já de cara, tentar acalmar os mais animadinhos que acham que “temos um campeonato”. Não, não temos. A Mercedes será campeã e não vai ser muito complicado. Duas das principais razões que levaram Tião Italiano à vitória em Sepang foram: um safety-car e uma bela burrada da Mercedes.

O safety-car apareceu na quarta volta, quando o empolgadíssimo Sonyericsson rodou sozinho e atolou na brita. Nesse momento, Hamilton já estava em velocidade de cruzeiro depois de largar bem trazendo Vettel e Rosberg na cola, ainda em fase de estudos. Aí, a Mercedes chamou os dois para os boxes. E a Ferrari manteve Sebastian na pista.

Era cedo para parar, a verdade é essa, tanto que muita gente ficou na pista, o que resultou numa volta de Lewis ao pelotão em sexto lugar. Como a Ferrari gasta menos pneu, uma característica conhecidíssima dos carros assinados por James Allison (é só lembrar da Lotus de 2013), a possibilidade de Vettel fazer uma parada a menos que a Mercedes era concreta. E sabida, por isso que a ideia original dos alemães era que Hamilton disparasse na frente para ter uma vantagem que lhe permitisse fazer um pit stop a mais que o rival — a Mercedes, no asfalto escaldante de Sepang, não conseguiria terminar a prova com menos de três paradas.

Só que, para que isso acontecesse, jamais os prateados poderiam chamar Hamilton para o box no começo da corrida de devolvê-lo atrás do alemão, a mais de 10s de distância e com um monte de gente para passar. Ali, na relargada, sétima volta, Vettel ganhou a corrida. Tinha duas paradas pela frente, como seus rivais, mas uma vantagem interessantíssima no cronômetro. E um carro bom na mão.

É óbvio que falando assim parece que foi fácil, mas não foi. Tião Italiano não poderia cometer nenhum erro, perder um segundo sequer, para capitalizar a bobeada mercêdica. E Vettel foi preciso e impecável. Basta ver a diferença entre ele e Lewis na bandeirada: 8s5, praticamente a mesma da relargada. Porque, entre outras coisas, Hamilton teve de passar boa parte da corrida se livrando de carros mais lentos e, de quebra, ainda precisou engolir um último jogo de pneus duros — o que o levou a lavar toda a roupa suja da equipe pelo rádio.

As paradas de Vettel aconteceram nas voltas 18 e 37. Hamilton parou nas voltas 5, 24 e 39. Entre as voltas 19 e 24, o alemão enfiou o pé na jaca e passou, na pista, as duas Mercedes, com pneus piores. Não podia deixar os adversários desgarrarem de jeito nenhum. Mostrou velocidade, constância e, sobretudo, vontade de vencer.

O GP da Malásia foi muito bom, um alento, depois da porcaria de Melbourne. Houve muita disputa e alguns pilotos se destacaram pela combatividade e talento. Um deles, Max Verstappen. Largou mal, é verdade, mas foi buscar aquilo que perdeu no início e terminou em sétimo — tornando-se, aos 17 anos e 180 dias, o mais jovem piloto da história a pontuar. Sainz Jr. foi outro que brigou a corrida toda em acabou em oitavo, depois de largar em 15°. Boa parte das disputas da dupla tororrôssica foi travada com os dois pilotos do time A, Ricardão e K-Vyado. E acabou que a Reb Bull fechou a prova em nono, com o russo, e décimo, com o australiano. Na classificação, a Toro Rosso tem 12 pontos e a Red Bull, 11. É dura, a queda. Momento, como se diz, emblemático da prova foi quando, na volta 53, Vettel colocou uma volta em Ricciardo e Kvyat. Sua ex-equipe, definitivamente, não é mais a mesma.

Outro que fez uma corrida para aplaudir de pé foi Raikkonen. Na primeira volta, tocado por Nasr, seu pneu furou. Um azar desgraçado, aconteceu na última curva, depois da entrada dos boxes. Kimi teve de dar uma volta inteira sem pneu, perdeu um tempo monstruoso, caiu para último, mas foi escalando o pelotão, passando todo mundo, até chegar em quarto. Espetacular, simplesmente. Mostrando, igualmente, que o resultado de Vettel não foi casual — a Ferrari aproveitou muito bem o fato de a pista malaia combinar bastante com seu carro, e está na cara que a reestruturação promovida a partir da metade do ano passado está dando resultados.

Com muita gente andando junto, os dois pilotos da Force India receberam punições por exagerarem nas tentativas de defender ou atacar. Hülkenberg bateu em Kvyat, que chegou a rodar, e Pérez tocou em Grosjean. O soviético se recuperou, mas o francês, não. E a última batalha do dia aconteceu em território da Williams, Massa e Bottas lutando pelo quinto lugar — até que Sapattos passou, na última volta, e Massacrado reclamou de um pit stop demorado que segundo ele acabou atrapalhando na parte final da corrida. Resultado bom, um quinto e um sexto? “Não achei bom. Achei ruim”, disse o brasileiro a Marcelo Courrege, da TV Globo, claramente incomodado com o crescimento da Ferrari. “É mais um problema pra gente.”

E a McLaren? Bem, estava lá, andando, sem muitos problemas para ficar na frente da Manor Marussia de Mehri (Stevens não largou, a equipe não conseguiu arrumar a bomba de combustível) e, depois, lutando com a Force India. “Estou surpreso, estou conseguindo chegar em outros carros!”, comemorou Button pelo rádio, até abandonar na volta 44. Alonso chegou a andar em oitavo, mas a equipe o chamou para os boxes na 22ª volta. Ao sair do carro, desabafou. “Aqui não dá mais. Eu estava guardando segredo, mas acho que é hora de revelar. Estou deixando a Minardi. Na próxima corrida estarei na Benetton. Gosto muito das camisetas polo e das malas coloridas. Além do mais, o V10 da Renault é mais confiável.” Quando perguntaram se não teria problemas por romper o contrato logo na segunda corrida do ano, Fernandinho, plenamente recuperado da pancada chocante de Barcelona, encerrou a conversa: “Isso aí vocês perguntam pro Briatore e pro Balestre”.

Enquanto isso, lá no pódio, Vettel fazia festa, com Hamilton, em segundo, e Rosberg, em terceiro, um tanto quanto espantados. Lewis, num primeiro momento, parecia irritado. Depois, relaxou. Nico está relaxado faz tempo, fez duas corridas burocráticas e pouco vibrantes, parece conformado com o papel de coadjuvante. Kimi, Bottas, Massa, Verstappen, Sainz Jr., Kvyat e Ricciardo fecharam a zona de pontos. Nasr foi o 12°, uma corrida ruim, prejudicada pela má posição de largada e pela batida em Raikkonen no início.

Próxima parada, China. Hamilton tem 43 pontos e é o líder. Vettel está na cola, com 40. Teremos uma luta épica pelo título? Lamento dizer que não. Mas torço loucamente para estar errado, completamente equivocado, para ser chamado de besta quadrada no final do ano.