Blog do Flavio Gomes
F-1

MANÁ-MANÁ (3)

SÃO PAULO (aí sim) – Hahaha, se eu repetisse hoje a pesquisa de quinta-feira, “você gosta dessa F-1 atual?”, o resultado, depois do GP do Bahrein, seria totalmente diferente daquele que está rolando lá embaixo, uns 150% para “não” e uns -25% para “sim”. Foi simplesmente espetacular a corrida de agora há pouco, e épica, […]

manamana3SÃO PAULO (aí sim) – Hahaha, se eu repetisse hoje a pesquisa de quinta-feira, “você gosta dessa F-1 atual?”, o resultado, depois do GP do Bahrein, seria totalmente diferente daquele que está rolando lá embaixo, uns 150% para “não” e uns -25% para “sim”.

Foi simplesmente espetacular a corrida de agora há pouco, e épica, como se diz, a vitória de Hamilton tendo de segurar Rosberg com pneus médios nas últimas dez voltas, o alemão com o mesmo carro e pneus macios, pelo menos 1s mais rápidos por volta que os outros.

Tudo que foi ruim a prova de Sepang foi boa essa de Sakhir. Parecia outra categoria. Mas…

O “mas” é a Mercedes, claro. E falemos dela logo de cara para não comemorar demais antes do tempo, também. Nem todas as corridas serão como essa, e a real é que a disputa pelo título de 2014 está, sim, reduzida a dois pilotos.

Assim, tentando ser mais preciso, vamos dizer que foram simplesmente espetaculares as duas corridas de agora há pouco. Uma delas, com dois carros. A outra, com os demais. Aí é mais honesto.

Comecemos com a primeira, então, o GP Prateado, entre Hamilton e Rosberg. Depois a gente dala do resto.

Eles vão brigar centímetro a centímetro até o fim do ano e há algo muito interessante, nisso. Acho que todo mundo concorda que o Comandante Amilton é melhor que Rosberguinho. Mas isso não lhe garante o título, não. Nico é um piloto bem diferente, mas muito esperto e constante. Menos impetuoso, talvez, mas bom de cabeça. E é essa cabeça boa sua grande aliada para derrotar o performático Lewis, que hoje teve um desempenho assombroso.

A começar da largada, assumindo a ponta depois de esfregar rodas com Rosberg, numa demonstração belíssima de habilidade de ambos. Em 11 voltas, os dois mercêdicos já tinham 11s de vantagem sobre Massa, o terceiro colocado. O ritmo dessa corrida de dois era 1s mais veloz que o da corrida dos outros 20.

Na volta 18, Rosberguinho ensaiou um ataque, talvez para que a TV lembrasse que eles existiam, já que o pau estava comendo lá atrás. Houve um troca-troca de posições e na 20ª Hamilton foi para sua primeira parada e colocou novos pneus macios. Na 22ª, Rosberg fez seu pit stop e, ao contrário do colega, meteu uns médios para deixar os macios para um stint final, já que o time tinha saído para duas trocas, mesmo. Era uma estratégia interessante e diferente. Ótimo.

A diferença entre ambos, que era irrisória até a primeira janela, ampliou-se para cerca de 7s na volta 27, com Lewis nadando de braçada com macios e tendo de abrir o máximo para poder fazer o último trecho da prova com pneus mais lentos. Os dois sumiram da transmissão, porque, novamente, de terceiro em diante era um festival de ultrapassagens, freadas fortes, curvas lado a lado, uma belezura. Até que na volta 42 Maldonado, o Atabalhoado, arremessou o pobre Gutierros para a estratosfera. O carro girou no ar, capotou e caiu de pé, com o mexicano perguntando quem tinha feito aquilo. À resposta, disse: “Suspeitei desde o início”. Safety-car, claro.

Os dois mercêdicos foram para os boxes voando. Hamilton era obrigado a colocar médios. Nico podia calçar macios. A corrida ficou para o alemão. Quando fosse dada a relargada, ele estaria colado no parceiro e teria todo o tempo do mundo para fazer valer sua borracha mais gosmenta.

Então, Paddy Lowe, que não manda pouco na Mercedes, entrou no rádio. Normalmente, quem fala com o piloto é seu engenheiro. O chefe fica só na escuta. E quando ele aparece, é que a coisa é séria. Tipo quando o dono da firma, aquele que a gente não vê nunca, surge na porta do escritório, bate palmas e pede a atenção de todos. Pode ter certeza que fodeu.

Pois Lowe entrou no rádio de Hamilton e disse: “Aqui é Paddy falando. Está tudo bem, tudo lindo, a noite estrelada e enluarada, adoro vocês, mas vamos trazer os dois carros para casa, OK?”.

Seguiu-se um certo silêncio. Cri-cri-cri-cri.

Bom, ele deve ter entendido, pensou o chefe. Trocou de botão, agora para o de Rosberguinho, e falou: “Aqui é Paddy. Tudo bem, Nico querido? Família tá boa, papai tranquilo? Gostei do cabelo, hein? Muito bom, onde cortou? Olha, meu lindo, faltam poucas voltas, vamos chegar direitinho em casa, tá bom? Beijo, lindo”. Do outro lado, ouviu um “OK”.

Já era mais que o som de grilos que veio do rádio de Lewis, e Lowe deu sua tarefa por concluída. Desligou o rádio e disse aos outros no pitwall: “Se eles fizerem alguma merda, corto o pescoço de vocês”.

O safety-car saiu na volta 47. Eram dez para o fim da prova e Nico não tinha outra coisa a fazer: passar por cima de Hamilton, com um carro em tese 1s mais rápido, pelo menos, que o do companheiro. Só que Lewis cravou a melhor volta da corrida. Depois, cravou de novo. Aí Rosberguinho fez o mesmo, como se dissesse: “Fiquem, vai ter bolo e briga”. E foi na volta 52 que veio o primeiro ataque. Hamilton defendeu-se divinamente. O mesmo na volta seguinte. E conseguiu abrir mais de 1s sobre o alemão, tirando dele qualquer chance de novo ataque.

Foi inacreditável. E assim ele chegou à segunda vitória no ano e 24ª na carreira, para igualar Fangio nas estatísticas e deixar Piquet para trás. Nico cruzou a linha pouco mais de 1s atrás. O terceiro colocado, a mais de 24s. Isso mesmo: em dez voltas, os Mercedões abriram em média 2s4 por volta sobre o terceiro colocado.

No pódio, diante de garrafas enormes de tubaína, Rosberguinho ostentava um sorriso algo amarelado, mas não parecia estar deprimido a ponto de cometer suicídio. Ainda deu um banho de refrigerante em Hamilton e saiu na boa. É líder do campeonato, afinal, e sabe que tem 50% de chances de ser campeão — sim, o campeão será ele, ou seu amiguinho, não existe nenhuma possibilidade, repito, de um piloto de outra equipe entrar nessa disputa.

Por enquanto, está na frente nos pontos. Vai ter de manter a cabeça muito no lugar para derrotar o inglês que recuperou a motivação e está guiando de forma soberba e encantadora.

Muito legal, esse Mundial de Mercedes 2014. Daqui a pouco volto para falar da outra corrida e de seu grande vencedor, Sergio Pérez.