Blog do Flavio Gomes
DKW & cia.

V DE VEMAG

INGOLSTADT (poucos entendem) – Amanhã de manhã, quando eu subir no que acho que será um palco no museu da Audi em Ingolstadt, estou pensando em fazer o V com o indicador e o médio. Será o V de vitória e de Vemag, principalmente. Será a cereja do bolo que comecei a assar há uns […]

B

INGOLSTADT (poucos entendem) – Amanhã de manhã, quando eu subir no que acho que será um palco no museu da Audi em Ingolstadt, estou pensando em fazer o V com o indicador e o médio. Será o V de vitória e de Vemag, principalmente. Será a cereja do bolo que comecei a assar há uns sete anos, quando conheci por e-mail o Peter Kober, da Audi Tradition, e ofereci a ele o #96 para ser incorporado ao acervo da montadora.

Já contei essa história um milhão de vezes, e não vou repetir. O fato é que a longa relação deste dekawezeiro que vos fala com a Audi Tradition, além de uma enorme amizade (que no fundo é o mais importante), gerou frutos muito importantes para aqueles que se importam com a preservação de alguma coisa — no caso, a marca de carros que mais amo na vida. E o resultado disso tudo é a exposição que será aberta amanhã (quarta-feira para o público, e vai até 21 de setembro)  com o título “Ordem e Progresso – DKW Vemag and the new dawn in Brazil”.

A mostra temática no Audi museum mobile relaciona os primeiros passos da indústria automobilística brasileira com a construção de Brasília, a criação da Bossa Nova e a explosão do Brasil no futebol mundial com a conquista da Copa na Suécia. Tudo isso aconteceu na mesma época, a segunda metade dos anos 50, e o que a Audi Tradition quer contar aos visitantes é que o DKW, uma das famosas quatro argolas, teve papel importantíssimo nessa fase de grandes mudanças no país.

Afinal, foi uma perua DKW Universal F91 o primeiro carro nacional, concluído na linha de montagem de Vemag em 19 de novembro de 1956. Foi num DKW que Pelé aprendeu a dirigir, matriculado numa auto-escola de Santos. Foi o Belcar o carro escolhido pela equipe de Oscar Niemeyer como táxi-padrão para Brasília. Foi a Vemag no Ipiranga, e não a Auto Union em Ingolstadt, que fabricou o último DKW do mundo, em dezembro de 1967. E foi num DKW, o GT Malzoni, que Emerson Fittipaldi virou gente grande no automobilismo brasileiro, ao terminar as Mil Milhas de 1966 em terceiro, depois de liderar, com Jan Balder, toda a parte final da prova (quebrou um pistão a quatro voltas do fim).

A Vemag, de acordo com os registros da Auto Union GmbH (sim, a empresa ainda existe formalmente), produziu quase 117.191 automóveis entre 1956 e 1967. Foram 51.162 sedãs, 55.692 peruas (entre Universal, Vemaguet, Caiçara e Pracinha), 7.848 Candangos e 2.489 mil Fissores — não entram nessa conta a produção do GT Malzoni (menos de 40), nem a do primeiro Puma (menos de 150).

Três DKWs brasileiros estarão na mostra de Ingolstadt: um GT Malzoni, um Belcar 1967 (eles não conheciam a frente de quatro faróis, exclusividade do Brasil e do último ano de fabricação) e um Fissore (igualmente um “quase mistério” para os alemães). Outros carros nacionais, como um SP2, um Zé do Caixão e um Puma VW, farão parte da exposição.

O que estou mais ansioso para ver é um prometido filme de 8 minutos encontrado nos arquivos da Audi que mostra as aventuras de um motorista de táxi num DKW em São Paulo em 1962, pelo que me disseram. Segundo meu amigo Peter, era uma fita promocional, narrada em alemão, que sabe-se lá como foi parar na fábrica de Ingolstadt. O filme estava todo picotado e estragado, mas foi restaurado e, acreditem, é colorido. Um dos passageiros do tal táxi é, acreditem de novo, Pelé.

O evento de amanhã é exclusivo para a imprensa, convidados e direção da Audi. O bonitão aqui trouxe até um paletó e uma gravata com o nó já feito para ficar bem na foto e ser levado a sério pelos jornalistas europeus. Dois dos carros que estarão expostos são os da foto lá no alto, e pertenciam ao meu irmão camarada Hélio Marques, maior colecionador de DKWs do Brasil. O retrato foi feito há uns dois ou três anos, antes de eles embarcarem para cá.

Depois da abertura oficial, devo fazer uma visita a dois galpões que os caras dizem que são secretos, e que guardam todo o acervo histórico da marca desde o início do século passado. Da marca, não; das quatro marcas: Audi, DKW, Horch e Wanderer. Possivelmente serei sedado e vendado no caminho. Nem sei se vou poder tirar fotos. Em todo caso, tentarei.

Amanhã à noite, se sobreviver e não me derem uma injeção para apagar tudo que vi da memória, conto tudo. Na quarta, farei um passeio de Monza. Dirigindo. Aí poderei morrer.