Blog do Flavio Gomes
F-1

MCLAREN E BARRICHELLO

SÃO PAULO (velha opinião formada…) – Vou refazer uma frase equivocada que escrevi ontem. Esses contratos e memorandos das tabaqueiras com equipes e pilotos de F-1, que vieram à tona graças ao trabalho do indigitado Fábio Seixas em seu blog, acabam sendo, sim, em alguma medida, um “Wikileaks da F-1”. É muito mais do que […]

SÃO PAULO (velha opinião formada…) – Vou refazer uma frase equivocada que escrevi ontem. Esses contratos e memorandos das tabaqueiras com equipes e pilotos de F-1, que vieram à tona graças ao trabalho do indigitado Fábio Seixas em seu blog, acabam sendo, sim, em alguma medida, um “Wikileaks da F-1”. É muito mais do que um apanhado de curiosidades. Vamos chamar esse negócio todo, então, de “F-1 Leaks”.

Menos pelas questões financeiras, fiscais e tributárias. Como já dito, é prática comum no esporte e em outras atividades o uso de empresas em paraísos fiscais, legalmente constituídas, para fugir de impostos nos países de origem dos pagamentos — no caso da maioria das equipes, a Inglaterra. Se o dinheiro tem origem legal, tudo bem. É bem diferente, claro, óbvio, evidente, de um político escroto que rouba dinheiro público e esconde em paraísos fiscais.

(Aliás, é muito engraçada, nessa história, a troca de SMS entre o repórter Thiago Arantes, do site da ESPN, com Piquet. Nelson, com sua classe habitual, e sempre divertida, diz para o Thiago: “Imbecil, eu era residente em Mônaco”. Onde, todos sabem, imposto não é propriamente uma preocupação para ninguém.)

Mas como escreveu o Seixas em sua coluna de hoje na “Folha”, as cláusulas explícitas sobre a condição de primeiro piloto de Senna e Piquet na Lotus diante de seus companheiros, incluindo proibição de o segundão passar o primeiro, mostram que, de fato, essas coisas eram e são previstas por contrato. Talvez nem em todos, claro. Sabe-se, ou imagina-se, que a McLaren não faz isso. Sei lá. Até aparecer um contrato deles para nos desmentir… Mas imaginem, então, o acordo da Ferrari com Barrichello e Schumacher. Isso justificaria o que aconteceu na Áustria em 2002?

Na verdade, na época, todos sabíamos, ou imaginávamos, que Rubens era segundo piloto contratualmente. Se o piloto nunca falou com todas as letras, insinuou um milhão de vezes. Como contratos são protegidos por cláusulas de confidencialidade, é claro que ele corria algum risco de expusesse publicamente seu conteúdo. E ele poderia, sim, ser demitido se desobedecesse as ordens do time. O que não quer dizer que a Ferrari teria de fazer valer a cláusula naquela situação esdrúxula. Nem que ele precisava fazer biquinho. Afinal, assinou e sabia o que estava assinando.

O que fica claro é que piloto morre de medo de contrato, porque sabe que o que está no papel pode acabar com sua carreira. Ou motivar uma multa milionária, ou uma rescisão. Não deixa de ser cruel.

Seixas faz também uma ótima reflexão sobre os “nakajimas” do século 21. Aquilo que o japonês não podia fazer contra um companheiro brasileiro é o que os brasileiros de hoje, talvez, não possam fazer com seus parceiros de outras nacionalidades. Ou, sendo mais específico: o que Rubens não podia fazer com Schumacher, e o que Massa não pode fazer com Alonso — acreditando, claro, que seus contratos fossem/sejam semelhantes a esses dos anos 80, da Lotus, que vieram à tona com os documentos da biblioteca especializada da Universidade da Califórnia.

Sinal dos tempos. Os “nakajimas”, agora, falam português.

O capítulo interessantíssimo de hoje é o que está no Grande Prêmio, confirmando no papel aquilo que muito se especulava na época: o interesse da McLaren por Barrichello na temporada de 1994. A equipe estava em um ano de transição, com motores Peugeot. Na temporada seguinte, usaria os Mercedes. Não tinha ainda pilotos definidos, exceto Hakkinen. O memorando revelado hoje mostra que a McLaren queria testar Rubens nas últimas etapas de 1994 para saber se valeria a pena pagar a multa de rescisão do brasileiro com a Jordan. Para isso, ofereceu US$ 1 milhão a Eddie Jordan, valor que seria abatido da multa caso Barrichello fosse aprovado. No fim, não rolou. A McLaren partiu para uma contratação bombástica, Mansell, que acabou disputando poucas provas em 1995 porque não cabia no carro direito. Foi um fiasco. E Rubens ficou na Jordan até o final de 1996.

Também no site da ESPN, Thiago Arantes escarafunchou o acordo de Senna com a Lotus em 1987 que tinha um adendo: ele poderia usar o boné do Banco Nacional no lugar dos bonés de patrocinadores do time. Mas, em troca, garantia à equipe exposição das marcas que a patrocinavam em entrevistas exclusivas à Globo depois de todas as corridas e treinos. Ou seja: a relação Globo-Senna era prevista em contrato!

E a gente se matando, na época, para conseguir uma exclusiva com Ayrton, e se remoendo de raiva por achar que os globais bem mais competentes, fodões e tal…

Quando digo que há enorme promiscuidade nas relações da Globo com atletas, técnicos e dirigentes do esporte brasileiro, é disso que estou falando.