Carcará II – relatório do Trevisan

SÃO PAULO (cacilda, hoje é sexta-feira 13!) – Meninos e meninas, o Paulo Trevisan solicitou que fosse colocado aqui o relatório pessoal de sua experiência de acelerar o Carcará II em São José dos Campos.

É uma ordem, claro! Muito interessante o relato, para todos os que seguem as suas aventuras e o sacerdócio de recriar, 40 anos depois, o que a Vemag fez em junho de 1966. Segue o texto.

“Ao grande número de entusiastas de DKW que acessam o Blig, e que se entusiasmam com o Carcará, eu gostaria de trazer algumas informações sobre a participação no evento de velocidade de São José dos Campos. É uma síntese dos nossos erros e acertos no carro, das condições e regras em que se realizou a prova, e que nos propiciou uma avaliação e aprendizado excelentes.

Foi a primeira vez que o carro teve uma longa reta pela frente, já que nos quatro testes prévios nos últimos meses tivemos no máximo 700 metros no autódromo de Guaporé que exigem uma forte freada no seu final. E lá já estávamos chegando entre 170 a 180 km/h.

Apesar da média oficial, que se realiza entre os 1.000 e 2.000 metros, ter sido muito baixa e frustrante para o Carcará II, pouco mais de 144 km/h nos dois trajetos, é importante que se saiba como isto foi calculado. Era simplesmente a relação tempo/distância através de sensores instalados, com média da ida e volta; e não velocidade pura.

A organização não dispunha de radar operando, e aqui não vai nenhuma crítica, mas apenas algumas equipes que competiam. Num destes radares, acompanhados por Toni Bianco e meu mecânico Marcos Horst, nos 1.000 metros, o Carcará II passou a 198 km/h, o que fechou exatamente com os mais de 6.300 giros que passamos em 3ª marcha naqueles cones. E deu para sentir que poderá ir a 6500 giros tranqüilamente. O contagiros está absolutamente aferido e possuímos planilhas precisas para avaliar a velocidade em cada uma das marchas e faixa de giros. Além do baixíssimo peso, o item mais importante é o câmbio que pesa 6,6 kg a menos que o original e está absolutamente reescalonado.

Infelizmente o Carcará II só andou dos 80 aos 1.100 metros! Nos primeiros 80 metros, mesmo largando com giro alto, “engasopou” por excesso de combustível e só após limpou, e de uma maneira incrível. Dois dias antes, num teste final em Passo Fundo, tínhamos uma pequena deficiência, mas não dessa ordem. Havíamos optado por gicleurs maiores na Webber 44 retrabalhada, que se mostrou a melhor carburação em alta de todas as testadas.

Ao chegar nos 1.100 metros, nos dois trajetos, simplesmente faltou alimentação, tendo em vista que a bomba de combustível de alta pressão estava sem dosador e efetuava retorno com toda vazão para o tanque (provavelmente também as bóias muito baixas). Por conseguinte, nos 900 metros restantes, num trajeto percorreu falhando, e no outro embalado em ponto morto por mais de 500 metros.

O consumo de combustível em alta está bastante elevado (2,5 km/litro), e só agora deu para avaliar a necessidade de um dosador variável para atender às exigências. Outra falha nossa foi termos feito o alinhamento e corrigido séria divergência na dianteira apenas no carregamento para São Paulo, o que provocou um desequilíbrio em alta que jamais fora observado nos testes anteriores.

Para todos nós, admiradores do DKW, sabermos desenvolver e termos um equipamento que ultrapassa 200 km/h é uma conquista soberba; e nos enche de entusiasmo para continuar avançando e desenvolvendo esse conjunto propulsor. A 4ª marcha não foi usada no seu potencial, até porque houve uma queda muito elevada de giros nessa troca, o que provavelmente exigirá a substituição por outra um pouco mais curta. Novas carburações, equipamentos e combustíveis serão testados a partir de 2007. E colocaremos em funcionamento o dinamômetro existente. É importante registrar que iremos retomar com entusiasmo novos testes de velocidade e em pistas alternativas, apenas pelo prazer e camaradagem dos amigos sinceros do DKW, e sem pretensões de recorde. Afinal, para chegarmos até aqui, trabalhamos em cima de seis motores de DKW e por vários meses durante 2006. E estamos ainda aprendendo.

O Carcará II continuará exposto até 19/10/06 na CasaBola, na Rua Amauri 352, na Motoring Arts promovida por Anísio Campos e com exposição de 20 artistas plásticos que usaram como tema o Carcará. O Anísio está recebendo pessoalmente os convidados das 12h às 22h, e quem quiser pode adquirir uma miniatura com certificado de autenticidade fornecido por ele.

Depois, ficará exposto até o final do ano na Mahle Metal Leve em Mogi-Guaçu, em espaço nobre onde sempre é mantido um veículo do Museu do Automobilismo Brasileiro.”


Anísio autografa uma miniatura do Carcará, da Automodelli.

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Paulo Trevisan
Paulo Trevisan
17 anos atrás

Em relação a alguns detalhes técnicos do motor do Carcará II, perguntados por Pedro Pessoa e Vicente Miranda, agrego as seguintes informações:
a) O óleo é 2T Castrol (de kart) cuja versão atual deixa bastante homogênea a mistura (gasolina Pódium);
b) O carburador é Webber 44 (IDF), e já testamos Dellorto tripla (um duplo e outro cortado no meio) que é horizontal e com entradas individuais, mas não afinou e torna mais crítico e aumenta o risco de quebra se não for bem equalizado.
c) Os preparadores de época preferiam as carburações horizontais, mas nós ainda vamos testar outras versões. Obviamente a carburação é importantíssima.
d) Os pistões desse motor que andou em São José dos Campos, é 78mm, com apenas dois anéis Cofap cromados do motor VW 1.6; bem assentados e com folgas adequadas.
e) Quanto ao que seria número de luzes, nestes motores preparados sempre são reduzidas de 6 para 4 em cada cilindro em função do canal de transferência. Nos retrabalhos e aberturas das “janelas” estão sendo avaliadas algumas velhas versões.
Finalizando, é um prazer informar detalhes para quem gosta.

Sípoli
Sípoli
17 anos atrás

Consegui meu autografo na miniatura do Carcara…

Speed Arosi
Speed Arosi
17 anos atrás

Avante e a além, assim deve ser a industria nacional, altamente capacitada e com uma história maravilhosa, espero poder ter um dvd com toda esta história, isto não seria possivel Matuzada????

jonny'O
jonny'O
17 anos atrás

Fantastico!
E devemos agradecer muito ao Paulo Trevisan ,primeiro pela iniciativa historica em si.
Segundo por lembrar de nós , blogueiros amantes do Deka e do automobilismo.

Ayrton Amarl
Ayrton Amarl
17 anos atrás

O Jan tá certo, o recorde foi quebrdo ao nível do mar e nessas condições os cilindros admitem mais ar e o teor de oxigênio na câmara é maior e conseqüentemente a potência é maor do que na altitude de SJ dos Campos.

Tohmé
Tohmé
17 anos atrás

Maravilhoso relato.
Aliás, quando ele vai abrir o museu?

Zuquim
Zuquim
17 anos atrás

Os amigos deste Blig do Gomes, uma reles mesa virtual suja de graxa e limalha, sente-se honrado pela presença de pessoas como Anísio Campos.
Ele é um dos nossos, Blogaiada.
E isso é real!

reginaldo
reginaldo
17 anos atrás

Fabuloso!!!!!!!. essa montanha de explicações técnicas, demonstram o carater dessa turma incrível. nada mais a acrescentar. somente APLAUDIR….em pé!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

Vicente Miranda
Vicente Miranda
17 anos atrás

Paulo:

Mera curiosidade.

1) Vocês estão usando 1 Weber 44 ou 1 1/2″ ?

2) Imagimo que estejam usando Weber IDF (vertical). Já pensaram em usar o(s) horizontais DCOE? O Newton Alves, veterano piloto de DKW, usou com algum sucesso 3 Dellorto independentes, mas era mais difícil de acertar.

3) Vocês providenciaram algum acréscimo de compressão no cárter?

4) Vocês estão usando aqueles pistões alemães, cujos anéis são bem finos?

5) O motor está com quantas luzes (passagens de mistura) em cada cilindro?

Jan Balder
Jan Balder
17 anos atrás

Paulo,

Se me permite gostaria de completar seu relatorio dizendo que vc andou em S.José dos Campos a 800 metros de altura e o Carcará 1 foi ao nivel do mar com maior pressão barometrica- pode se estimar em 10% de ganho de potencia do motor nestas condições.
Vá em frente- quem persiste alcança.
abraço a todos
Jan

Roberto-CerroLargo
Roberto-CerroLargo
17 anos atrás

É incrivel, tinha sete anos, e lia as 4 Rodas de meu pai quando o Carcará bateu o recorde . Fantástico este renascimento.Torço para o Trevisan pasar dos 214. Acho que o Norman aprova. Pô, coloque logo ele no museu e abra para visitação em algum dia do mes. Nós, gauchos sempre gostamos de caroos e corridas….

Romeu
Romeu
17 anos atrás

Maravilha!
Esse relato é um documento histórico.
E emocionante. Volto a repetir: achava que nunca mais iria ver esse carro, muito menos andando e fazendo testes. E talvez repetindo o recorde. Tudo de bom!

pedro pessoa
pedro pessoa
17 anos atrás

Bravo! Nada como o relato do dono….
E bebe hein…….
Usam 2t sintético ou mineral?

Conde
Conde
17 anos atrás

Maravilha de texto .
Parabéns !

Herik
Herik
17 anos atrás

É maravilhoso ver o entusiasmo desse pessoal. Construir algo tão bacana é magnífico.
Parabéns a estes entusiastas.

Claudio Ceregatti
Claudio Ceregatti
17 anos atrás

SEN-SA-CIO-NAL !!!!!
Adoro esses relatos, com detalhes técnicos e explicações completas.
O vídeo está no YouTube, e dá pra ver bem como demorou para o motor limpara a garganta… E quando limpou, como gritou alto e forte!
Será que não tem jeito de conversar com a Infraero e realizar testes no Aeroporto de Congonhas de madrugada?
Outra coisa: Desses seis motores, sobraram umas pecinhas pro glorioso #96?